Dos três pulmões verdes do planeta – a Amazônia, o Sudeste Asiático e a África florestal da Bacia do Congo – esta última sofre relativamente menos agressões que as duas outras. Em certos países, assiste-se mesmo ao fenômeno inverso: as savanas, abandonadas pelos homens, são reconquistadas pela cobertura florestal, notadamente no Gabão, na República Centro-Africana e no Congo.
No entanto, continuam prevalecendo as críticas em certos meios da “proteção da natureza”: tocar na floresta, seria levá-la a desaparecer. Nessa nova religião, exportada pelo mundo ocidental, cortar uma árvore para comercializá-la torna-se um crime de lesa-ecologia. Esse breviário verde negligencia algumas realidades: os países florestais da África devem antes de tudo contar com os recursos de seus meios naturais.
Finalmente, o diálogo
Na religião exportada pelo mundo ocidental, que ignora as realidades sócio-econômicas, cortar uma árvore para comercializá-la é um crime de lesa-ecologia
Populações inteiras vivem no coração dessas florestas, por exemplo, e dela tiram sua subsistência: 95% do consumo de proteínas são fornecidos pela fauna selvagem, pois é quase impossível a criação de gado bovino. A agricultura itinerante, devoradora de espaços, é por si só a causa da diminuição de nove décimos das superfícies. A abertura de canteiros florestais constitui uma porta de entrada para os agricultores, que utilizam as pistas de acesso e de descarga, precipitando-se nessas sangrias logo que a exploração termina.
Esta representa, para alguns países, uma parte essencial de suas receitas de exportação. Não está isenta de reprovação e funciona muito como uma atividade de safra. Mas o conceito de gestão racional dos recursos, o aumento do poder dos movimentos ecologistas e os apelos ao boicote das madeiras tropicais levaram progressivamente os grandes exploradores – entre eles, muitos franceses – a rever suas posições, a aceitar o debate, a solicitar conselhos… O diálogo acabou por instaurar-se entre as organizações não governamentais (ONGs), os governos, os representantes florestais e a Organização Africana da Madeira. Os investidores – a França, o Banco Mundial, a União Européia… – financiaram os planos de gestão e exploração racional.
O fator ambiental e a questão sócio-econômica
A agricultura itinerante, devoradora de espaços, é por si só a causa da diminuição de nove décimos das superfícies de regiões florestais
Foram criados, por exemplo, espaços protegidos para a fauna; os exploradores aceitaram a reserva para proteção de uma parte de suas concessões, para a conservação e a pesquisa; sindicatos profissionais firmaram acordos com organizações de proteção à natureza; foram elaborados programas de criação de animais selvagens, destinados a alimentar o pessoal dos canteiros de obras…
O sinal está mais para verde, do lado dos parceiros dos países produtores. O verdadeiro debate se faz sobre o respeito, pelas administrações locais, das regras de boa gestão da riqueza florestal. Muitos governos locais fazem da floresta uma conta bancária da qual se pode sacar para constituir fortunas pessoais ou honrar a folha de pagamento do funcionalismo em meses difíceis, como ocorreu recentemente na República de Camarõesi.
De forma mais insidiosa, foram concedidas facilidades a grandes companhias florestais asiáticas (malaias, chinesas, indonésias), sem respeito algum pelos códigos em vigor, tanto em relação à qualidade e quantidade da madeira derrubada, quanto da área concedida. Só a crise econômica asiática deu uma parada a esse movimento, que se aproveitava da fragilidade dos regimes locais abalados por crises e conflitos permanentes. Mas a demanda asiática de madeira é tão forte que essa trégua é apenas provisória. Os relatórios, por exemplo, dos pesquisadores do Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento (CIRAD) – os únicos a tocarem a sineta de alarme – poderiam servir de base a negociações pragmáticas com esses exploradores, em um quadro que aliasse a componente ambiental às dimensões sociais e econômicas.
A questão da baleia
Só a crise asiática interrompeu a derubada, que se aproveita da fragilidade dos regimes dos países que têm florestas. Mas a trégua é apenas provisória
A floresta como santuário da biodiversidade – pelo prazer da conservação – pode ser um discurso sedutor, mas que não se sustenta, diante da situação que atravessa a maior parte dos países do hemisfério Sul, principalmente os africanos. Os ex-presidentes Félix Houphouët- Boigny, da Costa do Marfim e Didier Ratsiraka, de Madagascar, divertiam-se lembrando ironicamente a seus interlocutores que a própria França, no seu tempo, havia destruído sua cobertura florestal e grande parte de sua fauna para alimentar a população…
Como poderiam os europeus pretender convencer alguém da necessidade de tomar medidas de salvaguardar uma espécie, e até um ambiente em risco, quando a supressão de sua própria grande fauna os obriga a reintroduzi-la (ursos, falcões, abutres, linces…) enquanto recursos naturais (como o do lobo) provocam tal oposição por parte dos outros utilizadores do espaço?
O debate na Europa sobre a regulamentação da caça, as paixões e até a violência que ele provoca, não deixam de surpreender os colegas africanos. Que dizer também das tentativas sucessivas do Japão e da Noruega – pátria de Gro Harlem Brundtland, grande defensora do desenvolvimento sustentável – para obter novas cotas para caça de certas espécies de baleia, indo – no caso de Tóquio – até à prática da compra de votos de pequenos países para satisfazer suas ambições mercantis e criminosas?
Como gerir o recurso florestal?
Todas essas interrogações remetem à própria natureza das discussões: compromissos ecológicos demais são muitas vezes o produto de um sentimentalismo oriundo de nossas culturas ocidentais, mal compreendido pelos poderes e populações africanas. Praticamos, sem dizê-lo, uma ingerência ecológica freqüentemente defasada das realidades locais, e muitas vezes sem oferecer os meios financeiros.
Como justificar a retirada necessária das espécies destruidoras na Europa e negar esse direito às populações africanas?
Diante dessas interrogações, que deveriam ser a chave de uma verdadeira negociação, as posições puras e duras de alguns levaram a recusar qualquer diálogo construtivo. Este discurso deve voltar a ser o eixo da relação entre o utilizador e o recurso, a fim de não ser desconectado de seu meio humano, social e natural. Como justificar a retirada necessária das espécies destruidoras na Europa e negar esse direito às populações africanas, confrontadas localmente às mesmas restrições? Trata-se, ao contrário, de implantar uma gestão inteligente, racional, durável, do recurso, para que ele sirva, em primeiro lugar, aos que vivem dele e aos territórios onde se desenvolve.
O “soluçar do homem branco”
Não é surpreendente que às vezes os políticos tenham uma visão restrita desses valores em jogo. A tomada de posição de certos meios ecológicos é mais inquietante. Durante as recentes campanhas eleitorais na França, a questão do desenvolvimento dos países do hemisfério Sul – raramente abordada – nunca o foi sob o ângulo dos recursos naturais e de sua gestão a serviço do desenvolvimento, tomando consciência de que são fontes de vida, e até de sobrevivência, nos países pobres.
O compromisso político dos ambientalistas europeus, o espaço que ocupam na opinião pública, sua maneira pertinente de fazer as perguntas da sociedade e suas interrogações sobre as problemáticas do consumo são seguidos com interesse na África, onde têm uma função real de formação pedagógica à distância. Mas esses militantes devem evitar ceder muito facilmente à síndrome do “soluçar do homem branco” e adotar a justa medida das realidades e valores africanos em jog