Como a França aprovou o PACS
Sylvie Braibant
Nas colunas de avisos sociais dos jornais franceses, entre os comunicados de nascimento, casamento ou morte, aparece uma nova rubrica, a do PACS (Pacto Civil de Solidariedade). Esta realidade banal faria quase esquecer a violência, a recusa, para não dizer o ódio, que acompanhou a difícil e lenta gestação deste adendo ao código da família. Dois livros retomam esse debate, um dos mais virulentos mas também um dos mais fecundos da 5ª República. O primeiro é o relato pessoal feito por Roselyne Bachelot, deputada do RPR [1], sobre o que foi seu combate muitas vezes solitário. O outro — nascido do colóquio “Pensando mais além do PACS” —, propõe uma avaliação da reflexão sobre a família francesa como reveladora de contradições mais profundas.
Mas os dois apontam nesse debate principalmente as falhas, às vezes até os impasses, no exercício da democracia. Começam pelo mesmo preâmbulo: a paridade (entre homens e mulheres), depois o PACS, desencadeou entre os políticos e os cidadãos reações passionais que não correspondem à contraposição tradicional esquerda / direita. À oposição esperada dos conservadores, associaram-se surpreendentes vozes de esquerda, a maioria delas em nome da natureza ou da ciência.
O sociólogo Eric Fassin, os juristas Marcela Iacub e Daniel Borrillo propõem uma explicação para este protesto geral: a ordem simbólica, “estuário teórico para onde confluem Levi-Strauss, Lacan e o direito positivo da família”, bem como dois mil anos de cristianismo, seriam abaladas pela divulgação da diferença sexual — diferença estabelecida por essência como sendo da competência do privado — e por territórios ainda inexplorados de parentesco e de filiação, tudo isso sobre um fundo de misoginia e de homofobia, às vezes mascaradas, porém irredutíveis [2]. “A ordem dos sexos, a ordem das sexualidades, a ordem da procriação e a ordem da filiação perdem um pouco de sua evidência.”
A quem cabe fazer leis?
Frente a essas fissuras, o que se expressou nessas ocasiões foi sem dúvida, em primeiro lugar, o medo, de tal maneira seus temas resvalavam por fronteiras delicadas, as das interseções entre o corpo e o pensamento, entre o privado e o público. Mas cada um sabe que a inquietação pode ser fértil: “Longe de nos condenar a suportar normas que nos sujeitassem, estes questionamentos da ordem simbólica nos encorajam a usar da liberdade política, a debatê-las para ratificá-las, às vezes, mas também, mais freqüentemente, para reformulá-las, até mesmo substituí-las.”
Nas discussões sobre o PACS, ou sobre a paridade, os cientistas — antropólogos, sociólogos, filósofos ou psicanalistas — ocuparam o espaço. Esta irrupção da ciência no campo político coloca mais uma vez o problema de suas relações com a democracia. Fazer as leis cabe aos “especialistas” ou aos políticos eleitos? Um dos interesses da obra coletiva dirigida por Eric Fassin é oferecer respostas diferentes de cientistas — antropólogos, psicanalistas, sociólogos, demógrafos ou juristas — a esta questão essencial. Por outro lado, Roselyne Bachelot, deputada gaullista, viu-se obrigada a se interrogar, por ocasião da discussão do PACS, sobre um outro aspecto da democracia representativa, o da definição do mandato eletivo, se imperativo ou não. Muitos de seus eleitores de direita criticaram de maneira recorrente os compromissos que fazia em desacordo com os valores pelos quais eles a tinham elegido.
Rica contribuição à história da família, graças ao reencontro de várias disciplinas, o livro coletivo teria ganho ao ser completado por uma boa e velha análise marxista. Uma abordagem contextualizante que explicaria talvez porque o debate opôs a consagração da família “burguesa”, exigida pelos adversários do PACS, e a consagração do casal “não menos burguês” defendida por seus partidários.
Roselyne Bachelot, Le PACS entre haine et amour , Plon, Paris, 1999.
Daniel Borrilo, Eric Fassin e Marcela Iacub (orgs.), Au-delà du PACS. L’expertise familiale à l̵