“Nós queremos nos juntar a eles, entrar pela porta da frente”
Entrevista com Prof. Yara Frateschi (Unicamp) sobre desequilíbrio de gênero na Filosofia no Brasil. Mais um artigo do especial Família Verde.
Um breve olhar sobre os currículos de Filosofia no Brasil – e no mundo – e podemos ver que as mulheres filósofas são poucas ou ausentes nas bibliografias, o que não significa, contudo, que elas não existam ou existiram. É este o pano de fundo da I Conferência Internacional das Mulheres na Filosofia Moderna, que traz não apenas pesquisas de filósofas como Émilie du Châtelet e Anne Conway, mas discute a presença destas pensadoras no cânone filosófico. Um mesmo olhar para a presença das mulheres nas pós-graduações e corpo docente de departamentos de Filosofia no Brasil nos conduz a uma conclusão parecida: são minoria. Esta é a razão que levou a professora livre-docente do departamento de Filosofia da Unicamp, Yara Frateschi, a uma das mesas na conferência que aconteceu na última semana na UERJ, no Rio de Janeiro. Ainda que o trabalho acadêmico de Frateschi esteja voltado para filósofas políticas contemporâneas (como Seyla Benhabib e Hannah Arendt), a professora tem se dedicado a compreender os números que revelam esta baixa presença e se engajado em ações que possam transformá-los.
O fato das mulheres serem minoria nos programas de pós-graduação e docência em Filosofia no Brasil foi provado em 2017 numa pesquisa levada a cabo pela professora Carolina de Araújo (UFRJ). Os números que Araújo apresentou à comunidade acadêmica revelam a seguinte fotografia da área: entre os 3.652 estudantes de mestrado e doutorado, as matrículas de alunas respondiam por 28,45% do total em 2015. Já as docentes permanentes desses programas são 20,94% do total. O que Frateschi tem buscado compreender é por que o corredor é estreito para as mulheres na Filosofia no Brasil? Para isso, diz a professora, é preciso ouvir as estudantes e docentes da área para compreender quais são as barreiras que enfrentam na permanência da área. Ela tem se dedicado a este trabalho de pesquisar as razões que justificam esses números, entrevistando alunas e docentes e deve publicar no próximo ano resultado desta pesquisa. Nesta entrevista, a professora indica, por exemplo, a importância de se compreender o impacto das bibliografias de curso unanimemente dominadas por homens. Da mesma forma, diz Frateschi, é importante considerar que grande parte desses filósofos é misógina e dissemina o mito da precariedade racional, moral e política das mulheres.
Enquanto persegue as razões para justificar esse baixo número de mulheres no seu campo, Frateschi indica o que, em todo o país, professores e professoras de Filosofia podem fazer para que a desigualdade de gênero na área seja superada. A professora de Filosofia indica a potencialidade de se incluir filósofas mulheres e também feministas nas bibliografias dos cursos, ampliando a perspectiva plural de se exercitar o pensamento. Ela também aponta a necessidade de se pensar a paridade de gênero nos eventos da área, assim como nas bancas de concurso, além de ter um cuidado especial com as mulheres que engravidam, em qualquer momento da carreira. O assédio moral e sexual enfrentado pelas alunas também é algo que deve ser urgentemente combatido, segundo a professora.
Frateschi está engajada, em parceria com outras docentes, na criação da Rede Brasileira de Mulheres na Filosofia e na criação do Blog Mulheres na Filosofia, com verbetes de filósofas de todos momentos da História, além de material de ensino. Assim como esta iniciativa, outras estão sendo desenvolvidas, como a conferência da qual participou nesta semana. Finalmente, diz Yara, a comunidade filosófica brasileira está aceitando discutir abertamente sobre desequilíbrio de gênero.
A pesquisa da professora Carolina de Araújo, publicada em 2016, traz números que provam uma realidade já sentida pelas mulheres da Filosofia: somos poucas e o corredor torna-se, ao longo do tempo, mais estreito. Por que, você acredita, as mulheres acabam desistindo da trajetória na Filosofia?
Eu acho que são diversos fatores e que mulheres distintas são afetadas de maneiras diferentes pelo machismo, pelo racismo, pela LGBTQ fobia e pelo elitismo que existem na sociedade brasileira e também na universidade, evidentemente. Isso não é prerrogativa de nenhuma área do conhecimento no Brasil, mas parece que algumas são mais refratárias às mulheres e mais ainda às mulheres que se apresentam na intersecção de formas distintas de sujeição. Na verdade, nós só vamos poder responder a sua pergunta a respeito da área de filosofia com mais segurança quando fizermos pesquisas empíricas que convoquem as estudantes (desde a graduação até o doutorado) e as docentes da área a dizerem quais são as barreiras materiais, simbólicas e institucionais que elas enfrentam para permanecerem na carreira de filosofia no Brasil.
Não existe “a mulher”, uma entidade abstrata. Eu estou envolvida com isso, ouvindo estudantes de diferentes estados há mais de um ano, e em breve terei algo a apresentar para a comunidade acadêmica. Nós precisamos ouvir as mulheres, no plural, que escolherem a carreira de filosofia, sem isso ficaremos pressupondo muitas coisas, e corremos o risco de projetar nas outras pessoas as nossas experiências particulares. Perderíamos, então, a chance de entender o que eu disse no início: ainda que as mulheres, em geral, sejam afetadas por estereótipos de gênero, estes estereótipos não agem da mesma maneira sobre mulheres brancas, negras e indígenas e também não afetam do mesmo modo mulheres de classe média e alta e mulheres pobres, oriundas de outros territórios, das periferias. A minha questão é: nós, docentes, precisamos nos engajar em tentar compreender como os preconceitos afetam essas diferentes mulheres quando elas chegam na universidade e nas nossas salas de aula.
Do ponto de vista simbólico, o problema já é bastante complexo porque a nossa sociedade é profundamente racista, sexista, LGBT fóbica, elitista… e evidentemente a universidade não está livre de nada disso. No caso da filosofia, infelizmente, ainda vejo muitos colegas esperando aquele aluno brilhante, perfeito, que estudou em escola privada, já viajou para o exterior, fala outra língua… ora, essas pessoas estão se esquecendo que a universidade deve formar e formar na diversidade. Ao mesmo tempo, no caso específico das mulheres, precisamos compreender as barreiras materiais e bem concretas que elas enfrentam para permanecer na universidade e precisamos pensar isso junto com a questão da maternidade. Se o Estado está ausente dos cuidados exigidos pela reprodução social, é evidente que as mulheres mais pobres terão muito mais dificuldade para permanecer na universidade quando se tornam mães. Quem vai cuidar dos seus filhos se não há creches públicas de tempo integral e se elas não podem pagar uma babá? A baixa presença ou permanência de mulheres negras e mulheres brancas que não tem apoio financeiro da família nos cursos de filosofia é indicio mais do que persuasivo de que não podemos avançar uma reflexão sobre o desequilíbrio de gênero na área sem levar a sério a intersecção entre formas distintas de opressão. É o que Angela Davis nos diz desde “Mulheres, Raça e Classe” (1981).
Davis é uma filósofa muito potente, que traz essa questão para o centro das suas reflexões sobre a opressão e o poder nas sociedades contemporâneas. O nosso passado (e o nosso presente) escravocrata me obriga a ler Davis junto com as minhas alunas e com os meus alunos de filosofia. Voltando especificamente à sua pergunta, nós já temos algumas coisas a dizer a respeito especificamente da área de filosofia no Brasil, afinal a questão da baixíssima presença de mulheres na área tem sido objeto da nossa discussão nos últimos dois ou três anos com bastante intensidade, embora não seja um tema novo. O que é novo: finalmente, a comunidade filosófica brasileira está aceitando discutir abertamente sobre desequilíbrio de gênero.
Eu começo mencionando que na Unicamp, por exemplo, a pós-graduação em filosofia é a mais desequilibrada do IFCH (a média do IFCH é de aproximadamente 50% de mulheres enquanto na filosofia apenas 24,56% são mulheres) e, mais impressionante ainda, o PPG de filosofia é mais desigual do que a pós-graduação do Instituto de Matemática e Computação (31,60% de mulheres) e do Instituto de Física (27,88% de mulheres). É interessante notar que a filosofia está mais próxima da matemática e da física – neste desequilíbrio – do que da história, da antropologia, da sociologia e talvez isso se relacione com o fato de que as mulheres, desde muito cedo, ainda meninas e na escola, são convencidas de que elas não são aptas para os números, para os cálculos, para o pensamento especulativo, lógico e formal. Nós, docentes de filosofia, sentimos isso na sala de aula: os alunos se mostram muito mais seguros para os voos especulativos e para os cálculos do que as alunas. A professora Gisele Dalva Secco da UFSM está desenvolvendo uma pesquisa sobre isso com foco no ensino da lógica e logo teremos mais elementos para avaliar este aspecto do problema.
Outro fator importante: o cânone é feito por homens e a história da filosofia é uma conversa entre filósofos, para a qual as filósofas mulheres não foram convidadas a participar. Precisamos nos perguntar sobre o impacto desse fator na perenização da desigualdade de gênero na área e na experiência das nossas alunas, afinal, as nossas bibliografias de curso são quase que unanimemente dominadas por homens. Não é incomum que uma aluna passe por um curso de filosofia sem ler uma única filósofa mulher! Ora, isso é sexismo, afinal, há filosofas mulheres em todos as épocas da história. Se nós queremos mais mulheres nas nossas salas de aula, precisamos repensar o cânone e isso está sendo feito em diversos lugares do mundo, em centros de pesquisa sediados em universidades de excelência nos Estados Unidos, na Alemanha, na Inglaterra. Aqui no Brasil, somos muitas docentes e pesquisadoras avançando nesse sentido. Esta conferência que está acontecendo no Rio de Janeiro é um sinal muito positivo de que estamos avançando.
Outro aspecto que deve ser levado em consideração: esses mesmos filósofos que nós lemos – e devemos ler porque disso depende a nossa formação em história da filosofia – são quase que unanimemente misóginos e, desde Aristóteles, disseminam o mito da precariedade racional, moral e política das mulheres. Imagina a experiência de uma aluna que entra aos 18 anos no curso de filosofia e passa os seus dias lendo uma literatura que a despreza. A queda no número de mulheres ao longo da formação – da graduação para o mestrado, por exemplo – pode ter a ver com isso e pelo que eu tenho ouvido nas minhas conversas com as alunas, tem sim. O que podemos fazer? Mostrar para as nossas alunas e para os nossos alunos, que sempre houve quem questionasse (ou simplesmente desafiasse com a sua presença) a misoginia dos filósofos, que sempre houve mulheres na filosofia: Mary Wollstonecraft, Anne Conway, Elisabeth, Emilie du Châtelet, Hannah Arendt entre tantas outras. Nós precisamos ler as mulheres e democratizar as nossas bibliografias de curso.
Como você avalia nosso atual estágio de enfrentamento a essas dificuldades que você identifica? O que é preciso ser feito para que a realidade seja diferente e o que tem sido feito? Ao te questionar, sobre isso, também levo em conta a narrativa da História da Filosofia e reescrita do cânone. Inquestionavelmente, há mulheres filósofas em toda a História da Filosofia, ainda que não as conheçamos. Qual a tarefa das filósofas e filósofos para que elas sejam conhecidas?
Se nós concordamos que são diversos os fatores que dificultam a entrada e a permanência das mulheres na carreira, concordamos também que os remédios devem ser distintos e combinados. Vamos começar sobre o que é bem específico da área: como eu disse anteriormente, proponho que a gente intensifique a democratização das nossas bibliografias, incluindo as filósofas mulheres, as comentadoras, as historiadoras da filosofia. Isso começa a ser feito com mais intensidade em diversas universidades brasileiras e é, na minha opinião, a ação mais interessante a longo prazo porque ela pode ter um importante efeito sobre a cultura androcêntrica dos círculos filosóficos brasileiros.
Outra medida potente, com lastro filosófico e político, é ministrar disciplinas sobre filósofas feministas: a crítica que elas fazem à história da filosofia ocidental por ter excluído os pontos de vista das mulheres e a crítica à construção do sujeito moderno – um cara que não tem corpo, não tem história, não está relacionado às outras pessoas (porque é um “indivíduo autônomo”) – tem um potencial enorme para alargar a mentalidade de estudantes, pesquisadores e professores. Eu realmente acho que se os professores de filosofia (homens e mulheres) se dispusessem a ler um pouco as filósofas feministas (Angela Davis, Judith Butler, Seyla Benhabib por exemplo), teriam a oportunidade de perceber como os seus modos de pensar e fazer filosofia foram construídos no contexto de uma cultura filosófica que privilegia um certo modelo de sujeito que parece neutro (um “universal”) mas é que o estereótipo do masculino. Acho que todos teríamos a ganhar com isso, visitando outros pontos de vista filosóficos, ampliando a nossa mentalidade filosófica.
Precisamos pensar também na composição das bancas de processo seletivo da pós-graduação e de contratação de professores: é claro que nós buscamos competência e excelência na composição das bancas, mas competência na diversidade. Não podemos mais conviver bem com ideia de bancas compostas apenas ou majoritariamente por homens, devemos procurar um maior equilíbrio e tenho certeza de que seremos capazes de fazer isso. É importante também prestar atenção na distribuição das bolsas de estudo no contexto específico do mapa de gênero de cada programa: se o programa é muito desequilibrado como um todo ou em subáreas específicas, vale conversar internamente a respeito de ações que possam a longo prazo mudar o quadro.
Sobre os congressos, a mesma coisa. Hoje em dia antes de aceitar um convite eu pergunto sobre a composição de gênero da programação: se só tem homem (o que é bem comum), eu reclamo, sugiro outras mulheres, perturbo mesmo. É preciso também que a gente assuma um cuidado bem especial com as mulheres que engravidam, em qualquer momento da carreira. É integralmente injusto exigir de uma mulher que esteja cuidando de um bebê que ela tenha o mesmo ritmo de trabalho que outras mulheres ou homens que não estejam com a mesma incumbência. Me preocupa sobretudo que a gente construa para elas um ambiente mais amoroso, que valorize a reprodução social, que a ajude, portanto, a conviver melhor com a ideia de que naquele curto período de tempo o ritmo da produção acadêmica vai diminuir para logo aumentar, lentamente, de novo. Ou seja, ela não deve sentir que a espada do lattes está apontada para ela e nós podemos intervir para que isso de fato não aconteça, porque causa muito sofrimento, digo por experiência.
Outras coisas a serem feitas: criar espaços para que as nossas alunas possam falar sobre as dificuldades que encontram por serem mulheres, sobre os preconceitos implícitos e explícitos que sofrem e que causam sofrimento cotidiano, dentro da sala de aula inclusive. Em um ambiente tão masculino, as jovens mulheres se empoderam conversando, criando redes de solidariedade, lendo mulheres, etc. Nós, docentes, podemos contribuir com esse processo de empoderamento individual e coletivo das alunas. Eu tenho excelentes orientandas, pesquisadoras de primeira linha, mas não raro elas têm menos confiança em si mesmas do que os homens. Eu posso ajudar nisso.
É urgente também priorizarmos o problema do assédio e, sobretudo, criar espaços institucionais adequados para o atendimento às vítimas de assédio e violência sexual. A Unicamp está dando passos muitos significativos nesse sentido e no mês passado o CONSU aprovou a criação da Secretaria Especial de Atenção à Violência Sexual. Recentemente, o reitor Marcelo Knobel admitiu publicamente que a universidade não está livre deste enorme problema e que, portanto, é preciso enfrenta-lo ao invés de escondê-lo. Isso é muito bom, é a instituição dizendo à sociedade que não é conivente com práticas que violentam (de diversas maneiras) as mulheres. Todas essas medidas que eu mencionei exigem, para serem efetivas, da cooperação dos nossos colegas, dos estudantes, dos homens. Como lembra Bell Hooks, o feminismo é para todos e, se não for, teremos que decretar de antemão a nossa derrota. Se eu defino o feminismo como uma luta contra a opressão das mulheres no plural, essas ações estão plenamente de acordo com uma luta feminista e, insisto, com uma luta que é de todas as pessoas que não aceitam que as mulheres sejam naturalmente inferiores aos homens ou naturalmente mais afeitas a certas carreiras e profissões.
Nós temos encontrado excelentes parceiros na construção de uma outra cultura na área de filosofia e, por isso, eu acho que vamos avançar. Temos encontrado muita resistência também, mas não poderia deixar de ser diferente no quinto país mais machista do mundo. Se eu puder dizer uma coisa às minhas colegas, eu diria o seguinte: procurem parcerias dentro dos seus departamentos. Precisamos agir em conjunto, essa batalha não se trava individualmente. Se você encontrar mais alguém que compartilhe essas preocupações, uma revolução está em curso. Eu tenho a sorte enorme de ter ao meu lado, na Unicamp, a professora Monique Hulshof.
Em sua fala durante o evento, ao se referir aos números da pesquisa acerca da desigualdade de gênero na Filosofia, você disse: “esta realidade não é boa para ninguém”. Como homens e mulheres perdem com a desigualdade de gênero em nossa área?
A universidade é um local destinado à produção e à transmissão do conhecimento. Nenhuma área pode manter as portas fechadas para as mulheres primeiro por uma questão de justiça – as mulheres precisam poder escolher, como os homens, o que querem estudar -, em segundo lugar porque a pluralidade de perspectivas é condição necessária da democracia e também da boa produção científica. Imagine um espaço de produção de conhecimento no qual as hipóteses são formuladas por homens, com base em conhecimento prévio formulado por homens, informadas por uma literatura produzida por homens e, que são, finalmente, testadas e criticadas por homens. A chance desse procedimento perenizar mitos e estereótipos é enorme. A chance desse procedimento produzir um conhecimento precário, parcial e empobrecido também é enorme. Estamos ouvindo há muito tempo as vozes dos homens brancos, nem eles mesmos devem se aguentar mais! Tenho certeza de que eles vão gostar de ouvir outras vozes, ajuda a quebrar o narcisismo e isso é bom para todo mundo.
Nós queremos nos juntar a eles, entrar pela porta da frente e não queremos mais que ninguém entre pela porta de trás. O melhor que temos a fazer é democratizar a área de filosofia e corrigir o seu desequilíbrio de gênero e também o seu absurdo desequilíbrio racial. Tenho muita satisfação por ter implementado, no programa de pós-graduação em filosofia da Unicamp, o processo seletivo com ação afirmativa para estudantes autodeclarados negros. As mulheres negras também querem fazer filosofia. Vamos deixá-las de fora? Um curso de filosofia no Brasil não tem esse direito.
Como você, como professora, tem atuado para que isso seja diferente?
Eu tenho ministrado disciplinas sobre filósofas, já faço isso há alguns anos com Hannah Arendt e Seyla Benhabib, sobre as quais versa a minha pesquisa atual. Tenho intensificado os meus estudos feministas e incorporado filósofas feministas nas bibliografias de curso. Este semestre eu estou ministrando na pós-graduação um curso sobre o conceito de interseccionalidade. Eu faço uma abordagem deste tema a partir de Angela Davis, Lélia Gonzales, Bell Hooks, Patrícia Hill Collins, Sueli Carneiro e Djamila Ribeiro. Nem todas essas autoras se identificam como filósofas, mas todas elas têm algo a contribuir para uma reflexão deste tema do ponto de vista filosófico, que é o meu.
No segundo semestre de 2019 eu vou ministrar uma disciplina semelhante no curso de graduação em filosofia, vamos ler autoras negras (filósofas, sociólogas e teóricas críticas) que analisaram os temas da opressão e da agência à luz da intersecção entre gênero, raça e classe. Eu estou também trabalhando em parceira com colegas de diversas universidades brasileiras na criação da Rede Brasileira de Mulheres na Filosofia e na criação do Blog Mulheres na Filosofia.
O Blog, que será sediado na Rede de Blogs Científicos da Unicamp, pretende ser um veículo para trabalharmos em rede neste país de dimensão continental. A ideia é mobilizar a comunidade acadêmica para escrever verbetes sobre mulheres filósofas de todos os períodos da história e para compartilhar experiências inovadoras em sala de aula (material didático, programas de curso) envolvendo o nosso tema. Teremos também uma área especifica do Blog com verbetes temáticos sobre feminismos (feminismo e teoria crítica, feminismo e psicanálise, feminismo e pós-estruturalismo, entre muitos outros) e um canal no Youtube com vídeos e também podcasts.
O canal será inaugurado com entrevistas com pesquisadoras e professoras de diversas universidades, queremos ouvir as mulheres falando sobre as suas pesquisas em lógica, metafísica, teoria do conhecimento, ética e filosofia política, queremos ouvi-las a respeito das suas experiências na área enquanto pesquisadoras mulheres. A estrutura desse blog está sendo desenhada com Carolina de Araújo (UFRJ), Gisele Secco (UFSM) e Nastassja Pugliese (UFRJ), mas já há muitas docentes envolvidas (e alguns docentes também!), de diversas universidades: UFRJ, UNB, UFLA, UFABC, UFGRS, UFSC, só para citar alguns exemplos. Na verdade, tudo isso começou em 2018 no I Encontro Vozes organizado pela Gisele em Porto Alegre. Ali foi dado o pontapé, em 2018 nós organizamos a segunda edição na Unicamp com docentes de dez universidades públicas. Dali saiu a ideia da rede e do blog. São muitas cabeças pensando e agindo em cooperação. Agora nós estamos aqui neste maravilhoso evento internacional, que não teria acontecido sem o trabalho incansável da Katarina Peixoto e, pelo andar da carruagem, muitos outros virão e muitas outras parcerias serão construídas.
O desafio que a gente tem é estreitar laços e criar espaços de conversa em um país tão grande. Nós esperamos que o Blog Mulheres na Filosofia e a Rede encurte as distâncias e ajude nessa comunicação. Em um segundo momento, nós queremos trabalhar em rede com associações internacionais de mulheres na filosofia e com centros de pesquisa sediados em instituições na América Latina, nos Estados Unidos, na Alemanha, no Canadá, etc.