“Ariano Suassuna: no teatro da vida”
Anderson da Silva Almeida fala sobre o processo de pesquisa, os temas centrais do livro e o impacto de Ariano Suassuna na cultura brasileira
Ariano Suassuna foi um dos nomes mais importantes da cultura brasileira, responsável por um legado que atravessa gerações. Seu envolvimento com o Movimento Armorial, sua atuação política e a riqueza de sua dramaturgia fazem dele um personagem fascinante e repleto de nuances. O livro Ariano Suassuna: no teatro da vida, organizado pelo historiador Anderson da Silva Almeida, reúne pesquisadores de diversas áreas para explorar as múltiplas facetas do autor de O Auto da Compadecida e sua influência no cenário cultural brasileiro.

Anderson da Silva Almeida, doutor e mestre em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF), foi finalista do Prêmio Jabuti de Literatura em 2018 e venceu o Prêmio Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional, em 2010. Com uma trajetória consolidada na pesquisa sobre militares, ditadura e política, ele se debruça agora sobre Suassuna, buscando compreender não apenas o autor e sua obra, mas também o contexto histórico e político em que ele esteve inserido.
Publicada pela Editora CRV, a obra é estruturada em duas partes: a primeira apresenta um perfil biográfico e político de Suassuna, enquanto a segunda aprofunda suas influências artísticas e literárias. Ao longo das 354 páginas, os artigos abordam temas como sua relação com a Tropicália e o Manguebeat, o teatro brasileiro das décadas de 1940 e 1950, além de aspectos fundamentais de sua dramaturgia e literatura.

Convidamos Anderson da Silva Almeida para uma conversa sobre o processo de pesquisa, os temas centrais do livro e o impacto de Ariano Suassuna na cultura brasileira.
Como surgiu a ideia de fazer uma coletânea sobre Ariano Suassuna?
O ano de 2024 foi marcado pelos 10 anos da morte de Ariano e 60 anos do Golpe de 1964. Nesse sentido, a obra foi pensada justamente para ser lançada agora, para nossa sorte, também o lançamento de Auto da Compadecida 2 aconteceu no final do ano passado, o que contribuiu para despertar mais interesse à nossa coletânea.
E quais os principais temas abordados neste trabalho?
O livro conta com 12 autores e autoras que já tinham alguma ligação com o personagem Ariano Suassuna, seja por meio de pesquisas maduras ou de alguma experiência significativa. A maioria dos capítulos foi escrita por historiadores e historiadoras de formação, mas também por sociólogos e pessoas da literatura. Os temas centrais são: os conflitos políticos nos anos 1930; o teatro brasileiro dos anos 1940-1950; a atuação de Ariano durante a ditadura; os conflitos com a Tropicália e o Manguebeat; sua obra literária e sua dramaturgia (Movimento Armorial, Auto da Compadecida, cordel, xilogravura).
Ariano esteve presente nos debates políticos dos anos 1960-1970, principalmente em Recife, e já era muito conhecido pelo prêmio conquistado pelo Auto da Compadecida, em 1956. Há polêmicas envolvendo sua atuação na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e sua relação com as esquerdas e os militares. Também foi membro do Conselho Federal de Cultura durante o período militar, ao lado de Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre e João Guimarães Rosa, por exemplo.
Como Ariano Suassuna: no teatro da vida se diferencia de outras obras acadêmicas feitas sobre o autor?
Meu objetivo, como organizador, foi manter rigor na apuração dos relatos e um ritmo que envolvesse o leitor. O livro está dividido em duas partes: a primeira, com um perfil biográfico e político, dialoga com a história social; a segunda parte traz análises sobre influências na obra de Ariano e sua dramaturgia. Nosso grande desejo é sair da bolha acadêmica e alcançar um público mais amplo.
O livro apresenta um olhar crítico sobre Suassuna. Quais foram os aspectos mais desafiadores ao lidar com as contradições e transformações do autor ao longo da vida?
A trajetória política e intelectual de Ariano Suassuna indica, entre outras coisas, as metamorfoses que ocorreram no período da chamada redemocratização do Brasil (1979-1988). Também contribui para um melhor entendimento sobre a influência que sua biografia teve em sua produção literária e dramatúrgica, levantando questões sobre apoio e resistência à ditadura e indicando a possibilidade de mudanças de rumo e tomadas de consciência ao longo da vida. O livro aborda angústias, dúvidas, erros e acertos, contribuindo para uma análise sobre ascensões, quedas e recomeços.
O que esse livro representa na sua trajetória como escritor e pesquisador?
O livro representa a realização de um desejo de conhecer mais profundamente a atuação de um grande intelectual durante a ditadura e o Movimento Armorial, que teve grande impacto no Nordeste. Durante a organização da obra, impressionei-me com os conflitos sangrentos que ocorreram na Paraíba e em Pernambuco, no ano de 1930, resultando nos assassinatos de João Pessoa, João Suassuna, Augusto Caldas e João Dantas, além das mortes de Anayde Beiriz e do fotógrafo Louis Piereck. Outro impacto foi conhecer melhor um personagem antagônico a Ariano, Jomard Muniz de Britto, defensor da Tropicália e do cinema novo de Glauber Rocha, pouco presente nas biografias sobre Ariano. A riqueza dos contrastes e a necessidade de aceitar e conviver com as diferenças foram grandes aprendizados para mim.
Você já trabalhou com outras biografias, como no livro Almirante Vermelho, finalista do Prêmio Jabuti. Como essa experiência influenciou sua abordagem na organização de “Ariano Suassuna: no teatro da vida”?
A experiência com trabalhos biográficos, como no livro sobre Cândido da Costa Aragão (Almirante Vermelho, finalista do Prêmio Jabuti de 2018, Eduff), ajudou-me a estruturar melhor os capítulos e evitar uma “hagiografia” de Ariano. O objetivo era apresentar um personagem humano, com suas ambiguidades e complexidades.
Você pretende continuar a pesquisa em outros trabalhos?
Pretendo descansar um pouco e, futuramente, aprofundar os estudos sobre intelectuais, artistas e censura moral na ditadura. Quem sabe, talvez uma biografia “clássica” de Ariano Suassuna, mas, para isso, dependeria do interesse de uma grande editora.
Quero agradecer a vocês pela oportunidade desta entrevista e aos doze autores e autoras que compõem a coletânea: Maria do Rosário, Geice P. Nunes, Clara S. Fernandes, Tatiane Silva, Lucas Arruda, Geovanni Cabral, Marcelo Tavares, Moisés Neto, Fábio Brito, Iago Luz, Dimas Veras e Eduardo Dimitrov. Sem elas e sem eles, esse lançamento não seria possível.
Veriana Ribeiro é uma jornalista e escritora acreana, formada em Jornalismo pela Universidade Federal do Acre (UFAC) e mestre em Meios e Processos Audiovisuais pela Universidade de São Paulo (USP). Trabalha há 15 anos na área de comunicação, tendo atuado como assessora de imprensa, repórter e redatora. Publicou o livro Coletânea dos Amores Partidos (autopublicação, 2021) e participou da coletânea Antes que eu me esqueça \ 50 autoras lésbicas e bissexuais hoje (Quintal Edições, 2021), além de escrever projetos literários independentes como zines e newsletters.