Gaza
Nesse caso, a Europa tem agido como um retransmissor diplomático de Tel-Aviv. E a França contribui para esse alinhamentoSerge Halimi
“Nenhum país do mundo aceitaria que mísseis disparados de fora de suas fronteiras chovessem sobre seus cidadãos.” Ao fazer essa constatação de bom senso, o presidente dos Estados Unidos não pensava nos palestinos na Faixa de Gaza, presas indefesas de bombas ou de mísseis israelenses lançados por vezes por F-16 ou por helicópteros Apache de fabricação norte-americana.
Há anos, com uma regularidade irritante, os mesmos estratagemas são usados para descrever o encadeamento dos fatos na Palestina. Primeiro, aquele que consiste em repisar uma história caolha segundo a qual o “terrorismo” dos sitiados justifica necessariamente a “resposta” dos sitiadores. Em seguida, aquele que confere impunidade a um beligerante dotado de uma superioridade militar esmagadora fazendo pose de vítima logo antes de desencadear uma nova escalada armada. Enfim, aquele que faz valer a natureza democrática de Israel, cujo governo inclui, no entanto, uma extrema direita racista representada no seio do gabinete pelo atual ministro das Relações Exteriores.
A Primavera Árabe teria mudado tão poucas coisas no Oriente Médio a ponto de um mesmo cenário poder se reproduzir em Gaza quatro anos depois da “Operação Chumbo Fundido”?1 Analisando a evolução da região desde 2011, Hussein Agha e Robert Malley destacaram recentemente a frágil pertinência dos esquemas habituais de análise: “Os Estados Unidos são aliados do Iraque, que é aliado do Irã, que apoia o regime sírio, que os Estados Unidos pretendem derrubar. Os Estados Unidos também são aliados do Catar, que financia o Hamas, e da Arábia Saudita, que financia os salafistas, inspiradores de jihadistas determinados a matar norte-americanos”.2 Pelo menos na Faixa de Gaza, de início, as coisas pareceram mais simples… Enfraquecido por seu investimento fracassado em favor do candidato republicano Mitt Romney, Benjamin Netanyahu esperava refazer sua saúde eleitoral nas costas dos palestinos. Assim, considerou que os bombardeios de cidades israelenses o obrigavam a castigar uma vez mais o Hamas, incapaz, segundo ele, de impedi-los. Ele apenas “esqueceu” que os lançamentos de foguetes começaram em Gaza em 10 de fevereiro de 2002, num momento em que essa área ainda era… ocupada por Israel.
Nesse caso, a Europa tem agido como um retransmissor diplomático de Tel-Aviv. E a França contribuiu para esse alinhamento. No início de novembro, na presença do primeiro-ministro israelense, o presidente François Hollande considerou útil admoestar a Autoridade Palestina, muito tentada, segundo ele, a “ir buscar na Assembleia Geral das Nações Unidas o que ela não consegue na negociação”.3
Exatamente de qual negociação ele falava? Poucos dias depois, o ministro das Relações Exteriores, Laurent Fabius, resumiu nestes termos os pródromos da crise em Gaza: “Houve lançamentos de foguetes durante todo o fim de semana contra Israel; e, de repente, Israel respondeu”.4 O plágio das declarações oficiais norte-americanas tornou-se o destino da diplomacia francesa?
Serge Halimi é diretor do Le Monde Diplomatique.