As ocupações das comunidades do Rio de Janeiro
O novo projeto do governo de Cláudio Castro (PL), Cidade Integrada, tem como foco a regulamentação da economia local. O investimento será de R$ 500 milhões. Mais uma vez, o projeto não foi pensando em diálogo com a população dos territórios onde o projeto será implementado
Na manhã do dia 19 de janeiro de 2022, moradores da favela do Jacarezinho e do morro da Muzema foram surpreendidos com o início do novo projeto de ocupação de comunidades do governo do estado do Rio de Janeiro: Cidade Integrada. O projeto, cujo investimento será de R$ 500 milhões, é uma espécie de reformulação do programa das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), criado em 2008. Importante destacar que o Cidade Integrada não foi pensando em conjunto com a população dos territórios onde será implantado.
Apesar das inevitáveis comparações com o antigo programa, o governo alega que não se trata de uma ocupação nos moldes das UPPs. Mas afinal, quais seriam as principais diferenças com o antigo programa do governo de Sérgio Cabral? Para efeitos comparativos, é necessário contextualizar o programa criado há 14 anos – que foi da alta expectativa de uma sonhada solução para o persistente problema da segurança pública no estado do Rio de Janeiro, até o seu fracasso quase por completo.
No clímax da execução das políticas públicas voltadas para a segurança, alguns problemas estruturais do projeto das UPPs foram descritos no artigo “Afinal, qual é das UPPs?” de Luiz Antônio Machado da Silva, escrito em 2010. No texto, o autor destaca os seguintes tópicos como centro do problema: a migração “pacífica” do tráfico de drogas para as regiões menos visadas; ausência de uma reforma geral da instituição Polícia Militar do estado; reação da população que era vista como “algo a ser pacificado”.
No mesmo ano, o então governador Sérgio Cabral usava as UPPs como uma das principais vitrines para sua reeleição (o que viria acontecer de forma avassaladora naquele ano). Até aquele momento, o programa parecia poder resolver boa parte do problema crônico da violência urbana na cidade maravilhosa.
Para inglês ver
O problema central foi o objetivo das UPPs. Em tempos antecedentes à Copa do Mundo e, principalmente, às Olimpíadas, o projeto “pacificador” – que no papel contava com inúmeras políticas sociais nas grandes comunidades cariocas e, também, de ampliação e melhoria da mobilidade urbana das periferias para os grandes centros comerciais -, foi por água abaixo. A expressão “para inglês ver” entrou em cena e a parte do projeto que previa o bem-estar da população foi deixada em segundo plano e, posteriormente, esquecida. Dois meses após o fim das Olimpíadas, os teleféricos instalados foram praticamente esquecidos e desligados, o que talvez seja um grande símbolo da desistência ou da mudança de postura do governo em não buscar desenvolver mais as regiões favelizadas.
Na teoria, o novo projeto do governo de Cláudio Castro (PL) tem como foco a regulamentação da economia local, que hoje é dominada por facções criminosas e milícias. Regulamentações estas que vão desde o setor de imóveis , que em algumas regiões são de propriedade da milícia, até o setor de serviços, que normalmente também é controlado pelo crime organizado, como distribuição de gás, tv a cabo e internet. Após a regulamentação da dinâmica econômica destes territórios, o projeto visa fornecer condições para a criação de pequenos negócios locais. Essa seria a grande novidade no papel: um projeto que permitisse o desenvolvimento social, urbanístico e, principalmente, econômico nestas regiões.
É importante acompanhar para no futuro testemunhar se o estado aprendeu com os insucessos e as falhas do projeto das UPPs ou se este será apenas mais um plano eleitoreiro cujo fim já sabemos qual é.
Marlon Cecilio de Souza é economista pela UERJ e pós-graduando em política e sociedade pelo IESP-UERJ.