Ao tribunal do “Processo Jeanson”
Os franceses que ajudam a FLN não são levados a fazê-lo por um sentimento de generosidade com relação a um povo oprimido, nem o fazem a serviço de uma causa estrangeira — trabalham para si próprios, pela sua liberdade e pelo seu futuroJean-Paul Sartre
“Encontrando-me impossibilitado de comparecer à audiência do tribunal militar, o que lamento profundamente, faço questão de explicar de forma mais minuciosa o objetivo do telegrama por mim enviado. Na realidade, é pouco reafirmar minha “solidariedade total” com os acusados: e julgo necessário dizer por quê.
Penso jamais ter encontrado Helène Cuenat, embora conheça bastante bem, por meio de Francis Jeanson, as condições em que operava a “rede de apoio” que é objeto do atual processo. Gostaria de lembrar que Jeanson foi durante muito tempo um de meus colaboradores, e embora nem sempre estivéssemos de acordo — o que é normal — a questão argelina nos juntou. Dia após dia, acompanhei seus esforços, que também eram os da esquerda francesa, para encontrar para a questão uma solução por meios legais. E foi somente devido ao fracasso desses esforços, diante da evidente impotência dessa esquerda, que ele resolveu entrar na clandestinidade, para daí levar seu apoio concreto ao povo argelino em luta pela sua independência.
“Argelinos, a Argélia é vossa”
Mas convém, aqui, esclarecer um equívoco: a solidariedade levada por ele aos combatentes argelinos não lhe era apenas ditada por princípios nobres ou pela vontade geral de lutar contra a opressão onde quer que ela se manifeste; procedia também de uma análise política da situação da própria França. A independência da Argélia foi conquistada. Ela poderá ocorrer num ano, ou em cinco anos, com ou contra a vontade da França, através de um plebiscito ou da internacionalização do conflito, ignoro de que forma, mas ela já é um fato e o próprio general De Gaulle, levado ao poder pelos defensores da Argélia francesa, vê-se hoje obrigado a reconhecer: “Argelinos, a Argélia é vossa.”
(…) No meu entender, é importante deixar claros dois pontos — vocês terão de me desculpar a maneira pela qual os formulo, simultaneamente, mas num depoimento deste tipo é difícil aprofundar as coisas.
Pela liberdade e pelo futuro
Por um lado, os franceses que ajudam a FLN não são levados a fazê-lo por um sentimento de generosidade com relação a um povo oprimido nem o fazem a serviço de uma causa estrangeira — trabalham para si próprios, pela sua liberdade e pelo seu futuro. Trabalham pela implantação de uma verdadeira democracia na França. Por outro lado, eles não estão isolados, ganham um apoio cada vez maior, uma simpatia ativa ou passiva que não pára de crescer. Eles foram a vanguarda de um movimento que talvez tenha despertado a esquerda, atolada numa miserável prudência. Seria bom que ela se preparasse para o inevitável enfrentamento com o exército, que vem sendo adiado desde maio de 1958.
(…) Se Jeanson me tivesse acaso pedido para transportar uma mala [1] ou abrigar militantes argelinos, e se eu o pudesse fazer sem que isso os pusesse em risco, eu o teria feito sem hesitação.
O fim da mistificação
Entendo que estas coisas devem ser ditas: pois chegou a hora em que cada um deve assumir as suas responsabilidades. Os mais engajados na ação política ainda hesitam — por não se sabe que respeito pela legalidade formal — em ir além de certos limites. Por sua vez são os jovens, apoiados pelos intelectuais, que, como na Coréia, na Turquia ou no Japão, começam a destruir a mistificação de que todos somos vítimas. Daí a excepcional importância deste processo. Pela primeira vez, e apesar de todos os obstáculos, de todos os preconceitos, de todas as prudências, argelinos e franceses, unidos fraternalmente por um combate comum, se encontram jun