Ao entrar na União Europeia, a Croácia dá adeus aos seus navios
Aprontando-se para integrar a União Europeia, em 1º de julho, Zagreb lançou um vasto programa de privatizações que atinge em particular uma de suas indústrias mais antigas: a construção navalJean-Arnault Dérens
Por que a Europa quer impedir a Croácia de continuar a construir seus navios?” O engenheiro Duje Kovačić, funcionário há quarenta anos do estaleiro de Split, rumina a questão sem chegar a uma resposta. A integração europeia da Croácia pode, de fato, afetar a construção naval, uma das mais antigas tradições industriais do país. Com sua longa face marítima, a Croácia é um país de marinheiros, pescadores e… estaleiros que devem ser totalmente privatizados antes da entrada oficial da nação na União Europeia, que acontece no dia 1º de julho.
A Croácia contava com cinco estaleiros, cujas histórias remontam ao século XIX. De norte a sul, eram eles: Uljanik, em Pula; 3-Mai, em Rijeka; e os das cidades de Kraljevica, Trogir e Split. Essas instalações formavam a coluna vertebral da economia das regiões litorâneas. As embarcações construídas na Iugoslávia navegavam em todos os mares do mundo, e os estaleiros da região da Dalmácia rivalizaram durante décadas com os de Trieste ou Saint-Nazaire. A construção naval ocupava igualmente um lugar central no imaginário político da época socialista: o próprio Josip Broz Tito foi mecânico em Kraljevica nos anos 1920. Em Split, a história dos estaleiros se confunde com a da própria cidade. O famoso time de futebol de Hajduk era formado por trabalhadores navais, que decidiram juntar-seà resistência dos partidários comunistas a partir da anexação da Dalmácia à Itália fascista, em 1942.1
Estaleiros vendidos ou falidos
A suspensão de qualquer subsídio público ao setor está estipulada no capítulo 8 (“Políticas de concorrência”) do tratado de adesão da Croácia, e a Comissão seguiu com a aplicação das “reestruturações”. Mas a privatização se revelou muito mais difícil do que o previsto, seja pelas dívidas, subestimadas, ou pelos potenciais compradores, desencorajados pela obrigação de assumir 40% dos custos de reestruturação.2 “Em todo o mundo, o poder público auxilia a construção naval. Na Itália, os estaleiros de Fincantieri são inteiramente controlados pelo setor público; na França, o Estado permanece acionista minoritário dos principais estaleiros, como a STX France. Mesmo na Coreia do Sul, líder mundial do setor, o Estado subvenciona a construção de navios. Aquilo que é aceito em outros países agora se torna proibido para a Croácia, em nome da integração europeia”, entoa Zvonko Šegvić, presidente do Sindicato dos Estaleiros Navais de Split.
Enfim, o Estado croata liquida suas empresas. E, na falta de comprador para Kraljevica, decretou-se a falência dos estaleiros. Apenas a privatização dos estaleiros de Trogir se deu com relativo sucesso. Um cais será transformado em marina e centro de reparação de iates, enquanto a produção de navios será mantida. Essa pequena instalação foi comprada por um investidor croata, Danko Končar. O Estado participará de sua reestruturação com 60 milhões de euros em cinco anos. O acordo assinado em maio/abril prevê a diminuição do corpo de funcionários de 1.200 para novecentas pessoas. Otimista, o engenheiro Slavko Bilota sublinha que as aposentadorias obrigarão a empresa a contratar novos funcionários.
A situação dos estaleiros de Split se revelou complicada após sua aquisição pelo grupo DIV, por uma soma simbólica – 500 mil kunas (R$ 200 mil). Propriedade do empresário Tomislav Debeljak, a empresa não comunicou nenhum planejamento sério sobre o relançamento das atividades. Por outro lado, confirmou no início de junho que a quase totalidade dos 3.150 funcionários será demitida. Cerca de 1,5 mil funcionários serão recontratados por contratos temporários, segundo critérios ainda incertos. O DIV também promete recrutar quinhentos ex-funcionários, mas também em regime temporário. A vila operária de Split não se deixa vencer facilmente, mas o novo dono indiciou dirigentes sindicais por “violências”, e eles foram proibidos de ingressar no local.
Apostar tudo no turismo?
A identidade de Istrie é igualmente indissociável dos estaleiros de Uljanik, em Pula. Nessa pequena região de 200 mil habitantes, a construção naval representaria ainda cerca de 30 mil postos de trabalho diretos ou indiretos. Aqui, a produção não parou e o caderno de encomendas permanece cheio, apesar do fim dos subsídios públicos em 2006. Uljanik chegou até a se candidatar à compra dos estaleiros 3-Mai, em Rijeka. Mas o futuro industrial de um grupo como esse permanece incerto. Mais que a ferramenta de produção industrial, é sua localização que suscita controvérsias: a pequena ilha de Uljanik está no coração da Baía de Pula, em frente ao calçadão que contorna o mar e as arenas romanas da cidade. Por enquanto, o futuro turístico de Pula reside em Muzil, uma antiga base militar criada em 1859 pela frota austro-húngara, utilizada pelos marines iugoslavos, depois pelos croatas e desativada desde 2007. No local, os habitantes da vila passeiam, tomam banho de mar, pescam, fazem piqueniques ou organizam festivais alternativos. Um projeto prevê sua privatização e transformação em complexo turístico de alto luxo, com um hotel de 2.500 leitos, campo de golfe, marina etc.
A morte programada dos estaleiros navais levará a cabo o processo de desindustrialização do país. A Croácia pode apostar tudo no turismo? As regiões litorâneas são as mais afetadas pelo desemprego, que atinge oficialmente 22% da população ativa e um terço da população com menos de 25 anos. Muitos jovens precisam se contentar com pequenos bicos, que em geral não pagam mais de 20 euros ao mês. Para Šegvić, a Croácia entra na União Europeia “sem nenhuma preparação real”: “Nossa economia foi devastada e não temos nada a oferecer além de serviços aos países da rica Europa do Norte. Na União Europeia, a Croácia será um país de segundo escalão, como todos os Estados da Europa do Sul”.
Jean-Arnault Dérens é redator-chefe do Courrier des Balkans.