O evangelho do neocolonialismo
Em livro lançado este ano, conselheiro pessoal de Anthony Blair recomenda usar “dois pesos e duas medidas” nas relações internacionais. Referindo-se aos países do Sul, propõe: “Respeitamos a lei, mas quando agimos na selva, devemos usar a lei da selva”Philip S. Golub
Os norte-americanos não são os únicos a sonhar com o império e a recolonização: os meios dirigentes ingleses também buscam um substituto ou um império de consolação. Igualmente engajados na luta transcendente contra o “mal”, os assessores de Anthony Blair refletem sobre a oportunidade de um “novo imperialismo liberal”. Robert Cooper, conselheiro pessoal do primeiro-ministro para política externa, lançou no mês de abril um programa que fez muito barulho no Reino Unido.
No mundo imaginado por Cooper, a Europa e de maneira geral o Ocidente deveriam “habituar-se a usar dois pesos e duas medidas”. Segundo ele, “devemos, entre nós, agir segundo as leis e nos limites de um [sistema] de segurança aberto e cooperativo. Em outros lugares, quando se trata de países situados fora do continente pós-moderno europeu, devemos voltar aos métodos mais duros de uma época anterior: a força, o ataque preventivo, a esperteza, em resumo, tudo o que é necessário para cuidarmos dos que ainda vivem na guerra de todos contra todos do século XIX”. Entre nós, acrescenta ele, “respeitamos a lei. Mas quando agimos na selva, devemos usar a lei da selva”.
Um colonialismo altruísta
Paul Johnson, um historiador inglês de direita, acha que os EUA e seus aliados “deverão não apenas ocupar, mas também governar Estados terroristas”
A selva situa-se evidentemente na África, na América Latina e na Ásia, onde “o caos é a norma e a guerra uma maneira de ser (way of life)”. Então, “ainda que as palavras império e imperialismo se tenham tornado termos de opróbrio na Europa, as oportunidades, senão a necessidade da colonização, são tão grandes quanto eram no século XIX”. Em síntese, segundo Cooper, o que precisamos hoje “é uma nova forma de imperialismo, aceitável do ponto de vista dos direitos humanos e dos valores cosmopolitas […]. Um imperialismo que tem por meta, como todo imperialismo, instaurar a ordem e a organização […]. Como Roma, [o Ocidente] transmitirá aos cidadãos do império algumas de suas leis, lhes fornecerá um pouco de dinheiro e construirá algumas estradas1“.
O teórico trabalhista talvez se tenha inspirado, melhorando-as, nas sugestões de um historiador inglês de direita, Paul Johnson que, anos atrás, elaborara uma visão semelhante. Num artigo publicado no New York Times Sunday Magazine, em 1993, Johnson considerava que “alguns Estados não são capazes de se governar a si mesmos […]. Essa é uma missão para o mundo civilizado que deve ir governar essas regiões desesperadas”. E acrescentava que o Ocidente “terá a satisfação de receber a gratidão de milhões de pessoas que, graças a este renascimento altruísta do colonialismo, encontrarão a única porta de saída possível para sua miséria2“. Pouco depois dos atentados de 11 de setembro, o mesmo autor justificara a colonização da China no século XIX nestes termos: “As grandes potências civilizadas introduziram na China, um país incoerente e vasto, o princípio da extraterritorialidade […]. Em 1900, um grupo militante terrorista, denominado Boxers, tomou Pequim de assalto com a aprovação tácita do governo […]. Uma força internacional foi então criada para retomar Pequim, incluindo, além das tropas européias, forças norte-americanas e japonesas […]. Hoje, os Estados Unidos e seus aliados se encontrarão, talvez, na situação de que deverão não apenas ocupar, mas também governar Estados terroristas”. De modo claro: “Os países que não podem viver em paz […] não devem esperar uma independência total3.”
(Trad.: Teresa Van Acker)
1 – Ler, de Robert Cooper, “The New Liberal Imperialism”, The London Observer, 7de abril de 2002.
2 – Ler, de Paul Johnson, “The New Colonialism”, New York Times Sunday Magazine, 18 de abril de 1993.
3 – Ler, de Paul Johnson, “The Ans