Razões de Estado


    Chomsky é autor de bibliografia extensa, seja no campo da lingüística, seja no campo da política. Crítica radical ao hard power americano, este livro, escrito na década de 1970, permanece atual enquanto análise do fio-condutor da política externa dos Estados Unidos. Valendo-se de fontes primárias, a força documental de sua ampla base empírica o leva além do que é a característica de textos de arquivamento de dados e citações. Razões de Estado é um livro de representação e de reflexão do lingüista, que desvelou atentamente a política. Tal estratégia é o aspecto mais atrativo para seu leitor, que o vê distanciar-se do saber administrado. Antepondo-se ao deslumbramento mítico da tradição que reserva aos EUA a predestinação calvinista para o exercício do destino manifesto no mundo – com intervenções a base de cruzadas do bem contra o mal  –,
em Razões de Estado, o autor teve em mãos importantes documentos da diplomacia-militar do governo dos EUA na Indochina. A correspondência parafraseada, truncada, incompleta, a fim de garantir o segredo burocrático, Chomsky soube decodificar com rigor hermenêutico. Revelou o estilo oficial do Pentágono, pouco afeito ao soft power. Os nove capítulos perfilam temas relevantes para o entendimento dos meios empregados pelos EUA para defender militarmente o atual padrão da ordem mundial, a ser imposto unilateralmente. “Livre companheiro de viagem dos anarquistas”, como se auto-intitula, Chomsky provoca o leitor em dupla direção: a cumplicidade ou a recusa. Reivindica para a ciência o compromisso político, “a maneira que os antigos entendiam como parrésia”. É plausível conceder aos críticos a produção excessiva de sentido em algumas de suas referências à política externa dos governos dos EUA. No cômputo geral, Noam Chomsky faz jus às edições e traduções que suas obras ostentam em todo o mundo.