A ameaça da guerrilha naxalita
Nascido em 1967, esse movimento maoísta contesta a maior democracia do mundo. E representa, segundo o primeiro-ministro indiano Manmohan Singh, o “maior desafio para a segurança interna” desde a independência. A ação insana suscita reações igualmente cruéis e quem sofre é a população autóctone, espremida entre os dois fogos
Perdido no coração do estado de Chhattisgarh, no centro da Índia, o forte de Rani Bodli confronta a escuridão intimidadora da selva, metralhadoras apontadas na direção das árvores. Em 15 de março, ao amanhecer, centenas de guerrilheiros maoístas atacaram, surgindo da mata. Sufocados, 55 policiais e reservistas foram mortos. Só doze homens, feridos, sobreviveram. Quanto aos reforços, levaram três horas para percorrer os oito quilômetros que os separavam dos sitiados.
Algumas semanas depois do massacre, sentado à sombra de uma mangueira, o cotovelo apoiado em sua Kalachnikov, o suboficial Essaryado parece se perguntar o que está fazendo ali. Em torno dele se agitam suas tropas, na maior parte formada de reservistas batizados de SPO (Special Police Officer), jovens demais e sem experiência. “Este posto de polícia foi construído em 2005”, explica. Nova Déli se esforçava, então, por recuperar sua posição naquelas selvas, domínio da resistência comunista desde os anos 1980. Um controle puramente formal: temendo emboscadas, os policiais pouco se aventuram fora de sua fortaleza. “Para ir à cidade, tomamos o ônibus, como os civis, pois é mais seguro”, comenta Essaryado, com amargura.
Em caso de novo ataque, essa guarnição conhecerá certamente o mesmo destino sombrio da anterior. Em 2006, 749 pessoas foram mortas no conflito que opõe os rebeldes comunistas à república indiana; e outras 483, entre janeiro e setembro de 2007 [1]. A situação de Rani Bodli resume a perplexidade do gigante indiano ante o avanço da insurreição.
A guerrilha naxalita nasceu em março de 1967, quando os camponeses da aldeia de Naxalbari (Bengala) se apoderaram do arroz de um proprietário rural. Desde esse levante, diferentes grupos armados maoístas implantaram seus esconderijos nas selvas e nos campos isolados: militarmente ativos, mas estagnados, como incêndios privados de oxigênio. Foi somente em setembro de 2004 que tomaram um novo alento, quando os dois principais movimentos, o Grupo da Guerra Popular (PWG), estabelecido no centro do país, e o Centro Comunista Maoísta da Índia (MCCI), ativo em Bihar, se fundiram para formar o Partido Comunista da Índia (CPI), maoísta e proscrito.
Desde então, os naxalitas estenderam suas atividades a catorze e, em seguida, a dezesseis dos 28 estados indianos. Em agosto, eles operavam em 192 dos 602 distritos, abrindo um verdadeiro “corredor vermelho” de 92 mil quilômetros quadrados, da fronteira do Nepal até o litoral sudoeste [2]. Nova Déli teme uma extensão da guerrilha ao Gujarate, ao Rajastão, ao Himachal Pradesh, ao Jammu e à Caxemira, e percebe a vontade dos insurgentes de agir nos centros urbanos (Calcutá, Bombaim, Ahmedabad etc.) [3].
“O naxalismo é o maior desafio para a segurança interna que nosso país já teve de enfrentar”, declarou o primeiro-ministro Manmohan Singh (Partido do Congresso), em abril de 2006, diante dos governadores dos estados. De fato, diferentemente dos separatistas da Caxemira ou dos estados do nordeste, o naxalismo quer conquistar o conjunto do território indiano. E uma solução negociada parece improvável, já que os insurgentes têm o objetivo de levar a cabo uma revolução.
O encontro com um dirigente
Vamos chamá-lo de Patel. Este alto dirigente naxalita nos recebe numa metrópole indiana [4]. Para nosso interlocutor, as declarações de Singh constituem uma confissão de derrota e de pânico das elites. “Nosso objetivo é controlar o campo, onde o Estado é fraco, e depois gradualmente estender esse poder popular até as cidades. É uma estratégia de longo prazo. Mas a globalização e suas conseqüências, a pauperização e as desigualdades, aceleram esse processo”. Diretor do Institute of Conflict Management (ICM), em Nova Déli, Ajai Sahni explicita esse modus operandi: “Numa determinada área, os maoístas estudam a situação social. Por intermédio de organizações simpatizantes, eles mobilizam as massas em torno de reivindicações e despertam sua consciência política. Em seguida localizam os elementos mais motivados para transformá-los em combatentes. Quando surge a violência, já é tarde demais para que o Estado intervenha”. Sahni explica que os serviços secretos há muito tempo abriram mão de se infiltrar nessas organizações de fachada. Sete delas, porém, foram proscritas em Orissa.
Segundo as estimativas, a guerrilha conta com uma força de 10 mil a 20 mil combatentes, aos quais se somam ainda 40 mil militantes que asseguram a logística. Ela se beneficiaria do treinamento dos Tigres Tâmeis do Sri Lanka [5], principalmente para o manejo dos explosivos. Embora negue qualquer ajuda dos separatistas tâmeis, Patel confirma o que Nova Déli suspeita: muitas armas são tomadas dos policiais mortos, mas uma parte é fabricada por artesãos e pequenas empresas. “Pelo país afora, há oficinas que produzem gatilhos, outras produzem coronhas etc.”, sorri. “O conjunto é montado em local seguro”. Assim, a polícia de Andhra Pradesh descobriu, em setembro de 2006, um esconderijo contendo 875 foguetes, fabricados em oficinas clandestinas de Chennai (a antiga Madras), no Tamil Nadu.
No plano financeiro, os maoístas recorrem ao “imposto revolucionário”, achacando as empresas e os comércios que se encontram nas proximidades de seus esconderijos. “Cada um deve pagar uma taxa que chega a 12% de seus lucros”, explica, em Nova Déli, P. V. Ramana, pesquisador da Observer Research Foundation (ORF). “Os inadimplentes têm seus bens incendiados. Ou pior”. Embora se recusem a admitir, os grandes grupos industriais também fazem uma contribuição. “Alguns estão implantados em plena zona rebelde. Estranhamente, eles nunca são atacados”, observa um jornalista de Chhattisgarh. Ramana calcula o orçamento anual do CPI-Maoísta em 2,5 bilhões de rupias (46 milhões de euros): “no mínimo, levando-se em conta suas atividades”.
Patel e seus homens almejam a vitória? “Em outros tempos, ninguém teria imaginado os maoístas no governo do Nepal”, enfatiza ele. Sem dúvida, mas a Índia é a maior democracia do mundo, e não um pequeno país montanhoso, governado por um déspota odiado. Convencidos da justeza da luta armada, os naxalitas negam qualquer legitimidade às instituições de Nova Déli. Interrogado por escrito, por intermédio de Patel, o secretário-geral do partido clandestino, Ganapathi, denuncia o parlamentarismo indiano: “Os que entram no Parlamento não passam de fantoches nas mãos dos lobistas. Pode-se falar de democracia quando os eleitores são comprados com dinheiro ou álcool, quando os eleitos exaltam o pertencimento étnico, religioso ou de casta?”
As compras de votos são freqüentes na Índia e, de fato, há políticos que atiçam as tensões para firmar seu poder. Assim, Narendra Modi, do Bharatiya Janata Party (BJP, ultranacionalista hindu de direita), chefe de governo do Gujarate e em parte responsável pelos pogroms antimuçulmanos de fevereiro de 2002, foi reeleito graças a sua islamofobia. Por outro lado, a questão das castas continua permeada pela tragédia: em dezembro de 2006, 46 pessoas acusadas de terem queimado vivos sete intocáveis na aldeia de Kambalapalli (Karnataka) foram absolvidas. Os naxalitas conclamam os 125 milhões de dalits (intocáveis) a se juntar às suas fileiras.
Por fim, as práticas da esquerda no poder reforçam as convicções dos rebeldes de que o parlamentarismo corrompe o revolucionário. Em 14 de março, em Nandigram (Bengala ocidental), a repressão de uma manifestação de camponeses que se opunham à expropriação de suas terras com vistas a criar uma “zona econômica especial” (zona franca) deixou catorze mortos. As forças da ordem foram auxiliadas em sua tarefa por militantes armados do Partido Comunista, que governa o estado há três décadas. Ganapathi aponta igualmente os limites do sucesso da Índia na globalização (o país ostenta este ano 9,4% de crescimento econômico): “Muitos produtos de luxo de ontem se tornaram as necessidades de hoje. E a lista dessas necessidades aumenta com a proliferação dos bens de consumo e a promoção do consumismo pelo mercado! Daí uma crescente frustração”.
As cidades se cobrem de centros comerciais, o parque automobilístico se desenvolve, e por todo lado soam os telefones celulares. Mas a Índia permanece na 126ª colocação (entre 186 países) em termos de índice de desenvolvimento humano (a China está na 81ª posição). Cerca de 400 milhões de indianos sobrevivem com um dólar por dia. E uma em cada duas crianças passa fome [6].
No coração do “corredor vermelho”
O estado de Chhattisgarh localiza-se no coração do “corredor vermelho”. Três mil rebeldes controlam ali 25 mil quilômetros quadrados. A população do sul do estado é formada em 80% por “tribais” adivasis [7], pobres e, na maioria, analfabetos. Como o poder estatal sempre se manifestou por meio da arbitrariedade de funcionários corruptos, os naxalitas vieram preencher uma lacuna: “A miséria dos adivasis, explorados e despossuídos, propiciava a situação clássica para fazer deslanchar uma revolução comunista”, enfatiza o Centro Asiático pelos Direitos Humanos (ACHR) num relatório de 17 de março de 2006 sobre Chhattisgarh. Achacados pela polícia, pelos guardas florestais e pelos agiotas, os camponeses e caçadores-coletores adivasis ficaram felizes ao ver a guerrilha expulsar ou punir os malfeitores. Os naxalitas também conseguiram fazer com que os adivasis vendessem a preços melhores sua safra de folhas de tendu (Diospyros melanoxylon), com as quais são enrolados os cigarros bidi. “O governo nunca fez nada por nós”, testemunham os aldeões simpáticos à guerrilha. “Antes da chegada dos naxalitas, os policiais nos saqueavam”.
Mas o apoio dos autóctones aos maoístas é muito relativo. Com grande mobilidade, as colunas de guerrilheiros vão e vêm. Um professor conta que de 20% a 30% dos adolescentes se juntam aos rebeldes, “por opção ou coerção”. Aqui, a escola e os poucos prédios oficiais estão em ruínas: a guerrilha os explodiu para evitar que servissem de caserna. Concentrados em seus objetivos militares, os naxalitas parecem desprezar as necessidades daqueles a quem supostamente representam. “Eles formaram uma adolescente em medicina, mas ela não pôde permanecer aqui para cuidar de nós”, declaram os aldeões. “Teve de partir com eles para o esconderijo.” Pior do que isso, em 1993, setenta adivasis foram mortos pela guerrilha em represália a uma rebelião.
Chhattisgarh experimenta há dois anos uma política semelhante à que Washington conduziu durante a Guerra do Vietnã: desenvolvimento de milícias antiguerrilha e confinamento forçado dos civis em “povoados estratégicos”. Vazios, os campos não abastecem mais os rebeldes e a área está livre para as operações de comandos. Mao Tse-Tung dizia que a guerrilha deve estar no meio do povo como um peixe na água. Na opinião de um alto funcionário da polícia de Chhattisgarh, para destruir os rebeldes é preciso “secar a lagoa e sufocar o peixe”. Em conseqüência dessa estratégia, Chhattisgarh reúne sozinho a metade das vítimas do conflito. Dezenas de milhares de pessoas se tornaram refugiados e as violações dos direitos humanos de parte a parte são recorrentes, pois o Estado e os rebeldes disputam o controle da população.
Com efeito, em junho de 2005 nascia a milícia Salwa Judum. Esse movimento é apresentado pelas autoridades de Chhattisgarh como uma “reação espontânea” de aldeões cansados de ter de alimentar os rebeldes e determinados a expulsá-los de suas terras. Os naxalitas o consideram uma milícia paramilitar, capitaneada pelo BJP e pelo chefe da oposição Mahendra Karma (do Partido do Congresso). O próprio nome Salwa Judum se presta à confusão: na língua gondi, pode se traduzir por “campanha pela paz” ou “caçada purificadora”. Única certeza: a Salwa Judum se tornou de fato um instrumento de terror institucional.
Chefe da administração do distrito de Dantewada (sul de Chhattisgarh), K. R. Pisda detalha a situação, apoiando-se nos números: “O distrito tem 700 mil pessoas, distribuídas em 1.153 aldeias. Destas, 644 aldeias estão hoje vazias, e seus 53 mil habitantes, concentrados em 27 acampamentos. Antes do surgimento da Salwa Judum, muitos apoiavam os naxalitas. Hoje, estão com o governo. Sem o apoio que a população lhes dava, fica mais fácil combater os rebeldes”.
Esses povoados estratégicos são cercados de arame farpado e de ninhos de metralhadoras. Uma necessidade, já que os naxalitas os tomam como alvos a fim de forçar a população a residir nas próprias aldeias. Em julho de 2006, atacaram o acampamento de Errabore, matando 31 pessoas, entre as quais muitos civis. De fato, os acampamentos nada têm de provisório: as casas são construídas com alvenaria, sinal de que o governo pretende fixar a população ali, de modo definitivo. Por trás dos sorrisos forçados paira um insalubre clima policialesco: uma desconfiança generalizada transparece nas conversas e nos olhares e os refugiados se calam ou mudam de assunto quando chega fulano ou sicrano.
Espremidos entre dois fogos
Sentados sob uma árvore no acampamento de Dornapal, os aldeões de Korapad têm o olhar triste e resignado dos desenraizados. Uma criança de barriga inchada pela desnutrição relativiza as declarações amenas de K. R. Pisda sobre “a melhoria das condições de vida” nos acampamentos, há muito denunciadas como “deploráveis” pelas organizações não-governamentais locais e internacionais. Os guerrilheiros freqüentavam o povoado desde os anos 1980. Sua atitude mudou com o aparecimento da milícia. “Algumas famílias da aldeia eram da Salwa Judum”, explica um ancião. “Os guerrilheiros nos acusaram, a todos, de apoiar a Salwa Judum e tivemos de fugir. Nossos bens ficaram lá. Aqui, não temos nada. Outros refugiados receberam 12 mil rupias [220 euros] do governo para construir uma casa. Mas, quando chegamos, disseram-nos que era tarde demais, que não havia mais dinheiro”. Desempregados, longe de suas terras e de suas florestas, esses homens pavimentam estradas pelo equivalente a 1,10 euro por dia.
Entre dois acampamentos de refugiados, desolação, aldeias desertas e às vezes incendiadas, terrenos incultos, carcaças de gado. As margens da estrada foram desmatadas para diminuir a possibilidade de emboscadas. Num vilarejo em cinzas, uma velha enferma agoniza, sozinha, abandonada por todos. Tendo voltado para apanhar algumas coisas, um homem aponta as casas queimadas: “Nós não queríamos ir para o acampamento, então o pessoal da Salwa Judum nos acusou de sermos maoístas e ateou fogo em tudo”.
Mais ao sul, no acampamento de Errabore, Soyam Bhima, uma autoridade local que se tornou representante da Salwa Judum, explica por que os aldeões não podem voltar para suas casas: “Os rebeldes os matariam”. Atrás dele, um guarda-costas de meter medo, de óculos escuros, equipado com seu fuzil. Uma rua adiante, uma garotinha uniformizada, quando interpelada, se põe imediatamente em posição de sentido. Jave é seu nome. Afirma ter vinte anos, mas não deve ter mais de quinze. Ela é SPO, com salário mensal de 1.500 rupias (28 euros). A menina ainda não teve seu batismo de fogo, mas está ávida por “combater os terroristas”.
Em dois anos, as autoridades recrutaram entre os transferidos cerca de 4 mil auxiliares de polícia. Bucha de canhão destreinada e mal equipada, um SPO não tem chance alguma diante de um rebelde experiente, como demonstra a tragédia de Rani Bodli. Organizações não-governamentais verificaram que muitos desses recrutados, atraídos pela promessa de emprego e inconscientes dos riscos, chegam a ser, às vezes, menores de treze anos, que mentem a idade: a Índia, portanto, emprega crianças-soldados [8]. Interrogado a esse respeito, Thakur Praful, chefe de polícia do distrito, refuta a acusação: “Suas certidões de nascimento provam que têm no mínimo dezoito anos”. O policial finge ignorar que um documento falso custa um punhado de rupias. Como os naxalitas recrutam guerrilheiros de “no mínimo dezesseis anos”, o Centro Asiático pelos Direitos Humanos identificou casos dramáticos de “duplo recrutamento forçado”: numa mesma família, uma criança pode ser guerrilheira e a outra, SPO.
Armar civis para que desentoquem “rebeldes” é, para a manutenção da ordem, o mesmo que o linchamento é para a justiça. Na aldeia de Bijalpur, jovens SPO interrogados sobre seus feitos de armas respondem sem rodeios que “mataram gente”. “A guerrilha dispõe de cúmplices na cidade”. Como reconhecê-los? “Eles têm um comportamento suspeito. Nós os detemos e os interrogamos”.
Em Santoshpur, bem perto de Bijalpur, os corpos de sete homens foram exumados em maio: acusados de serem naxalitas, tinham sido mortos pelas forças da ordem pública e da Salwa Judum. Acampadas sob as árvores, testemunhas do massacre relatam: “Nós não queríamos migrar para os acampamentos. Eles então apanharam aqueles homens e os golpearam a machadadas”. Ato confirmado pelas autópsias. “A Salwa Judum decide quem vai para os acampamentos: eles suspeitam de sermos favoráveis aos naxalitas, então não nos disponibilizam nenhum auxílio”. A Anistia Internacional, por sua vez, denuncia a perseguição de que são vítimas os defensores dos direitos humanos, suspeitos de cumplicidade com os naxalitas: acusação grosseira, já que as ONGs também denunciam a violência cometida pela guerrilha. Uma lei votada em 2005, a “Chhattisgarh Special Public Security Bill”, de fato, pretende reduzir os críticos ao silêncio, a despeito do artigo 19 da Constituição indiana, que garante a liberdade de expressão. Apesar desses abusos constatados, a opção paramilitar se dissemina: nos estados vizinhos de Jharkland e Andhra Pradesh, há sinais de milícias calcadas no modelo da Salwa Judum.
Subsolo repleto de riquezas
Vários observadores e jornalistas locais calculam que, ao esvaziar assim o campo, o governo de Chhattisgarh teria um propósito sem relação com a guerra contra os naxalitas: acelerar a implantação de projetos industriais. Pois, embora a população desse estado seja indigente, seu subsolo fervilha de riquezas: um quinto das reservas de ferro do país estão ali. Ora, os adivasis sabem por experiência que a industrialização não os beneficia em nada. Assim, o complexo mineiro de Bailadilla (1,2 bilhão de toneladas de mineral) não os emprega, por julgá-los insuficientemente qualificados. Desde a independência, milhões de “tribais” foram desalojados em nome de um desenvolvimento do qual não receberam nenhum dividendo.
Em Kalinga Nagar, no estado vizinho de Orissa, adivasis bloquearam uma estrada durante um ano para impedir a venda de suas terras ao grupo industrial indiano Tata. Em 2 de janeiro de 2006, treze deles foram mortos pela polícia num confronto. “Nós tornamos férteis essas terras incultas”, conta Ravinda Jarekar, porta-voz dos manifestantes. “Nenhuma indenização nos vai restituí-la e sabemos que a Tata não nos empregará”. Trinta bilhões de dólares em investimentos são esperados na industrialização de Chhattisgarh, Orissa e Jharkland [9], mas em toda parte os camponeses se recusam a ceder suas terras.
Em junho de 2005, quando nascia a Salwa Judum com sua campanha de transferências forçadas, Chhattisgarh assinava acordos com os grupos industriais Tata e Essar para criar minas e siderúrgicas, afirmando seu compromisso em tornar os terrenos “disponíveis”. O acordo contém uma cláusula de confidencialidade, que o governo se recusou a revelar aos eleitos da oposição, contrariamente ao que exige a lei indiana. Outra coincidência perturbadora: em setembro de 2006, os aldeões de Dhurli tiveram de ceder suas terras à Essar, por uma pequena indenização, sob a ameaça de policiais e na presença de Mahendra Karma, o líder da Salwa Judum.
Essas motivações industriais explicariam o zelo das autoridades em investir em caros acampamentos de refugiados, prontos para se tornar pequenas cidades. Os adivasis de Chhattisgarh estariam, portanto, sendo submetidos a um êxodo forçado. Quando, nesse provisório perenizado, eles tiverem criado raízes, graças a oportunidades econômicas novas e a laços sociais reatados, ninguém duvida que estarão mais propensos a ceder seus roçados incultos infestados de “terroristas”. Focalizado nos serviços, freado por um mundo rural atrofiado, o crescimento econômico da Índia tem uma necessidade imperiosa de industrialização. Esta industrializaÀ
*Cédric Gouverneur é jornalista.