17 contradições e o fim do capitalismo
Resenha do livro 17 contradições e o fim do capitalismo, de David Harvey, lançado pela Boitempo
A crise do capitalismo é tema central na tradição marxista, normalmente acirrando ânimos. As três principais correntes clássicas adotaram posturas ortodoxas, que indicavam a primazia de três mecanismos supostamente centrais: com base na leitura do volume derradeiro de O capital, a tendência à queda da taxa de lucro; a compressão do lucro, em circunstâncias instáveis de pleno emprego; e o subconsumo, com um desequilíbrio no mercado associado à progressiva incapacidade de trabalhadores de comprarem o que produzem, gerando demanda agregada inadequada. Esses mecanismos, apesar de intuitivamente relevantes, são históricos e territorializados, isto é, se dão sob condições específicas.
Em 17 contradições e o fim do capitalismo, o geógrafo David Harvey propõe uma síntese dos mecanismos clássicos e a inclusão de novos – por exemplo, associados a condições de desenvolvimento desigual, a uma tendência catastrófica à destruição ambiental e ao esvaziamento produtivo sob a tentação rentista. Esse livro aparece como uma sequência a Enigma do capital (2011), em que Harvey analisa especificamente os mecanismos críticos do neoliberalismo, uma variedade extrema de organização da acumulação do capital. A ambição da nova obra é desenvolver elementos para uma análise mais geral da crise do capitalismo.
Vale ressaltar que, na listagem das várias contradições do capitalismo, não há necessariamente expectativa de primazia de um mecanismo sobre outro. O exercício de síntese é justamente expor as dinâmicas pelas quais as contradições interagem, positiva ou negativamente. No agregado, a máquina econômica do capitalismo precisa ser substituída, pois condena a maioria da humanidade e, sobretudo, o futuro da humanidade à ineficiência tecnológica, ao pauperismo irreversível e à catástrofe ambiental.
Na sequência de Enigma e 17 contradições, cabe provavelmente uma sistematização dos apontamentos sobre a formação da alternativa sistêmica viável ao capitalismo. A trilogia é provável, pois, para o autor, não faz sentido pensar em reforma do capitalismo; é urgente uma alternativa radicalmente igualitária e democrática para a certeza de termos um futuro.
[João Alexandre Peschanski] Professor de Ciência Política da Faculdade Cásper Líbero.