Nas regiões da África sub-saariana, onde a Aids está em rápido desenvolvimento, percebe-se uma relação estreita entre esta expansão e a maneira pela qual as pessoas ganham sua vida. O mapa das zonas mais afetadas pelo vírus (HIV) e o das principais explorações mineiras (principalmente de ouro, diamante, cobalto, cromo, ferro e urânio), por exemplo, se sobrepõem.
Contradizendo as afirmações mais freqüentes, a Aids não atinge mais os países pobres, mas os mais ricos — ou, mais exatamente: os menos pobres. Ou seja: os países que, graças às minas de matérias primas, começaram a registrar avanços econômicos e sociais. Portanto, os nove países da África atingidos por uma taxa de Aids superior a 15% são aqueles onde encontramos as mais importantes minas: Botswana, Suazilândia, Zimbabue, Lesoto, África do Sul, Zâmbia , Namíbia, República Democrática do Congo e Malawi. A África do Sul, por exemplo, onde o HIV afeta quase 20% da população (o quinto país africano em termos percentuais), ocupa o 103º lugar na escala do desenvolvimento humano estabelecido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). [1] 25,25% da população do Suazilândia, no 113o lugar, são afetados pela doença. Quanto ao Botswana, colocado em 122º com uma renda per capita de 7.690 dólares, é o país, não somente da África, mas do mundo, mais gravemente dilacerado pela epidemia: 35,8%. Apesar disso, na escala do desenvolvimento humano, está na frente de 36 países africanos. [2]
Situações de alto risco
A existência das explorações mineiras atrai uma forte emigração masculina para as minas e os centros industriais ligados a elas. Deixando para trás suas famílias, que vêem de tempos a tempos, esses trabalhadores se amontoam em barracas para solteiros. As mulheres que vivem próximas, e que a eles se oferecem, são portadoras de doenças sexualmente transmissíveis (DST) e de HIV, em proporções bastante elevadas. Na verdade, entregues à pobreza nas zonas rurais, impotentes, dependentes do dinheiro que lhes remetem suas famílias, a maioria delas recorre ao comércio sexual. A esta situação de alto risco, acrescenta-se a contaminação pelos homens que retornam temporariamente a suas casas.
Um estudo realizado em 1997 no distrito de Kuazulu Natal (África do Sul) revelou um aumento alarmante das taxas de pessoas infectadas pelo HIV (até 26% entre mulheres grávidas). Os companheiros da maioria das mulheres tinham emigrado para trabalhar nas minas. Já aquelas cujos maridos não tinham seguido este caminho, ou que viviam com um parceiro fixo, eram menos afetadas. Em Carletonville, coração da mineração de ouro da África do Sul, trabalham 88 mil mineiros, sendo que 60% são procedentes de todo o país ou de Estados vizinhos (Moçambique, Malawi, Lesoto…). Estima-se que nesta zona vivem de 400 a 500 prostitutas, um terço das quais infectadas pelo HIV [3]; os mineiros, por seu lado, registram a proporção de 22%.
Mobilidade e micro-epidemias
Embora a Aids fosse mais presente nos setores urbanos, o ciclo “mobilidade do migrante-contágio do trabalhador-contágio da companheira habitual-transmissão materno-infantil” permitiu a contaminação das zonas rurais. Por aí se explica o surpreendente crescimento do flagelo nas zonas rurais e seu desenvolvimento em regiões cada vez mais distantes das minas. Também é assim que se explica o aparecimento de micro-epidemias — a presença de focos de infecção próximos de locais onde não se encontra praticamente nenhum caso, uma das outras características da Aids. Encontram-se essas micro-epidemias nos distritos próximos das minas sul-africanas, ou de aglomerações onde se instalaram maquilas (empresas sub-contratadas; por montadoras da indústria automobilística, por exemplo) em San Pedro Sula (Honduras), ou ainda, em diversos países, nos nichos populacionais surgidos às margens de grandes rodovias