O verdadeiro sentido das fake news
Deflagrada após a votação do Brexit e da eleição de Donald Trump em 2016, a grande batalha dos governos liberais contra as fake news parte de um pressuposto: se as pessoas fossem corretamente informadas, votariam bem, isto é, neles. Seria possível que, pelo contrário, a contestação por vezes delirante do discurso dominante expressasse uma autêntica aspiração popular por mudança?
Poucos dias após a inauguração do segundo mandato presidencial de Donald Trump, sob o olhar benevolente dos oligarcas do Vale do Silício, o papa Francisco alertava contra a “desinformação”. “Muitas vezes”, observava então o soberano pontífice, a comunicação “simplifica a realidade para provocar reações instintivas”.[1] Ainda que seja inevitável esboçar um sorriso ao imaginar que a Igreja Católica – aquela da concepção imaculada, da ressurreição dos mortos e da transformação da água em vinho – se coloque na linha de frente do combate pela verdade, seu diagnóstico é compartilhado por amplos setores do meio intelectual e midiático. Desde a vitória do Brexit no referendo sobre a permanência do Reino Unido na União Europeia, em junho de 2016, a proliferação de manchetes chamativas sobre as fake news e a “pós-verdade” assenta-se, com poucas variações, em uma mesma narrativa: a informação hierarquizada por algoritmos que valorizam a viralização, a polarização e as…