FUP e movimentos sociais celebram 70 anos da Petrobras
A Petrobras completa 70 anos no próximo dia 3 de outubro com visão de futuro, voltando a fazer parte do projeto de desenvolvimento econômico e social do país
A Petrobras completa 70 anos no próximo dia 3 de outubro com visão de futuro, voltando a fazer parte do projeto de desenvolvimento econômico e social do país, prometendo ser uma empresa de energia, integrada, soberana, comprometida com a sociedade brasileira, com seus trabalhadores, e com a transição energética justa.
Nesse processo de resgate da atuação da maior empresa do país os desafios são enormes e começam pela reconstrução da companhia que nos últimos anos, e especialmente nos quatro anos do governo Bolsonaro, teve reduzido seu tamanho e vigor, por meio de agressiva política de privatização e do encolhimento de investimentos.
A empresa foi alvo do maior desmonte de sua história. Fatiada e vendida aos pedaços, a maior estatal brasileira só não foi totalmente privatizada por conta da resistência da classe trabalhadora, dos movimentos sociais, da mobilização da sociedade brasileira, do poder de organização e de luta da categoria petroleira representada, em grande parte, pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), a maior federação sindical petroleira do país, que reúne treze sindicatos de trabalhadores do setor.
O dia 3 de outubro, data da criação da Petrobras, tornou-se há muito tempo símbolo de luta em defesa da soberania nacional. A data já faz parte do calendário das centrais sindicais e movimentos sociais, que têm se mobilizado junto com a categoria petroleira no enfrentamento aos constantes ataques contra a empresa e, consequentemente, contra o povo brasileiro.
Este é um dia nacional de luta pela reversão das privatizações, em defesa das estatais e do serviço público, por emprego e distribuição de renda, por democracia e participação popular. É disso que se trata a soberania nacional.
Esses são os eixos do grande ato nacional de luta pela soberania que o movimento sindical petroleiro realiza no dia 03 de outubro no Rio de Janeiro, junto com as centrais sindicais, as entidades que integram a Plataforma Operária e Camponesa da Água e Energia, a Frente Brasil Popular, a Articulação de Redes, os Comitês Populares e mais de 30 outras organizações sociais e partidos políticos do campo da esquerda.
Petroleiros e petroleiras de vários estados do país estarão na capital fluminense, lado a lado com eletricitários, educadores, servidores públicos, metalúrgicos, bancários, agricultores, estudantes, lideranças políticas e sociais, unindo trabalhadoras e trabalhadores do campo e da cidade em uma manifestação histórica pela reconstrução de um Brasil soberano, democrático e com justiça social.
Bolsonaro fez de tudo para acabar com estatal. Somente no seu governo, foram vendidos 68 ativos do Sistema Petrobras, incluindo 4 refinarias (Rlam, Reman, RPCC e SIX), a BR Distribuidora, a Liquigás, a Gaspetro, a Transportadora Associada de Gás (TAG), a Nova Transportadora do Sudeste (NTS), usinas de biocombustível, usinas eólicas, termelétricas, plantas petroquímicas, sondas de perfuração, campos de petróleo em terra e em mar, inclusive no Pré-Sal.
Uma tragédia anunciada, que teve início com a operação Lava Jato, que destruiu a indústria nacional, dizimando setores estratégicos da economia, como a engenharia e a construção civil. Estudo do Dieese aponta que o Brasil perdeu R$ 172,2 bilhões em investimentos e 4,4 milhões de empregos em consequência das ilegalidades cometidas pela operação, cujo objetivo foi eminentemente político, como ficou provado pela própria justiça brasileira.
No rastro da Lava Jato, veio o golpe de 2016, o desmonte da Lei de Partilha do Pré-Sal, a prisão política de Lula e a eleição de um governo fascista apoiado por ultraliberais, que desmontaram o Estado brasileiro, atacaram políticas públicas e destruíram as principais conquistas sociais da população.
Além de fatiar o Sistema Petrobras, o governo Bolsonaro privatizou a Companhia de Docas do Espírito Santo (Codesa) e inúmeras subsidiárias da Caixa Econômica Federal, do Banco do Brasil e de outras empresas públicas, além de esvaziar o BNDES, vendendo sua carteira de ações e reduzindo seu poder de financiamento.
Segundo a Secretaria de Coordenação das Empresas Estatais (Sest), em 2016, o governo brasileiro controlava 154 estatais. Atualmente, são apenas 124 empresas, sendo 44 com controle direto da União e 80, com controle indireto, conforme divulgado pelo Panorama das Estatais. Ou seja, pelo menos 30 empresas federais foram privatizadas nos últimos seis anos.
Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese/subseção FUP), com base em números divulgados pela Petrobras, mostra que de 2013 a 2022 (9 anos), a Petrobras vendeu 96 ativos (82 no Brasil e 14 no exterior). Somente no período Bolsonaro, entre janeiro de 2019 e 2022, foram vendidos 68 ativos (71% do total), incluindo subsidiárias estratégicas, como a BR Distribuidora, refinarias, campos de petróleo, terminais, gasodutos, termelétricas, usinas eólicas, entre outros.
Luta e resistência dos trabalhadores
A resistência dos trabalhadores e dos movimentos sociais impediu a entrega por completo da Petrobras e de outras estatais estratégicas que estavam na lista para serem privatizadas, como a Pré-Sal Petróleo SA (PPSA), os Correios, a Casa da Moeda, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC), a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), a Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência (Dataprev), entre outras.
Várias bandeiras de luta da FUP em defesa do patrimônio nacional, da Petrobras e dos trabalhadores vêm sendo implementadas pelo governo Lula. Após a vitoriosa eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, a Petrobras e todas essas estatais foram retiradas do Programa Nacional de Desestatização, conforme anunciado pelo presidente, logo que tomou posse, em janeiro deste ano. Além disso, o governo Lula está questionando no Supremo Tribunal Federal a venda da Eletrobrás, que teve 60% de suas ações entregues ao setor privado, ao apagar das luzes da gestão bolsonarista.
Com Jean Paul Prates no comando da Petrobras várias mudanças e medidas já foram adotadas na empresa, muitas delas, a partir de pleitos da FUP, como o cancelamento da venda de ativos da estatal e o fim da política de Preço de Paridade de Importação (PPI), implementada por Temer em 2016 e mantida por Bolsonaro.
O PPI caiu em maio último, dando lugar a uma nova forma de cálculo, que leva em consideração os custos nacionais de produção. Tal medida fez com que os preços dos combustíveis ficassem mais equilibrados, reduzindo volatilidades, desonerando o custo dos alimentos, dos fretes.
O pesadelo do PPI acabou. O mecanismo de reajuste dos combustíveis representou uma brutal transferência de renda contra o trabalhador brasileiro. Em paralelo, garantiu lucros recordes à Petrobras, via os altos preços dos combustíveis vendidos pela estatal no mercado nacional, e gorda distribuição de dividendos a acionistas, sobretudo para acionistas minoritários estrangeiros.
Em 2022, a Petrobras pagou o montante recorde de cerca de R$ 209 bilhões em dividendos, passando a ser a segunda empresa do mundo que mais pagou dividendos a seus investidores – a maioria deles estrangeiros. No ano passado, a Petrobras registrou lucro líquido recorde de R$ 188,3 bilhões, superando em 76,6% o ganho também recorde de 2021. Este foi o maior lucro já alcançado por uma empresa brasileira listada na bolsa de valores.
Com isso, a empresa transferiu valor gerado a seus acionistas, em detrimento de uma política de investimentos de longo prazo. Ou seja, a Petrobras distribuiu mais dividendos que lucro, numa política suicida para a empresa, numa gestão nociva que visou maximização de ganhos às custas de preços altos cobrados da população. Optou ainda por reduzir investimentos e vender bens para pagar dividendos a acionistas.
Além de abolir o PPI, a nova gestão da Petrobras estuda a reabertura da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen-PR) e a conclusão das obras da Fafen Mato Grosso do Sul (Fafen-MS). Esta é mais uma das pautas defendidas com ênfase pela FUP e encampada pela empresa.
A Fafen-PR, que operava desde 1982, foi fechada em março de 2020 por Bolsonaro e, na época, era responsável pela produção de 30% do mercado brasileiro de ureia e amônia e de 65% do Agente Redutor Líquido Automotivo (ARLA 32), aditivo para veículos de grande porte que atua na redução de emissões atmosféricas. A reabertura da Fafen contribuirá imediatamente para o aumento da produção nacional de fertilizantes.
O Brasil é um dos maiores produtores de grãos do mundo e o segundo maior exportador, o que implica grande demanda de fertilizantes. A maior parte desses insumos são comprados no mercado internacional. Perdemos ativos importantes no governo anterior, agora precisamos reconstruir o que foi destruído nos últimos anos.
A transição energética justa também é plataforma da FUP, com proposta incluída no planejamento estratégico da Petrobras, e no Plano Plurianual da União (PPA). A federação dos petroleiros acompanha esse processo com atenção. A categoria luta por uma transição energética justa, em que os trabalhadores sejam prioridade, valorizados, contemplados com programas de treinamento e capacitação profissional e que as comunidades afetadas sejam ouvidas e atendidas, tudo de acordo com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).
Reconstrução do Estado brasileiro
Portanto, este ano, quando a Petrobras completa sete décadas de existência, é o momento de renovar a esperança de um país inteiro pela reconstrução do Estado brasileiro e pelo resgate da soberania nacional, que segue sob ataque.
A Petrobras, uma das maiores petrolíferas do mundo, tem papel estratégico nesse processo, retomando sua capacidade de investimento e de geração de emprego e renda. Lembrando que a estatal, no começo dos anos 2000, nos governos do PT, teve amplo crescimento de sua participação no PIB, um grande desenvolvimento tecnológico que permitiu e viabilizou a exploração e produção no pré-sal brasileiro e resultou no maior plano de investimentos da história do Brasil com média de inversões anuais de cerca de R$ 173 bilhões.
Nos governos Temer e Bolsonaro, porém, o investimento da empresa caiu cerca de três vezes esse volume médio, ficando entre R$ 49 bilhões e R$ 50 bilhões ao ano, segundo cálculos do Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis). O encolhimento da Petrobras foi acompanhado por redução brutal do efetivo de trabalhadores da empresa e instabilidades no sistema de governança da companhia. Durante o governo Bolsonaro, a Petrobras amargou três mudanças de presidente na empresa.
Conforme anunciado pelo presidente Lula, a Petrobras terá 47 projetos incluídos no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), lançado em agosto. Os investimentos da empresa no PAC 2023 somam R$ 323 bilhões. Entre eles, estão sistemas de produção no pré-sal, revitalização de campos petrolíferos convencionais, como Marlim, Albacora e Roncador, na Bacia de Campos (RJ); construção de novas plataformas e navios no Brasil, estimulando a construção naval nacional.
A nova gestão da Petrobras dá indicativos de que está no caminho certo. Para cuidar da transição energética foi criada uma diretoria específica na empresa. Um dos objetivos é ampliar as refinarias existentes com unidades de biorrefino e coprocessamento. A Petrobras quer entrar no mercado do óleo vegetal, fabricando biodiesel. Outro projeto prevê a melhoria do diesel S-10 produzido nas refinarias de Paulínia (Replan) e de São José dos Campos (Revap), ambas no estado de São Paulo, bem como na refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, e outras. Ainda na área de refino, a meta é dobrar a capacidade de processamento da Refinaria Abreu e Lima (Rnest), em Pernambuco, para 260 mil barris por dia.
A preocupação com a sustentabilidade ambiental está expressa também na criação de um fundo de descarbonização, prevista no Plano Estratégico (PE) 2023-2027 da Petrobras, e que poderá ser ampliado no novo PE 2024-2028, a ser anunciado em novembro.
A produção de derivados petroquímicos, fertilizantes e combustíveis com menor pegada de carbono ou origem inteiramente renovável também está prevista. Receberão investimentos novos negócios, como hidrogênio sustentável e captura e estocagem de carbono (CCUS), tecnologias inovadoras em ascensão no mercado.
O objetivo é atingir sustentabilidade, segurança e cuidado com pessoas e meio ambiente. A aposta de Prates é a Petrobras se tornar referência global na agenda verde.
A FUP tem intensa agenda de trabalho a cumprir na nova etapa de reconstrução da Petrobras, que inclui, de imediato, a luta pela retomada de ativos da empresa que foram vendidos a preço de liquidação, subavaliados.
Nesse sentido, a Federação e seus sindicatos têm ações na Justiça, no Ministério Público Federal, no Tribunal de Contas da União e no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) na tentativa legal e legítima de reaver ativos e empresas privatizadas na gestão anterior.
Com os ataques sofridos nos governos Temer e Bolsonaro, a Petrobras encolheu e caminhava para se tornar exclusivamente produtora e exportadora de petróleo bruto.
No campo de batalha da FUP também estão iniciativas que visam anular o Termo de Compromisso de Cessação (TCC) assinado entre Petrobras e o Cade, em 2016, no governo Temer, que previa a venda de oito refinarias da empresa, mantendo apenas as unidades do Rio de Janeiro e São Paulo, como forma de reduzir a posição dominante da estatal no setor de refino.
Do total previsto, foram vendidas quatro refinarias, resultado de acordo nebuloso, negociado e firmado praticamente às escondidas, sem o conhecimento prévio da opinião pública. Em final de 2021, foi vendida a Refinaria Landulpho Alves (Rlam) na Bahia. Em 2022, foram vendidas as refinarias Isaac Sabbá, no Amazonas (Reman), a Clara Camarão (RPCC) no Rio Grande do Norte, e a Unidade de Industrialização do Xisto (SIX), no Paraná
O governo Lula cumpriu sua promessa de campanha, de ‘abrasileirar’ o preço dos combustíveis. Com o fim do PPI, o brasileiro deixou de pagar pelos combustíveis como se fossem totalmente importados. O Brasil é autossuficiente na produção de petróleo, a Petrobras tem grande parque de refino e utiliza majoritariamente petróleo nacional que ela mesma produz.
Agora, precisar buscar a autossuficiência no refino, terminando as obras de refinarias que foram paralisadas pela Operação Lavo Jato, como a Rnest e o Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), ampliando as refinarias existentes e, se necessário, construir uma nova e moderna refinaria com biorrefino e combustíveis verdes, para atender a demanda do 8º maior mercado consumidor de derivados de petróleo do mundo.
Ao longo dos anos, a Petrobras impulsionou o desenvolvimento econômico e social do país, investiu em cultura, em pesquisa e desenvolvimento, e foi pioneira na exploração de petróleo em águas profundas. Apesar dos ataques sofridos por governos anteriores, a Petrobras resistiu e volta com fôlego para seguir sua trajetória estratégica de maior empresa do Brasil, com a valorização de seus empregados e a retomada de concursos públicos para ocupação de novos postos de trabalho exigidos pelo crescimento.
A FUP continuará alerta e atuante, lembrando que a história da Federação, criada em 1994, é de lutas. Já em maio de 1995, um ano após sua criação, aconteceu a maior greve da história da categoria petroleira contra o projeto de emenda constitucional enviado pelo então presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que visava acabar com o monopólio da Petrobras na exploração e produção de óleo e gás, refino e distribuição de derivados. O movimento durou 32 dias, com mais de 90% de adesão da categoria, e se transformou em símbolo do enfrentamento dos trabalhadores brasileiros ao projeto neoliberal do governo.
A greve de maio de 1995 despertou um movimento nacional de solidariedade e unidade de classe, fazendo ecoar por todo o país um brado que marcou para sempre a categoria: “Somos todos petroleiros”. O grito se mantém vivo e presente. Tanto que em 2020, a categoria realizou a segunda maior greve da história, com a ocupação da sede da Petrobras, no Rio de Janeiro.
Deyvid Bacelar é coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP).