Em meio ao amplo processo de mobilizações que vive o Brasil, muito se exalta o papel da internet e das redes sociais, sobretudo Facebook e Twitter, de possibilitar uma comunicação horizontal, contrapor informações da “grande mídia” e conectar iniciativas. Contudo, como qualquer outra mídia, é preciso reconhecer que tais plataformas apresentam vantagens e desvantagens. À medida que as mobilizações avançam para a organização de assembleias populares, deve-se avaliar criticamente a escolha da plataforma de comunicação adotada para auxiliar nesses processos.
Apesar de ainda recente, o que se vê é um momento político como raras vezes já houve na história do Brasil, com uma intensidade de debates, discussões e ações diretas. Todavia, o processo segue em disputa entre setores democráticos e conservadores, um debate que atravessa as ruas, a internet e as mídias de massa televisivas e impressas. A despeito das particularidades locais, tal processo se apresenta ao mesmo tempo em consonância com outros ocorridos em outras partes do mundo, e podemos considerar alguns aprendizados em relação ao uso da internet experimentados por movimentos como Occupy e 15M em 2011.
Podem-se distinguir dois momentos na apropriação do uso das plataformas de comunicação digitais por esses movimentos. Num primeiro instante, o das mobilizações em massa, usaram-se intensivamente as redes sociais. Num segundo momento, de organização de assembleias e grupos de trabalho, percebeu-se a necessidade da criação de plataformas próprias de comunicação, e uma diversidade de plataformas em código aberto foi desenvolvida.
No Brasil, estamos transitando para essa segunda etapa, a da organização, e devem-se tomar algumas lições tiradas de experiências passadas sobre o uso de plataformas corporativas. Essas lições dizem respeito aos aspectos políticos e funcionais, inseparáveis na arquitetura informacional. Primeiro, à medida que o movimento cresce e produz informações, ele conforma uma memória coletiva que é patrimônio de todos e por isso deve ser livre. Quando se coloca essa memória em plataformas corporativas, esse conteúdo passa a ser propriedade dessas empresas e perde-se o controle sobre a própria informação. Facebook e Twitter têm políticas de remover conteúdos quando solicitados por governos, isto é, rompem com os princípios da neutralidade da rede.
No que se refere à funcionalidade, percebe-se que as plataformas corporativas têm como estratégia principal entreter seus usuários com conteúdos novos todo o tempo, não diferenciando o que seja mais ou menos relevante, o que não funciona bem para finalidades político-ativistas não tão imediatas. Quanto mais membros ativos tem um grupo do Facebook, mais rápido as informações se perdem em meio a constantes atualizações. Tampouco se pode separar o conteúdo postado por assuntos, sendo todos dispostos sequencialmente numa coluna, do mais recente para o mais antigo.
Por um lado, é imprescindível a utilização de Facebook e Twitter para efeito de difusão de informações, haja vista a quantidade de usuários que estes possuem. São 73 milhões de usuários brasileiros no Facebook e 32 milhões no Twitter, segundo dados de março de 2013. Por outro lado, um movimento que se constrói de forma auto-organizada e autônoma deve ser protagonista de sua própria arquitetura informacional, e isso será conseguido com a criação de plataformas de código aberto, desenhadas para facilitar o trabalho colaborativo, e não para acumular amigos
Luis Eduardo Tavares é Sociólogo e doutorando do programa de pós-graduação em Ciências Sociais e pesquisador no Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política na PUC-SP.