FLORES

Leia este livro assim, por partes. Em pedaços. Como flores despetaladas. Fragmentos de um mesmo fim de mundo. De jardim soterrado. Característica que faz a prosa do mexicano Mario Bellatin. Explico: ritmo entrecortado, narrativas curtas, carcomidas, que podem ser lidas separadamente. Ou juntinhas. Plantadas em um mesmo canteiro. De abismo. Capim no asfalto.
Neste Flores (com inspirada tradução de Josely Vianna Baptista), o autor reúne para cada sempre-viva uma história sempre-morta. Há prosa contada-poetizada a partir de petúnias, astromélias, violetas, amores-perfeitos. Perfeitos? Quem disse? Em Bellatin tudo é um mundo “de próteses, membros postiços e mutilações”, como diz, no prefácio, o escritor Joca Reiners Terron.
Não é este o seu primeiro livro publicado no Brasil. Antes, saiu a novela Salão de beleza, por uma pequena editora gaúcha chamada Leitura XXI. Beleza que, ali, já não era bem beleza. Salão aquele por onde desfilavam tipos exóticos, ambíguos – uma marca do trabalho deste que é um dos mais originais e mais prestigiados autores latinos. 
E um dos mais polêmicos.
Na última Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) causou espinhentos comentários a prótese peniana que ele usou em uma das mãos – Bellatin é vítima da talidomida e sempre passeia com uma prótese exótica, feita exclusivamente para ele por artistas plásticos.
Não é à toa que Flores é obra plástica. Conceitualmente revolucionária. Porque diferente. Porque lança sementes profundas na alma de quem a lê. De quem percorre seu universo particularmente universal.
Vale destacar o projeto gráfico, assinado por Elaine Ramos e Maria Carolina Sampaio. Bem dentro do espírito criador de Bellatin – a gente que vá montando o livro, que nem capa tem e vem encartado em um saco brilhante. Como se ali juntássemos os nossos restos. Em guerra, sempre.
Bellatinamente horripilante.