Bolsonarismo sem confiança do investidor estrangeiro
A ausência de estrangeiros no leilão da cessão onerosa e seus resultados constrangedores é o sinal mais visível da desconfiança: não fosse a Petrobrás, o vexame de Paulo Guedes seria ainda maior. O dilema é simples: as bravatas que empolgam os acólitos do bolsonarismo e as milícias digitais não enchem o bolso do Mercado.
A eleição de Bolsonaro, fiada na agenda ultraliberal de Paulo Guedes, inspirou ânimo e expectativas inéditas no Mercado, mas, passados 300 dias da implacável oposição do bolsonarismo a si mesmo, a mística governista dá sinais de esgotamento. O investidor não embarcará em aventuras por mera profissão de fé na ideologia do ocupante do Planalto: sua religião seguirá tendo por crença única a perseguição do lucro e de um ambiente de previsibilidade e segurança.
Aqui é preciso fazer um corte: ainda que a Bolsa alcance recordes históricos, há uma contraditória fuga de capital estrangeiro que é a maior das últimas duas décadas, de modo que os aumentos especulativos reflitam muito mais a ação do investidor doméstico, ainda embebedado pelas promessas vãs do bolsonarismo. Mesmo este não tardará a acordar com uma baita “ressaca”.
A ausência de estrangeiros no leilão da cessão onerosa e seus resultados constrangedores é o sinal mais visível da desconfiança: não fosse a Petrobrás, o vexame de Paulo Guedes seria ainda maior. O dilema é simples: as bravatas que empolgam os acólitos do bolsonarismo e as milícias digitais não enchem o bolso do Mercado.
Incerteza
Bolsonaro desperdiçou a confiança que detinha na largada a troco de preservar seus ataques às instituições, elevando a incerteza em uma América Latina novamente embolada por sucessivas crises políticas. Sem respeito às instituições, a deterioração de um ambiente negocial é inarredável, afinal de contas o investidor não empenhará seu capital sem se cercar de garantias, num ambiente global cada vez mais minado.
As reformas do Estado enviadas por Paulo Guedes, ainda que pudessem atenuar esse influxo, não são muito mais que propostas: é difícil imaginar que o Senado, onde iniciarão sua tramitação, revelará a mesma façanha de Rodrigo Maia na Previdência, dadas as suas dificuldades de governança relativas. Não é crível supor um Congresso historicamente satelital permanecerá exercendo um protagonismo de governar que não lhe cabe: os partidos não seguirão aprovando medidas impopulares sem os bons ventos do crescimento econômico ou os afagos do toma-lá-dá-cá, participando apenas dos ônus, enquanto Bolsonaro lava as mãos pro seu dever de liderar o país e se faz de “bonzinho”.
Previdência
A Previdência era um consenso das elites políticas e foi assimilada como um preço “módico” pela maioria do povo: as demais reformas estão longe disso. Os congressistas, com as eleições se aproximando, acaso se siga a convalescença econômica, não tardarão a dar sinais de desespero e rebelião.
O Bolsonarismo tende a uma invernal “macrização” similar à ocorrida na Argentina: boa notícia pra Oposição, caso não desperdice mais essa chance no seu “abraço dos afogados”, insistindo na ausência de autocrítica e se desgarrando da tarefa de apresentar alternativas consistentes ao país. A única notícia positiva nessa onda de frustração que se avizinha é o recado de que, sem respeito às regras do Estado Democrático de Direito, não haverá redenção para este Governo: o liberalismo de araque, que prega liberdade de mercado, mas persegue implacavelmente a Imprensa e ataca outras liberdades individuais, não sobreviverá às suas contradições.
Randolfe Rodrigues é senador da República (Rede/AP). É professor, graduado em história, bacharel em Direito e mestre em políticas públicas.