A idade de chumbo
Nos anos em que Stalin exerceu o poder (1928-1953), a produção cinematográfica declina (97 filmes em 1930, 39 em 1935 e 14 em 1950) e a estética é congelada: céu azul ocupando metade da tela, campos de trigo a perder de vista e camponeses eufóricosBenjamin Bibas
Durante a década de 20, o cinema soviético conheceu uma série de filmes meteóricos, cujos autores vieram de uma geração talentosa nascida entre os séculos XIX e XX. Seus filmes falam de epopéias revolucionárias — La sixième partie du monde (Dziga Vertov, 1926), Outubro (Serguei Eisenstein, 1927), A nova Babilônia (Grigori Kozincev e Leonid Trauberg,1929) — e a sua força é tal, como destaca Chris Marker, [1] que eles inspiraram diretamente a história dos acontecimentos por eles relatados.
Nos anos em que Stalin exerceu o poder na União Soviética (1928-1953), esta idade de ouro do cinema se transforma em idade de chumbo. A produção declina (97 filmes em 1930, 39 em 1935 e 14 em 1950), a estética é congelada: céu azul uniforme ocupando a metade da tela, campos de trigo a perder de vista, camponeses eufóricos nos kolkozes [2] etc. Para Mikhail Tchiaurelli, apologista do stalinismo cinematográfico triunfante, o ditador aparece como um semi-deus todo poderoso, capaz de, ao mesmo tempo, consertar o defeito de um trator na Praça Vermelha (O juramento, 1947) ou dirigir vitoriosamente o Exército Vermelho de seu escritório no Kremlin (A queda de Berlim, 1949).
O “realismo socialista”
Uma tal homogeneização da estética e do conteúdo se explica somente pelo regime intransigente? Esta foi a pergunta colocada pelo simpósio sobre “cinema stalinista” organizado pela cinemateca de Toulouse nos últimos dias 4 e 5 de maio. [3]
Rapidamente, Stalin ordena uma normatização da arte. Em abril de 1932, o decreto sobre “a reconstrução das organizações artísticas” substitui os antigos círculos literários por uma União dos escritores, agora sob controle. O “realismo socialista”, expressão inventada em maio de 1932 pelo jornalista Gronki, constitui nessa época apenas uma vaga recomendação “para pintar nossa realidade com imagens verdadeiras”. O filme Contre-plan (Fiedrich Ermler e Serguei Yutkevitch, 1932) é o arquétipo dessa estética.
O “cinema total” de Vertov
Na década de 40, a censura torna-se mais severa. Um conselho artístico opina sobre os roteiros e as filmagens em curso. Tenta recrutar os artistas mais célebres, porém estes brilham sobretudo por suas posições heterodoxas. Eisenstein, por exemplo, luta para que Boris Barnet conclua seu Vieux Chevalier (1940), antes de ele próprio ser incomodado durante a conclusão da segunda parte de Ivan, o terrível (1947).
Se o talento dos Vertov, Barnet e Pudovkine parece esgotar-se a partir dos anos 30, isso ocorre também por causa de um acontecimento mais cinematográfico: a passagem do cinema mudo para o sonoro. Vertov prega, com efeito, uma concepção radical do cinema: a dissociação entre o som e a imagem, música dissincronizada, a existência de um “cinema total” que marcasse mais o espectador. Entretanto, esta concepção é rejeitada pelo Partido, que privilegia um cinema sonoro sincronizado, mais propício ao cinema de propaganda.
Para a talentosa geração dos anos 1920, foi um duro golpe. Prova disso são os últimos filmes mudos, produzidos no início dos anos 1930, verdadeiras obras de arte: a alegria, a liberdade, a audácia impregnam cada imagem de Bonheur, de Alexandre Medvekine (1934). A concepção de cinema de Stalin era visivelmente outra, como fez questão de explicitar ao realizador Alexandrov: “Vocês, cineastas (…), estudem em detalhe o cinema sonoro. Quando os heróis descobrirem a palavra, a força de nossos filmes aumentará enormemente.”