CACHALOTE

Cachalote é o nome de uma espécie de baleia que submerge até espantosa profundidade e já povoou o universo literário com Moby Dick, de Herman Melville. Também é o nome que batiza a graphic novel (romance gráfico) recém-publicada pelo escritor Daniel Galera e o desenhista Rafael Coutinho. A baleia, aqui, no entanto, não é a protagonista, mas aparece em momentos-chave para mergulhar a narrativa no fantástico.
Neste livro, o romance gráfico – nome que deriva da fusão entre as artes gráficas e a literatura – encontrou uma síntese poderosa. Por dois anos, um escritor e um desenhista trabalharam lado a lado para parir este rebento, que tem o mérito de aproximar dois campos que dialogam, mas raras vezes conseguem casar de forma tão bela.
A mistura de linguagens é uma das virtudes mais interessantes da obra. Romance, quadrinhos, mangá, conto, e até cinema – reforçado pela ausência de numeração das páginas e a semelhança distante com um storyboard – se confundem na missão de manter o leitor absolutamente hipnotizado com o que se passa na sua frente. É possível gastar mais tempo em uma página apenas com ilustração do que em outra recheada de conversas.
O enredo passa pela vida de cinco personagens principais sem qualquer intersecção aparente entre si. São cinco homens: um ator chinês que perde seu melhor amigo; um escultor que arrisca interpretar sua vida no cinema e enfrenta conflitos pessoais; um escritor deprimido que mantém uma relação próxima com a ex-mulher e a filha; um típico playboy estúpido expulso de casa; e um jovem apaixonado por uma menina e pelo sadomasoquismo.
Essas crônicas da angústia, retratadas num preto e branco cru, são conectadas entre si por uma teia fina, capaz de dar sentido a realidades diversas e conflitantes. O título enigmático, como boa parte do livro, instiga o leitor a prosseguir na leitura como em transe hipnótico, devorando as páginas e o texto com avidez.