A diversidade nunca foi um ponto de chegada, e sim um ponto de partida
Ganhando força após a vitória do Presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, o movimento contra a diversidade também repercute no Brasil. Marcado por uma crise de inversão de valores, esse movimento desvaloriza a variedade de características humanas e seus impactos socioeconômicos. Trump, ao criticar iniciativas de diversidade, alega que esses programas “criam divisões” e promovem uma “agenda política” que, segundo ele, prejudica a meritocracia e coloca a identidade acima da competência. Esse discurso ganhou eco entre grupos que resistem a avanços inclusivos. É importante lembrar, porém, que o próprio Estados Unidos se beneficiou imensamente de políticas e discursos de diversidade ao longo da história, com avanços que fortaleceram a inovação, a economia e a coesão social do país. Por exemplo, a diversidade cultural e étnica foi fundamental para o desenvolvimento do Vale do Silício, onde imigrantes e pessoas de diferentes origens contribuíram para inovações tecnológicas. Segundo dados da National Foundation for American Policy, mais da metade das startups avaliadas em bilhões de dólares nos Estados Unidos foram fundadas ou co-fundadas por imigrantes.

Buscando mapear práticas de diversidade e inclusão no meio corporativo, além de identificar desafios e propor melhorias, uma pesquisa do Ceert (Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades) revela que mulheres brancas têm mais êxito em cargos de alto escalão do que outros grupos sub-representados, como pessoas negras, LGBTQIA+ e pessoas com deficiência. Cida Bento, coordenadora do Ceert e mulher negra, destacou em entrevista recente: “Quem mais se beneficiou do discurso de diversidade nas empresas durante muito tempo foram as mulheres brancas, porque o homem branco continua sendo o grande chefe nas grandes organizações.”
Fica evidente que os grupos sub-representados enfrentam desafios em ambos os cenários — com ou sem iniciativas de diversidade. Apesar dos esforços para incluir grupos historicamente marginalizados — como mulheres e homens negros, pessoas LGBTQIA+ e indígenas —, muitas empresas se limitam a divulgar estatísticas de contratação ou lançar campanhas pontuais. Essas ações, ainda que abram caminhos de oportunidades, muitas vezes são tratadas como soluções definitivas, o que leva ao chamado “diversity washing” ou diversidade de fachada. A diversidade, no entanto, não deve ser encarada como destino final, mas como ponto de partida para transformações reais e estruturais.
Quer se livrar da diversidade, ok? Mas saiba que o impacto será nos pilares que fazem uma organização ou um país menos desenvolvido. A verdadeira transformação acontece quando entendemos que diversidade não é um favor ou uma concessão, mas sim um imperativo moral e estratégico. Sociedades que abraçam a pluralidade de maneira autêntica tornam-se mais inovadoras, resilientes e justas. O caminho é longo, mas a mudança só ocorre quando deixamos de tratar a diversidade como um fim e passamos a enxergá-la como o início de uma nova forma de construir o mundo.
Marcelle Chagas é pesquisadora Tech&Society da Mozilla Foundation e Coordenadora da Rede de Jornalistas Pretos pela Diversidade na Comunicação. É
Mestre em Comunicação pela Universidade Federal Fluminense.