Desemprego, o mito das vagas não ocupadas
Se desse ouvidos aos discursos sobre os postos de trabalho não ocupados, a França estaria sentada sobre imensas jazidas de emprego. Tais proposições alimentam uma proposta política: reforçar o controle sobre os desempregados. No entanto, as cifras colocadas em destaque não significam bem aquilo que dizem, ao contrárioHadrien Clouet
Em 19 de novembro de 2014, o novo ministro do Trabalho francês, François Rebsamen, assustou-se na rádio France Inter com a existência de “400 mil empregos não ocupados e abandonados porque não obtinham resposta”. Essas proposições fazem eco às “500 mil ofertas de emprego que não são ocupadas” evocadas por Nicolas Sarkozy em uma entrevista no Palácio do Eliseu, em 24 de outubro de 2008, acrescentando: “Alguns não querem se dispor a trabalhar”. As cifras flutuam ao sabor dos comentaristas, mas o argumento persiste: “Seiscentas mil vagas não preenchidas: os desempregados realmente querem trabalhar?”, pergunta-se o apresentador Jean-Marc Morandini.1 Em maio de 2014, o Movimento das Empresas da França (Medef) lançou uma campanha na France Télévisions baseada na mesma equação simplista. No entanto, jornalistas e políticos fermentam as cifras sem conhecer a origem e o real significado delas.
Primeiro alvo de suas campanhas: as vagas sem resposta, ou seja, as ofertas retiradas sem que tivessem conduzido a uma contratação. A origem da quantidade delas é particularmente edificante… Como o Pôle Emploi (órgão público francês de assistência ao emprego) acolhe um terço (38% em 2012) das propostas de contratação francesas, simplesmente se multiplica por três o número de vagas que não são ocupadas (126 mil em 2012). O resultado é arriscado: como o Pôle Emploi recebe as ofertas mais difíceis, não seria possível extrapolar nada com base nessa fonte.
Inúmeros anúncios fracassam sem que se possam incriminar os desempregados: salário ridículo em relação às competências exigidas, recrutador inexperiente, constituição pelo empregador de uma base ilegal de currículos inventando um cargo inexistente etc. A problemática dos empregos não ocupados mascara a questão da qualidade do trabalho, postulando a comensurabilidade de qualquer oferta. Vamos olhar um pouco mais de perto algumas ofertas que circulam no Pôle Emploi. Ali se acotovelam ao acaso propostas de “limpeza industrial, 1 hora por semana, por 9,75 euros a hora”, ou de “faxineiro(a) auxiliar, 2 horas por semana, 11 euros a hora”. Os desempregados em busca de um trabalho de tempo integral logicamente não se interessam por contratos curtos… mas estes fazem aumentar o número de empregos não ocupados. Eles são acusados de não querer trabalhar, quando na verdade desejam trabalhar mais! Muitos também caem em armadilhas de pobreza. Entre 2007 e 2011, cerca de 500 mil pessoas tiveram de renunciar a um posto de trabalho em razão de problemas de habitação e do sobrecusto da mobilidade exigida.2
Abaixo da média europeia
A existência de vagas não ocupadas indica que nem todos que procuram emprego se sentem obrigados a trabalhar em qualquer condição. Mas, quando realmente procuram trabalhos assalariados, os empregadores dispõem sempre de alavancas, que colocam em prática em caso de crise de contratação: alta salarial, melhores horários ou condições de trabalho…
Segundo alvo, raramente examinado: as vagas em aberto. Trata-se de uma fotografia instantânea dos postos criados recentemente, ainda vazios ou em breve preenchidos, que o empregador deseja ocupar em determinado prazo. Por definição, uma vaga deve ser aberta antes de ser ocupada. Com frequência, esse indicador é visto de forma inversa. Desemprego e vagas em aberto evoluem em sentido contrário. Quanto mais o número de vagas em aberto se eleva, mais se encontram vagas disponíveis ou em vias de criação.
A França tem um número de vagas em aberto bem abaixo da média europeia; somente a Itália, a Polônia e a Letônia exibem uma taxa menor.3 Um aumento dos postos em aberto constituiria uma boa notícia para os desempregados, mas também para os assalariados, porque a diminuição do desemprego lhes permitiria encontrar uma correlação de força melhor para negociar reajustes salariais.
98% das ofertas encontram interessados
Admitamos usar o dado do Medef, com 400 mil vagas em aberto. Para ter uma fotografia completa, é preciso aproximar essa cifra ao mesmo tempo das vagas preenchidas. Em 2012, por exemplo, os empregadores depositaram nas Unions de Recouvrement des Cotisations de Sécurité Sociale et d’Allocations Familiales (Urssaf) 21 milhões de declarações prévias de contratação (3 milhões de contratos de duração indeterminada e 18 milhões com duração determinada). Isso significa que 98% das propostas de contratação emitidas encontram interessados.
Por outro lado, as mesmas ofertas podem continuar em aberto por vários anos, o que reduz seu peso em relação aos 21 milhões de contratações anuais. Acrescentemos também que isso supõe que não existem publicações em duplicidade. No entanto, o mesmo anúncio pode aparecer no Pôle Emploi, numa agência de temporários, na Câmara de Profissões… Isso representa estatisticamente três vagas em aberto; mas, de fato, apenas uma será criada, sem que nenhum desempregado tenha jamais recusado as duas outras!
Por trás dos discursos apaziguadores e fora de qualquer proporção sobre as dificuldades de recrutamento, a questão fundamental da política de emprego permanece o crescimento do número de vagas, e não sua ocupação integral. Classificar as campanhas sobre as vagas em aberto ou não ocupadas no espaço dos discursos enganadores e inofensivos seria um erro. Elas geram consequências financeiras para os interessados. Na realidade, associar os beneficiários de direitos sociais a preguiçosos ou a fraudadores em potencial conduz uma parte significativa deles a não fazer valer seus direitos. Na França, o montante dos direitos não usufruídos excede largamente a fraude social;4 a fraude no Pôle Emploi constitui apenas 0,84% do conjunto de fraudes.5 A estigmatização dos desempregados abre caminho para a queda dos pedidos de benefícios e para uma redução destes: dupla economia feita em detrimento de uma população que vota cada vez menos.
*Hadrien Clouet é doutorando no Centre de Sociologie des Organisations (Centre National de la Recherche Scientifique – Sciences Po).