O ataque terrorista do dia 19 de agosto contra a sede das Nações Unidas em Bagdá provocou inúmeras condenações no mundo árabe. Entre elas, a do comentarista e analista Joseph Samaha, do jornal de esquerda libanês Al Safir1. “As coisas devem ser destruídas para que possam ser reconstruídas. Será que alguém pode negar que esta triste teoria se tenha instalado em nossas consciências? Será que alguns, entre nós, não crêem que a salvação se encontra no fundo da destruição (a magnífica destruição, como disse um dia um grande poeta)? Será que não temos uma certa tendência a glorificar qualquer foram de violência dirigida contra o ?inimigo?, seja qual for sua utilidade?”
“A operação de ontem à noite contra a sede das Nações Unidas em Bagdá salienta essa mentalidade destrutiva. Expulsemos todos os mediadores. Proibamos todas as organizações internacionais. Que a situação desmorone de vez. Que a energia elétrica e a água sejam cortadas. Que o petróleo pare de ser bombeado. Que prevaleça o roubo. Que se fechem as universidades e as escolas. Que as empresas abram falência. Que acabe a vida civil. E, no final, a ocupação fracassará.”
O binladismo na resistência iraquiana
Os EUA criaram o mesmo tipo de situação contra a qual diziam ter pretendido desfechar a guerra (os supostos vínculos entre o regime de Saddan e a Al-Qaida)
“Não”, protesta Joseph Samaha, “no final, será uma catástrofe para o Iraque e uma maior exigência para que os Estados Unidos fiquem ali”. Após lembrar que, apesar das contradições, a ONU se tinha manifestado contra a guerra norte-americana e que continuava sendo um parceiro com quem se pode discutir, continuou: “O ataque contra a sede das Nações Unidas em Bagdá pertence a outro mundo; é uma forma de niilismo, de absurdo e de caos que se esconde por trás de slogans falaciosos que comprovam a convergência entre os responsáveis pela ação, sua limitação intelectual e seu comportamento criminoso.”
Dois dias mais tarde, o mesmo jornalista manifestava a preocupação com uma “possibilidade concreta de que o binladismo assumisse o controle da resistência iraquiana; embora os Estados Unidos se recusassem a reconhecê-lo, poderia servir-lhes de pretexto.”
“Vêem-se sinais crescentes de que a resistência à invasão norte-americana pelo antigo regime vem sendo gradualmente substituída por elementos islâmicos fundamentalistas, do mesmo modelo de Bin Laden. Isto não só seria irônico, como desastroso. Irônico porque confirmaria que os Estados Unidos criaram o mesmo tipo de situação contra a qual diziam ter pretendido desfechar a guerra (os supostos vínculos entre o antigo regime iraquiano e a Al-Qaida). E desastroso porque colocaria os Estados Unidos numa posição internacional mais forte para imporem sua vontade na região.”
(Trad.: Jô Amado)
1 – Edição de 20 de
Alain Gresh é jornalista, do coletivo de redação de Le Monde Diplomatique (edição francesa).