Devemos demonizar as pesquisas eleitorais?
As pesquisas são um instrumento essencial para as campanhas e para a própria sociedade, claro que houve erros e esses devem ser corrigidos, mas demonizar os institutos e proibir as pesquisas de opinião é no mínimo uma atitude irracional e anticientífica.
A história das sondagens de opinião como conhecemos remonta ao ano de 1935, quando George Gallup aperfeiçoa os métodos existentes. Além de matemático e estatístico, Gallup também era um empreendedor: queria que os jornais vendessem as pesquisas eleitorais. Como vender pesquisas em anos não eleitorais? Fazendo alguns exercícios de futurologia: se as eleições fossem hoje em quem você votaria?
Nosso cérebro busca uma resposta lógica e o faz através de heurística, explica Fernando Neisser. Não gostamos de ficar em silêncio e, por isso, apontamos como candidatos os famosos, os já favoritos, os nomes mais conhecidos no momento.

Alguns anos depois a pesquisadora alemã Noelle-Neumann começa a estudar as pesquisas de opinião e cria uma teoria baseada, principalmente, nos dados obtidos nas eleições federais alemãs de 1965, para entender o modo que as pesquisas impactam nos pesquisados e na sociedade em geral.
A teoria do clima de opinião e do espiral de silêncio nasce aí: as pessoas não são só influenciadas pelo que as outras dizem, mas também pelo que acham que as outras dirão. A ideia então parte do princípio de moldar as opiniões ao meio.
Em termos mais práticos e, claro, a grosso modo, haveria o clima de opinião, no qual as pessoas imaginam que boa parte das outras pensa de outro modo e, em um primeiro momento se calam, para depois tentarem adaptar suas opiniões as da maioria. Todo esse processo ocorre em uma movimentação social progressiva a qual a pesquisadora Noelle-Neumann deu o nome de espiral do silêncio.
Muito além dos fenômenos mencionados, os processos relacionados às pesquisas eleitorais em 2022 precisam ser avaliados a fundo pelos cientistas políticos e estatísticos. Explico: a ausência, em âmbito nacional, de qualquer evento crítico que justificasse a ascensão de Jair Bolsonaro e seus índices fora das curvas captadas anteriormente deixou a sociedade – em todo espectro político – descrente.
Há pistas, ao menos de maneira preliminar, e que precisam ser investigadas mais a fundo, do que ocorreu: o corte de verbas no censo do IBGE o que, por si, dificulta a confecção de amostras; o voto envergonhado, fenômeno que também aconteceu na eleição de Donald Trump; o boicote às pesquisas promovidas pelo presidente em exercício e seus eleitores; a ausência de identificação do perfil daqueles que se abstém; a sub-representação de alguns grupo sociais – intimamente ligado ao problema das amostras como, por exemplo, em estados da federação muito populosos se ouvir mais eleitores das capitais que nos interiores.
De pronto há soluções que podem ser determinantes para corrigir esses erros. A principal delas é voltar a destinar recursos ao IBGE a fim de realizar o censo de maneira apropriada, mas outras medidas podem ser adotadas, inclusive, a criação de um comitê com estatísticos, cientistas, pesquisadores afeitos a temática e os próprios institutos que realizam as pesquisas a fim de resolver problemas metodológicos.
Algo semelhante ocorreu nos Estados Unidos nas eleições de 1948, neste caso, as pesquisas davam como certa a vitória de Dewey contra Truman o que não se concretizou, o comitê então debruçou-se sobre os resultados e conseguiu apontar problemas e questões a serem solucionadas.
O mais importante é que as pesquisas são um instrumento essencial para as campanhas e para a própria sociedade, claro que houve erros e esses devem ser corrigidos, mas demonizar os institutos e proibir as pesquisas de opinião é no mínimo uma atitude irracional e anticientífica.
Luísa Leite é advogada eleitoralista e mestranda em Ciência Política (UFPE). Pós-graduada em Direito Público pela ESMAPE e em Eleitoral pelo TRE de Pernambuco.