Habitação cooperativa, um freio contra a especulação
A explosão do preço da moradia (mais de 140% desde 1998 na França) remove os locatários do centro da cidade e faz a fortuna dos especuladores. Como interromper essa espiral? A habitação cooperativa, protegida por uma astúcia jurídica, oferece uma pista para a soluçãoMartin Denoun e Geoffroy Valadon
Na Alemanha, no final dos anos 1980, moradores ocupantes de prédios, diante da precariedade das ocupações e da repressão judiciária que sofriam, se envolveram na montagem de projetos de habitação autoadministrados e perenes. Eles tiveram então que enfrentar esta questão: como recorrer à propriedade privada sem alimentar a especulação imobiliária? Por uma astúcia jurídica, eles amputaram o direito da propriedade de sua dimensão capitalista e especulativa para manter apenas o direito de uso. Um desvio similar ao do software livre, que transforma o copyright em copyleft.1
Foi assim que nasceu o Mietshaüser Sydikat (Sindicado dos Prédios de Locação), instrumento destinado a retirar imóveis do mercado de maneira definitiva. A Genossenschaft, cooperativa imobiliária tradicional, não oferecia essa garantia. A dificuldade consistia em utilizar o espaço de liberdade que o direito econômico alemão oferece às empresas para lhe dar um sentido não especulativo. Em 1985, o jurista Michael Neuling colocou em ação o dispositivo.2 O proprietário do imóvel é uma sociedade anônima com responsabilidade limitada (GMBH) que conta com dois acionistas: a assembleia de moradores de um lado e o sindicato do outro. A assembleia é soberana no que diz respeito à gestão do local; mas, quando se trata de revender os locais, de transformá-los em propriedades individuais ou de operar a menor mudança de estatuto, as duas vozes são necessárias. O sindicato, ele mesmo composto por todos os projetos membros, dispõe assim de um direito de veto que lhe permite proibir qualquer operação especulativa.
Os ocupantes pagam uma contribuição mensal que lhes dá um direito de uso sobre seu alojamento e uma voz na assembleia dos moradores, mas nenhum encargo social. A propriedade é, portanto, coletiva. Os residentes são autorizados a transformar sua moradia; eles decidem coletivamente sobre a gestão, reformas e regulamento interno. Os “alugueis”, que permitem pagar créditos bancários e diretos,3 diminuem consideravelmente quando o empréstimo é reembolsado. Todas as assembleias pagam, em função de sua metragem e do peso de sua dívida, uma contribuição a um fundo de solidariedade que ajuda os projetos novos. Para estes últimos, o Mietshaüser Sydikat também funciona como plataforma de informação e conselho.
Esse modelo foi colocado em ação pela primeira vez em 1989, com o Grether Projekt: 1,6 mil metros quadrados de moradias e locais de uso coletivo no entorno da antiga usina Gretherschen, em Friburgo. Agora, quase 1,5 mil pessoas vivem nos 47,5 mil metros quadrados dos 63 projetos associados ao Syndikat. O conjunto representa um custo de 58 milhões de euros, dos quais muitos já foram integralmente pagos. Vinte e cinco novos programas de habitação estão em gestação.
Nos países nórdicos, a existência de um estatuto jurídico específico e de políticas voluntaristas permitiram um desenvolvimento importante de sistemas diferentes de propriedade privada. Na Suécia, 18% do parque imobiliário funcionam sob um regime cooperativo; na Noruega, 13%.4 O modelo também se espalhou pela Suíça, Holanda, Alemanha, Quebec e recentemente, pela Catalunha, mesmo se os estatutos escolhidos não garantem sempre a não especulação.
Na França, onde a lei não prevê nenhum estatuto para as cooperativas de habitação, as associações Habicoop, Toitsdechoix(Tetos de Escolha), CLIP ou ainda a Terredeliens(Terra de Ligações) experimentam modelos jurídicos parecidos a partir dos direitos das empresas por ações simplificadas (EAS/SAS), empresas com responsabilidades limitadas e sociedades civis imobiliárias (SCI). O CLIP procura o meio de reproduzir no direito francês a radicalidade do projeto Mietshaüser Syndikat. A Habicoop trabalha em parceria com as empresas sociais de conjuntos habitacionais. Seu modelo toma a forma de uma cooperativa por ações simplificadas: os depósitos e taxas de direito pagos pelos moradores lhes dão ao mesmo tempo um direito de uso e títulos de partes sociais, que em caso de partida serão transferidos para a cooperativa a preço simbólico e não de mercado. Seu projeto piloto, a “vila vertical” será entregue neste ano em Villeurbanne (Rhône). Na Ardèche, a ecovila de Hameau des Buis inventou um dispositivo original: a associação de moradores consente um empréstimo perpétuo com taxa zero a uma sociedade comercial, que lhe concede em contrapartida um direito de uso sobre os locais.
Nem locatário, nem proprietário
Em todos esses modelos, trata-se de separar o usufruto, atribuído aos moradores, da propriedade, transferida a uma entidade independente que faz as vezes de entrave anti-especulativo. Esses imóveis colocados fora de mercado abrem um novo horizonte: o de uma “propriedade de uso” em que o direito a um espaço depende da necessidade que temos de viver nele. Eles instituem um novo tipo de habitante: com todos os poderes de decisão sobre seu local de vida, ele é mais que um locatário; sem poder de especular sobre o seu bem, ele é menos que um proprietário.
Os que fazem o procedimento de “alienar” sua propriedade a uma cooperativa aspiram geralmente a construir seu projeto de maneira coletiva. Eles se constituem a partir de grupos de afinidades para conceber a arquitetura, organizar a gestão e a vida mais ou menos coletiva do local.
No entanto, na ausência de um estatuto jurídico próprio, esses formatos apresentam algumas fragilidades: o fisco poderia submetê-los aos impostos para empresas, e a justiça poderia requalificar as partes sociais em títulos de propriedade.
A reflexão anunciada pela ministra da habitação Cécile Duflot com o objetivo de criar um estatuto específico é encorajadora: isso permitiria consolidar e ampliar esse tipo de projeto. Mas será necessário ficar atentos aos efeitos dessa institucionalização. O perigo aparece por exemplo quando as políticas públicas pensam a habitação cooperativa como um substituto da habitação social, amalgamando duas lógicas com origens bem diferentes. As cooperativas correm, então, dois riscos: o de ver a concepção e a gestão de seus projetos formatados “de cima”, e o de se dissolver, ou de se transformar em condomínios clássicos.
Martin Denoun e Geoffroy Valadon são autores de Ju-jitsu politique, l’art du levier (Política do jiu-jitsu, a arte da alavanca). Integrantes do coletivo La Rotative (www.larotative.org).