A Goodyear e seus fantasmas
Eliminar mais de mil postos de trabalho na França enquanto fatura bilhões de lucro no mundo: esse foi o método da Goodyear para dobrar os sindicatos. Após uma longa ocupação da fábrica, o combate operário chegou ao fim em 2014, e os primeiros mortos surgiram. Voltar a Amiens permite medir o custo humano das demissões
Todo janeiro faz Sabrina Cadoret mergulhar de novo na dor daquele início de 2014, quando seu marido, Laurent, recebeu a carta de demissão da Goodyear. Por doze anos, esse homem de 30 anos fabricou pneus na região de Amiens-Nord. Um ano antes da dispensa, após cinco anos de batalha sindical, a direção do grupo tinha anunciado o fechamento da fábrica. O choque foi tal que, em 30 de março de 2014, Cadoret enforcou-se na casa de repouso em que estava internado para tratar a depressão, atordoado pelos remédios, recluso num quarto escurecido pelas barras de ferro da janela.
“Sua demissão foi o fim de tudo”, relata a viúva, com a voz embargada. “Seu trabalho era sagrado, ele não parava de me dizer que tinha medo de não conseguir pagar as contas.” Apesar da promessa de um contrato com duração determinada que deveria começar alguns dias depois, Laurent Cadoret não achava que poderia encontrar novamente um trabalho estável. No fim de 2017, a taxa de desemprego de Amiens atingia 11,7%. Para além da conjuntura, os “ex-Goodyear” têm a impressão de trazer na testa um rótulo indelével que agrava ainda mais suas buscas. “Colaram em nós a imagem de vândalos que não querem trabalhar”, lamenta Sébastien P., de 44 anos, dos quais cerca de vinte dedicados à fábrica. “Quando faço entrevistas de emprego, sou sempre dispensado.” Segundo dados da Goodyear, apenas 15% dos cerca de 1.060 funcionários em programas de reciclagem tinham conseguido um contrato indeterminado em meados de janeiro de 2018, e 18%, um contrato de mais de seis meses.1
Quinze suicídios
Desde o suicídio de Laurent Cadoret, a lista dos demitidos da Goodyear que puseram fim à vida não para de crescer, sinal de que a violência do plano de eliminação de 1.143 cargos age como uma bomba de efeito retardado. A antiga seção da Confederação Geral do Trabalho (CGT) listou quinze suicídios, dos quais vários nos últimos meses. As comunicações das mortes de vários desses operários mencionam sua condição de “ex-funcionário da Goodyear”. E, mesmo que as causas de um suicídio sejam sempre difíceis de esclarecer, o fechamento da fábrica paira sobre cada um desses dramas.
Unidos por anos de mobilizações, os ex-funcionários da fábrica se cruzam nos funerais, transmitem uns aos outros à boca pequena os ecos dos mortos: tal “Goodyear” se jogou embaixo de um carro, o outro se enforcou no banheiro e foi descoberto pelo filho, ou acabou morrendo destruído pelo álcool. “Dói o coração ver esses caras morrerem. É uma facada que lhe dão, mais uma parte de você que se vai”, sussurra Serge R. Ele era próximo de Jean-René Brézin, que se matou em maio de 2017. Quando deu cabo da própria vida, esse quinquagenário tinha as mãos devastadas por uma doença “que lhes causava uma espécie de crateras”, descreveu um colega. Um mal que aqueles que o rodeiam atribuem aos produtos manipulados na Goodyear. “Como encontrar trabalho com mãos como essas?”, indaga Serge. “Ele não dormia mais, não estava mais lá.” Régis Pommier, que se matou em setembro de 2017, aos 57 anos, era também “esmagado fisicamente”, conta Reynald Jurek, ex-delegado da CGT. “Ele não conseguia mais dormir por causa de dores insuportáveis nas costas.”
O veneno da depressão não esperou 2014 para contaminar os operários. “Uma parte deles tinha perdido o equilíbrio antes do fechamento”, lembra-se Jurek. “Durante dois anos, fizeram a gente vir para duas horas de trabalho por dia. Alguns jogavam cartas na cantina, traziam bebida…” Uma ociosidade destruidora, propícia ao crescimento das dependências e dos problemas conjugais. “Foi isso em parte que estragou meu casamento”, avalia Manuel S., de cerca de 40 anos. “Isso e os anos de combate que travamos. Eu trabalhava no fim de semana e passava a semana diante das barreiras, em frente aos policiais. Praticamente desisti do meu casamento. Ficamos presos lá dentro, não percebemos mais nada, e assim a esposa foi embora.” A Inspeção do Trabalho alertava sobre o sofrimento das equipes desde 2013. A Goodyear garante ter colocado em prática desde aquele ano um “acompanhamento completo, com apoio psicológico e médico”, sem especificar quantos funcionários tiveram acesso a ele. A célula de escuta “parava às 17 horas, quando na verdade deveria funcionar 24 horas, sete dias por semana”, lamenta Jurek, que detalha: “Os que consultavam um psicólogo o faziam fora dali”.
Os suicídios produzem outros dramas invisíveis. Como várias viúvas de ex-funcionários da Goodyear, a senhora Cadoret tinha parado de trabalhar para criar a filha. Seu marido “ganhava bem” na fábrica, até “1.800, 1.900 euros por mês”. Ele tinha orgulho de poder sustentar a família. Hoje, ela vive da renda de solidariedade ativa (RSA) e se preocupa ao ver a filha, órfã de pai, ser perturbada na escola. “Quando aconteceu, ela estava no ensino básico e começou a ter dificuldades. Atualmente está no ensino médio, mas numa classe especial, para tirar o atraso”. Os dois filhos de outro suicida, adolescentes, também são acompanhados por um psiquiatra.
Os ex-Goodyear temem que o drama continue. Muitos chegam ao fim de seu período de afastamento para reciclagem e de seus direitos de desempregados, e o mal-estar não passa. “Psicologicamente fatigado”, Manuel “não consegue mais ver a vida como nos tempos da Goodyear.” Entre os irmãos que trabalhavam com ele, um “caiu no álcool, mas antes não bebia”. Manuel não pode deixar de “temer o pior, se a mulher o abandonar um dia”. “Hoje”, completa Serge, “quando nos cruzamos, dizemos: ‘Acima de tudo, não faça besteira. Se você tem problemas, dê uma ligada. Venha tomar um café aqui em casa. Não se deixe abater’.”
Ausência de acompanhamento
Quem estará lá para contar as vítimas da onda de choque dos anos que estão por vir? Quando, quatro anos antes da Goodyear, a fábrica Continental e Clairoix, no Oise, fechou deixando 1.100 pessoas na rua da amargura, Antonio da Costa, delegado da Confederação Francesa dos Trabalhadores Cristãos (CFTC), parou a contagem depois de “catorze suicídios e trezentos divórcios”. “Como formávamos um coletivo que se reunia regularmente, era possível seguir os dramas, levá-los ao conhecimento do público”, explica. “Há dois anos, não temos mais informações. Cada um tem de tocar sua vida.”
“A história se esquece”, lamenta também o psiquiatra Michel Debout. “Os atores dos conflitos sociais perdem a ligação e os cuidadores não questionam os pacientes sobre eventuais traumas ligados à perda de um emprego. Um estado de depressão pode, no entanto, ser um ressurgimento disso algum tempo depois.” Esse especialista em suicídio denuncia há cerca de dez anos o “buraco negro” que constitui a ausência de pesquisas sobre os efeitos do desemprego e das demissões sobre a saúde. Sem jamais ser ouvido pelos serviços públicos.
*Alexia Eychenne é jornalista.