Os filhos de Zapata
Ramón Chao
“A caminhonete verde oliva saiu do campo militar de madrugada, escoltada por dois veículos, e tomou o anel periférico, obscurecido a essa hora pela cerração. Andava em alta velocidade na autoestrada deserta em direção ao sul.” Os militares dirigiam-se à localidade balneária de Acapulco. Turistas, milionários e traficantes de droga. A alguns quilômetros, a Sierra Madre del Sur, habitada por mestiços e índios. Estamos no Estado de Guerrero que é, juntamente com o de Chiapas e o de Oxaca, um dos mais pobres do México. Desde a revolução de 1910, o poder local pertence a caudilhos. É aqui que Emiliano Zapata se insurgiu e foi, em 1919, crivado de balas. Em 1963 Genaro Vasquez, um professor primário, abandonou a luta pacífica. Como Zapata, ele se identificou com seu meio e pegou em armas à frente da Associação Nacional Cívica Revolucionária (ANCR). Genaro Vasquez morreria em 1972, segundo a versão oficial num acidente de automóvel.
Carlos Montemayor, poeta e romancista mexicano, conta-nos o resto: no fim dos anos 60 um outro professor primário, Lucio Cabañas, encarna novamente a resistência, funda o Partido dos Pobres (PDLP) e entra na clandestinidade. O PDLP prega “uma nova ordem política e econômica através da expropriação das fábricas e das grandes propriedades”. As ações dos insurrectos multiplicam-se e culminam, em 20 de maio de 1974, no sequestro de Rubén Figueroa pai, candidato do partido oficial, o Partido Revolucionário Institucional (PRI), ao lugar de governador do Estado.
A rebeldia que não morre
Carlos Montemayor escreveu este romance em 1991, três anos antes da insurreição zapatista do subcomandante Marcos. “Ou seja, a História se repete e arma, perigosamente, armadilhas para a vida dos exércitos”, reconhece o general Hernandez. Encarregado de sufocar a rebelião, ele constata que as guerrilhas reaparecem de modo cíclico nos Estados do sul do México [1]. “O essencial neste caso”, explica um outro general (Escarcega) a seus colegas, “é o apoio organizado das populações serranas. Não se trata absolutamente de um punhado de insurrectos armados que se deslocam de um lugar a outro, independentes e isolados, como outros terroristas; as pessoas os ajudam, apóiam e escondem”. Com o assassinato de Lucio Cabañas, em dezembro de 1974, crivado de balas como Zapata, uma nova etapa da guerrilha rural tem fim. Deixava um saldo de muitas centenas de mortos e de trezentos desaparecidos apenas no Estado de Guerrero.
Vinte anos mais tarde, a luta será retomada em Chiapas (e em Guerrero). O Exército responde sempre da mesma maneira, ontem como hoje. Os paramilitares organizam massacres coletivos, o Exército ocupa as aldeias e lugarejos, levanta a lista dos habitantes, e todo e qualquer homem ausente é declarado zapatista. “Nossa ação não deverá se reduzir a uma contra-guerrilha nem a uma limpeza da região, mas deve ser um controle de toda a zona. (…) É preciso enfrentar o povo, sitiar a aldeia e agir como se toda a população fosse cúmplice de Lucio Cabañas”, concluía já, na época, o general Escarcega.
Guerre au Paradis , de Carlos Montemayor, traduzido do espanhol (México) por Anny Amberni, Gallimard, Paris, 1999, 443 p