Front National passa da demonização à fascinação
Procurando apresentar-se como um partido “fora do sistema”, o Front National reclama do desdém dos jornalistas. Porém, seus representantes, como a maioria dos políticos, usam a mídia amplamente.Eric Dupin
Como está distante o tempo em que os jornalistas hesitavam em dar a palavra ao Front National (FN)! Sua presidente, Marine Le Pen, multiplica hoje em dia as apresentações radiofônicas e televisivas. Seu segundo em comando, Florian Philippot, é uma figura constante nas entrevistas matutinas, a ponto de ter aceitado corajosamente a da rádio Europe 1 no dia 1o de janeiro. Ele falou quatro vezes nos programas matutinos em dezembro de 2013. Seus camaradas brincam a respeito de sua propensão em passar de um palco de canal de informações para outro. “A televisão enlouquece aqueles que não aparecem nela”, responde Philippot.1
Responsável pela estratégia e pela comunicação, ele se felicita pela presença crescente de seu partido no campo midiático, ao mesmo tempo que a considera ainda insuficiente tendo em vista seu peso eleitoral. “Segundo as estatísticas do CSA [Conselho Superior do Audiovisual], desde as últimas eleições presidenciais nós nos beneficiamos de cerca de 5% do tempo de transmissão”, reclama. Um exame dessas estatísticas complexas mostra que ele não está errado.2 Na rádio, o FN aparece levemente abaixo do nível do Europe Écologie – Les Verts (EELV) (ver boxe). Seu tempo de intervenção é bem melhor nos canais exclusivos de notícias; mas ele se reduz à porção devida nos jornais e programas da televisão aberta. Quantitativamente, o partido de extrema direita continua sendo tratado como os “pequenos partidos”, quer dizer, bem atrás da União por um Movimento Popular (UMP) e do Partido Socialista (PS).
Outra medida confirma essa apreciação. O Lab da Europe 1 publica a cada mês uma lista dos convidados políticos dos programas matutinos do rádio e da televisão.3 Em dezembro de 2013, as personalidades do FN totalizavam oito passagens, ou seja, tanto quanto o EELV, infinitamente mais que a Frente de Esquerda (zero), mas muito menos do que o PS (66) ou a UMP (37). Assim, o partido comemora ter conseguido “impor diversas faces”: Marine Le Pen e Philippot, mas também a deputada Marion Maréchal-Le Pen e ainda seu vice-presidente, Louis Aliot.
Falta de jeito dos entrevistadores
A presença reforçada na cena midiática de um FN cujo discurso evoluiu levanta um problema estratégico aos jornalistas. Convém a partir de agora interrogar um dirigente de extrema direita como se fosse qualquer outro dirigente político? Nos fatos, esse velho debate é tratado no sentido de uma normalização. “Eu não tenho nada a reclamar sobre o tom das entrevistas”, declara Philippot, que domina perfeitamente o jogo midiático. “Eu sei antes do fim do programa qual vai ser o título da AFP”, orgulha-se. Jean-Michel Aphatie, o entrevistador político da RTL, não o contradiz: “Ele sabe muito bem responder às nossas perguntas de maneira a garantir uma continuação”. “As entrevistas dos dirigentes do FN não são mais tão militantes. Elas se tornaram mais jornalísticas”, estima o entrevistador, que considera essa evolução fruto de uma mudança das temáticas. Ao focar menos os assuntos sulfurosos da imigração e da falta de segurança e ao abandonar velhas bandeiras da extrema direita, como a luta contra o aborto – pelo menos de forma direta4 –, o partido teria ganhado seu tíquete de entrada em um debate público mais tranquilo.
Por que a imprensa deixou de concentrar sua atenção no duo imigração-insegurança, sobre o qual o FN, para além das variações semânticas que o fizeram trocar “preferência nacional” por “prioridade nacional”, não mudou em nada seu programa? Essa ausência de críticas se deve sem dúvida também à disseminação de seus modos de ver o mundo, principalmente graças à sua propagação em amplos setores da direita, especialmente entre os eleitos do sul. A falta de jeito dos jornalistas sobre esses temas beneficia o FN. “Por que a nacionalidade parece tão importante para você?”, perguntou Patrick Cohen, no dia 29 de outubro de 2013 na rádio France Inter, para Marine Le Pen, que pôde então lhe explicar que queria reservar certas vantagens aos titulares da nacionalidade francesa, qualquer que seja sua origem.
O FN é hoje em dia mais comumente questionado sobre o aspecto social e econômico de seu programa. Mas, ainda ali, as perguntas se mostram hesitantes. Há a técnica de fazer muito estrondo, empregada por Jean-Jacques Bourdin diante de Marion Maréchal-Le Pen, no dia 16 de dezembro de 2013 no microfone da RMC: “Ao ler o programa do FN, eu tive a impressão de estar lendo um programa comum da esquerda, o programa [do ex-presidente venezuelano Hugo] Chávez!”.5 Essa variante original de “demonização” teve como único efeito provocar riso na neta de Jean-Marie Le Pen. Aphatie se pergunta em voz alta: “Pedem-nos que analisemos o programa do FN. Mas é também uma maneira de dar crédito a ele, e não é tão fácil assim atacar suas propostas enquanto os fracassos dos partidos do governo são percebidos por todo mundo…”. Se até mesmo esse comentarista liberal declarado tem dúvidas sobre a eficiência de uma crítica econômica das teses do FN, é porque a coisa está feia.
Tudo isso diverte Philippot. “Diante de nós, temos pessoas sem estratégia, que hesitam entre criticar nossas posições em profundidade e ficar numa condenação puramente moral”, observa, falando ao mesmo tempo de seus adversários políticos e dos jornalistas. O FN lucra com a incapacidade confessa do debate público de abordar como se deveria um tema que se tornou central em seu discurso e em seu sucesso: a questão do euro. Nos raros debates sobre o assunto, o isolamento do FN − única formação além da de Nicolas Dupont-Aignan (Debout la République – República de Pé) a se pronunciar claramente pela saída do euro − acaba sendo de grande valia. “Durante um Palavras cruzadas,6 eu estava sozinho contra todos”, lembra Philippot. “Mas Yves Calvi entrou no jogo e me permitiu responder a meus contraditores.” A saída do euro “é um debate que gira em círculos”, refuta sem energia Aphatie, que se defende contra a evidência da acusação de privilegiar o que ele chama de um “círculo da razão consciente”…
Diante de um partido outrora lançado para fora da ágora democrática, os jornalistas se reduzem a tentar algumas manobras com armadilhas cada vez menos bem-sucedidas à medida que o discurso dos dirigentes do Front fica mais liso. Acontece também que a contradição dos moralistas patenteados não está bem ajustada. “Não podemos deixar que digam qualquer coisa”, reclama Jean-Pierre Elkabbach, no dia 9 de dezembro de 2013 na Europe 1, porque Marine Le Pen ousou atacar… o artigo 20 da Lei de Programação Militar, considerado assassino da liberdade por uma grande parte dos comentaristas, porque ele autoriza o acesso dos serviços de informação aos dados pessoais na internet.
No estúdio e nos palcos, os momentos de tensão se tornaram raros. Se eles reaparecem de vez em quando, isso se volta na maior parte das vezes em favor do FN. No dia 6 de junho de 2013, dia seguinte à morte do jovem militante antifascista Clément Méric sob os golpes de militantes de extrema direita, Aphatie confrontou Marine Le Pen a um testemunho garantindo que um dos agressores vestia uma camiseta do Front National. “Eu não pretendo ser acusada por você, já que você não tem nenhuma prova do que quer que seja”, exaltou-se a convidada. De fato, a Europe 1 só tinha coletado, na noite anterior, um testemunho não confirmado, e Aphatie teve de se desculpar em 11 de junho.
O último atrito que houve entre o FN e a mídia diz respeito à sua etiquetagem política. Marine Le Pen acreditou que era bom proibir os jornalistas de situarem seu partido na “extrema direita”. A proibição, repleta de ameaças judiciais, provocou grande rebuliço. A maioria dos jornalistas considerou questão de honra persistir nessa qualificação, mesmo que a análise do Front de hoje deva se ligar tanto à sua identidade histórica quanto à evolução das correntes ditas “nacionais-populistas” (ver p. 18). Mas nada garante que esse chamado à ordem semântico tenha qualquer efeito dissuasivo na fração da população tentada pelo FN, que zomba particularmente dos apelidos em uso no microcosmo político-midiático.
“Eles são obcecados por nós”, diz, sorrindo, Philippot. Incontestavelmente, a imprensa escrita trata muito do assunto. Entre os dias 14 de setembro de 2013 e 7 de janeiro de 2014, ou seja, em menos de quatro meses, o Le Monde consagrou oito manchetes ao FN, enquanto o partido não viveu, ao longo desse período, nenhuma crise particular nem congresso. Nenhuma outra formação teve direito a tal atenção. Algumas dessas “capas” tinham até mesmo um tom estranhamente valorizador: “O Front National parte para a conquista do poder” (14 set.) ou “Municipais, europeias: o FN no centro do jogo” (11 out.).
Tais exageros não são facilmente explicáveis, de tanto que se misturam a eles fantasias jornalísticas, motivações ideológicas e segundas intenções comerciais. Questionado pelo semanário Politis, Alexandre Dézé, mestre de conferências em Ciência Política na Universidade de Montpellier 1, afirmou que o FN tem “a vantagem de fazer vender jornal”.7 O jornalista Daniel Schneidermann lembra que em uma época (1996-2004) em que Edwy Plenel dirigia a redação do Le Monde, o tratamento exagerado do FN tinha uma motivação militante. Sem contar que as manchetes consagradas à família Le Pen por muito tempo deram ao Libération suas melhores vendas (fora as necrologias). No dia 12 de outubro de 2013, o jornal deu como título em letras garrafais “100% extrema direita” e sua “capa” trazia uma foto de Marine Le Pen sorridente – uma escolha iconográfica criticada pelo autor da foto, que julgou a encenação muito positiva.
Desde o surgimento eleitoral do FN, no início dos anos 1980, as mídias alternaram atitudes contraditórias. Da recusa em dar a palavra aos dirigentes de extrema direita sucedeu-se um embalo midiático. Nos dois casos, o partido se esforçou para tirar proveito do incômodo dos jornalistas, seja denunciando o ostracismo do qual era vítima, seja aproveitando ao máximo os convites oferecidos.
Uma profecia autorrealizável?
Nos últimos anos, a mídia faz alarde anunciando um futuro que é marcado pela formação frontista. Quantos comentaristas, baseados em pesquisas de opinião pouco profundas e com pouco sentido, não anunciaram a qualificação de Marine Le Pen para 2012? A revista semanal Nouvel Observateur (10 out. 2013) se distinguiu mais uma vez nesses exercícios vãos de política-ficção ao marcar um enorme “24%” sobre o rosto da presidente do FN a fim de provocar arrepios em seus velhos leitores, com uma “sondagem de dar medo” na perspectiva das eleições europeias. Uma análise rigorosa das pesquisas de opinião impede, no entanto, que se apresente tão facilmente a tese de um irresistível aumento de poder do FN.
No dia 13 de outubro de 2013, a eleição parcial de Brignoles (Var) viu o apogeu de uma histeria midiática precisamente analisada pela associação Action Critique Médias (Acrimed).8 Acontecimento raríssimo, Hervé Béroud, diretor de informação da BFM-TV, inclusive lamentou ter dado “cobertura demais” para essa modesta eleição regional.9 Esses excessos fazem pensar sem dúvida na estranheza persistente do voto no FN para uma classe midiática muito distante de seu eleitorado. “Nós fomos ao seu encontro para ouvir suas lamentações”, anunciou piedosamente o jornal televisivo das 20 horas do canal TF1 do dia 14 de outubro. Tal distância sociológica autoriza todos os clichês e atalhos pouco propícios à compreensão de um fenômeno eleitoral complexo.
Mais grave: “Há uma fascinação do mundo jornalístico pelo FN que aparece sozinho contra todos diante do esgotamento do sistema político”, analisa Aphatie. “O Front National mudou muito, a direita está mudando; e quem pode garantir que eles não vão chegar ao poder? Ninguém!” É exatamente essa linha de fuga prospectiva que explica, e para alguns justifica, essa atenção excessiva. Alguns falarão até mesmo de profecia autorrealizável. Antecipando uma futura participação do FN no poder, muitos jornalistas se mostram mais compreensivos em relação a ele. Os dirigentes desse partido não escondem que essa busca por respeitabilidade é central em sua estratégia.
Tão deformadoras e desmoralizadoras quanto possam ser, as mídias não fazem a história. Arnaud Mercier, professor de Comunicação Política da Universidade de Lorraine, lembra que Jean-Marie Le Pen foi qualificado para o segundo turno da eleição presidencial, em 21 de abril de 2002, mesmo tendo sido mais ignorado do que nunca ao longo do período anterior. No entanto, tínhamos assistido a uma avalanche de assuntos sobre a “insegurança”. Hoje, é com certeza a encenação angustiante e tendenciosa – da caça aos romenos à obsessiva denúncia do sistema tributário – à qual cede o essencial do sistema midiático que contribui para “jogar o jogo do Front National”.
Eric Dupin é jornalista.