Miscelânia
HISTÓRIA DO PRESENTE: CONCILIAÇÃO, DESIGUALDADE E DESAFIOS Roberto Amaral, Expressão Popular Um diário vivíssimo da luta de classes no Brasil. Esse livro, organizado pela Editora Expressão Popular, reúne cerca de sessenta artigos escritos por Roberto Amaral entre 2014 e 2020. Amaral é um dos poucos que desde 2014 percebia a crescente ameaça fascista na sociedade brasileira, por isso mesmo essa coletânea de artigos é instigante e precisa. O incansável militante vai à gênese da formação brasileira para explicar o Brasil de hoje, sempre atento às lições dos tempos de Getúlio, Lott, Brizola e Lacerda. Em cada movimento de resgate do passado para entender o presente, o autor submete o leitor a um coerente exame da história do país, confrontando a desigualdade social com o caráter antiprogresso de nossa classe dominante. Em essência, Amaral demonstra a reprodução e a vigência da relação entre casa-grande e senzala no Brasil de hoje. Como explicar a força do bolsonarismo? Como explicar a fragmentação do campo progressista? Como explicar a desorganização da esquerda? Como se tivesse viajado no tempo, já em 18 de março de 2016 o autor escreveu: “o projeto em curso não se limitará à eventual deposição de Dilma, pois trata-se, através de golpe de Estado de novo tipo [...], de implantar um governo politicamente autoritário, socialmente regressivo e economicamente neoliberal-ortodoxo, pró-Estados Unidos”. Há exemplo mais certeiro disso do que o atual governo Bolsonaro? Impossível não reconhecer a precisão e a lucidez política do ex-ministro de Ciência e Tecnologia do governo Lula, há mais de quatro anos, sobre qual é o projeto da classe dominante para o país. Examinar e confrontar esse projeto autoritário e violento da casa-grande é uma necessidade civilizatória. É preciso entender o caminho até aqui percorrido para criar condições de mudarmos esse rumo. Se o programa neoliberal, derrotado nas urnas em 2014, foi adotado por Levy, Meirelles e segue com Guedes, é porque Cunha, Aécio, Temer, Moro, Villas Bôas e seus pares agiram como legítimos representantes da classe dominante antipovo e autoritária, instalando o regime da ditadura constitucional ao corromperem o Estado democrático de direito. Então, qual é a saída? Como derrotar a corrupção e a violência da classe dominante que só fazem agudizar os problemas do povo? Diante desse caráter golpista da ordem burguesa, não resta outro caminho aos democratas: disputar a consciência das massas. É no debate com o povo de qual país queremos que reorganizaremos e construiremos a força social necessária para democratizar nosso Brasil. Além de um diário vivo, História do presente é bússola. [Giovani del Prete] Bacharel em Relações Internacionais pela UFABC, é militante e trabalhador internacionalista junto a movimentos populares do mundo todo. RESPONSABILIDADE E CORRUPÇÃO Renato Polillo, Contracorrente Não é exagero dizer que a Lei Anticorrupção fez emergir uma nova disciplina no ordenamento jurídico brasileiro: o Direito da Conformidade. Um dos pontos mais debatidos sobre essa lei é a previsão de responsabilidade objetiva da pessoa jurídica – isto é, a possibilidade de responsabilização de empresas e entidades equiparadas em casos de ilícitos administrativos estabelecidos na lei, independentemente da comprovação de dolo ou culpa sobre os atos praticados em seu benefício por administradores, empregados ou intermediários. É em meio a esse debate que Renato Polillo faz, em Responsabilidade e corrupção, um magistral estudo crítico sobre o tema. Suas páginas oferecem mais que uma análise da Lei Anticorrupção e da responsabilidade objetiva nela prevista; elas trazem também uma ampla investigação do próprio instituto de responsabilização da pessoa jurídica em nosso sistema jurídico. Ele apresenta o funcionamento da Lei Anticorrupção por meio de um diálogo entre o direito civil e o direito administrativo, passando pelas bases históricas da criação da norma e do próprio combate internacional à corrupção, com análises críticas que estimulam a reflexão do leitor sobre como o Brasil vem combatendo os atos de corrupção aqui praticados, decorrentes de uma relação bastante complexa e ainda pouco transparente entre os sistemas corporativo empresarial e de governo. Polillo alicerça sua obra em doutrina especializada, revisão acurada da legislação brasileira e elementos preciosos do direito internacional. Além disso, faz uso de jurisprudência atualizada dos tribunais superiores brasileiros, o que resulta em um material completo e de leitura indispensável para os que trabalham ou se interessam pela temática de combate à corrupção e responsabilidade empresarial. O livro, portanto, lança luz sobre os aspectos obscuros que circundam a responsabilidade civil na Lei Anticorrupção, que ainda não conta com entendimentos jurisprudenciais sólidos ou com literatura vasta para a interpretação de seus dispositivos. [Valdir Simão] Advogado e consultor em gestão pública e governança corporativa. Auditor-fiscal da Previdência Social e da Receita Federal do Brasil por 29 anos, ocupou vários cargos na administração pública, entre eles os de ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, ministro-chefe da Controladoria-Geral da União, secretário da Fazenda, presidente do INSS, secretário adjunto da Receita Federal e secretário executivo da Casa Civil da Presidência da República. Novas narrativas da web Sites e projetos que merecem seu tempo Ópera e machine learning David Li é um artista digital que cria animações interativas, como um rosto elástico do personagem Morty, para o canal Adult Swim (animação que esteve no Festival Internacional de Linguagem Eletrônica do Brasil em 2018), ou uma experiência de composição de óperas em tempo real por meio de machine learning, para o Google Arts & Culture. O projeto, chamado Blob Opera, mistura experiências anteriores dele com música de coral, plasticidade de materiais e interatividade. Impressionante e divertido, para todas as idades. https://david.li Vidas Negras Importam A cada 23 minutos um jovem negro é assassinado no Brasil. Isso significa que mais de 23 mil pessoas negras de 15 a 29 anos são assassinadas por ano no país. Os dados são do Mapa da Violência, produzido pela Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais. Gama Revista, a agência de jornalismo Alma Preta, Corinthians e Atlético Mineiro uniram-se para dar nomes e rostos às estatísticas. Lá você conhecerá Rogério, 19 anos, “o rapaz que sonhava em ter uma barbearia e foi morto com dois tiros no dia de seu aniversário”. Ou Ágata, 8 anos, “a menina que amava ler e estudar, ensinava inglês para o tio, jogava xadrez e sonhava em ser bailarina”. https://vidasnegras.gamarevista.com.br Capela Sistina 360° O site do Vaticano publicou uma visita virtual à Capela Sistina, em 360 graus e ótima qualidade de imagem. Uma visita como essa pode ser quase considerada melhor do que ver ao vivo, quando geralmente há muita gente e se tem pouco tempo e dificuldade de observar detalhes. Sem contar a pandemia, obviamente. A capela foi pintada pelos maiores artistas da Renascença, incluindo Michelangelo, Rafael, Perugino e Sandro Botticelli. Poderia ter informações interativas em cada arte, mas, mesmo tendo apenas uma boa fotografia, é um passeio virtual imperdível. http://www.vatican.va/various/cappelle/sistina_vr [Andre Deak] Sócio da agência Liquid Media Lab, professor de Jornalismo e Cinema na ESPM, mestre em Teoria da Comunicação e doutorando em design na USP.