A arte como antena da sociedade
Silvio Caccia Bava
Já dizia um estudioso da cultura que “a arte são as antenas da sociedade”1, através das suas manifestações você se encontra com um povo, um grupo social, uma cultura, seus valores, suas emoções, seus temores, desejos e aspirações.
Ainda que a busca da felicidade seja um elemento comum a todas as sociedades, como ela ganha concretude, se materializa, depende do contexto histórico e do discurso narrativo dos protagonistas. Da mesma forma a arte também expressa os movimentos de resistência contra a opressão, os sofrimentos vividos pelos excluídos.
Uma das riquezas contidas nesta capacidade de criação é a expressão da diversidade. Outras culturas, diferentes da nossa, nos abrem novos caminhos de expressão, permitem novos olhares, e garantem a visibilidade, muitas vezes, de grupos marginalizados pela lógica do mercado de entretenimento. Em muitos casos estas novas expressões artísticas são rapidamente apropriadas pela lógica de mercado, que as resignifica, retirando o caráter crítico ou contestador que possam ter e transformando-as em um produto massificado, com sua necessária perda de significados e pasteurização.
Daí a importância de observarmos o que há de novo surgindo por entre as brechas do mercado, como manifestações autênticas e importantes de outras culturas. Queremos valorizar a expressão desta diversidade, que nos ajuda a sair da posição centrada em nós mesmos e ver os outros e suas produções como expressões igualmente importantes da criatividade e das buscas do ser humano.
Na TV, a juventude árabe, hoje, fica “zapeando” entre belas mulheres semidesnudas e o cântico religioso islâmico, sem aparentemente haver qualquer problema com esta diversidade. Já o cinema indiano, adorado por multidões, restabelece os vínculos entre o sagrado e o profano, transformando esta arte num momento do “religare” de sua audiência com o mágico, o fantástico, a religião. Jovens africanos de vários países expressam suas revoltas e frustrações apropriando-se da herança cultural do rock, do funk, do soul, do reggae, ritmos de outras origens, e os resignificam criando um rap africano de muita força, que galvaniza a juventude de toda a região.
Muita coisa nova, muita coisa interessante, muita coisa desconhecida. Estas produções que surgem de baixo para cima vão ganhando mais espaço com as novas tecnologias digitais e a internet, e permitem o reconhecimento e a legitimação de um mundo cada vez mais plural e heterogêneo, cheio de surpresas.
Silvio Caccia Bava
Diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil