Marx e o século XXI
Marx não pôde imaginar que a classe burguesa engendraria no proletariado seus valores e daria a ele essa possibilidade de consumo. Os trabalhadores agora com poder de compra, não se vêem mais com uma classeAmanda Marina Lima Batista
Karl Marx, através do método do materialismo histórico, anunciou o fim do Capitalismo através da revolução proletária. No entanto, tal sistema persiste corrompendo instituições e enfraquecendo valores. O motivo para o prevalecimento desse modo de produção é o fato de que a burguesia industrial, mais uma vez, contornou as adversidades e se manteve no poder.
Essa classe, considerada por Marx como revolucionária, ao perceber que o operariado estava revoltando-se contra o trabalho excessivo a baixos salários e péssimas condições, tornou-se mais sutil quanto à sua forma de exploração: as fábricas deixaram de ser “satânicas”, passaram a oferecer melhores condições de trabalho e a estimular seus trabalhadores a qualificarem-se. Porém, essa qualificação seria sempre voltada para a demanda dos meios de produção, os quais agora possuem indivíduos naturalmente disciplinados pela educação familiar e escolar.
Iniciamos assim a era da disciplina científica, na qual nos encontramos até hoje. Nela, não precisamos de contramestres para nos exigir disciplina e produtividade, exigimos isso de nós mesmos automaticamente porque agora, como diria Michelle Perrot, nosso contramestre é nossa consciência. Vivemos cada minuto de nossas vidas empenhados em sermos úteis e valiosos para o mercado e dessa forma – apenas dessa forma – sermos alguém, o que, na lógica capitalista quer dizer consumir e ascender economicamente para consumir mais.
Marx não pôde imaginar que a classe burguesa engendraria no proletariado seus valores e daria a ele essa possibilidade de consumo. E dando aos trabalhadores esse poder de compra, o qual varia conforme a função que cada um exerce, a burguesia inseriu – dentro da própria classe operária – distinções sociais que a impedem de ver-se como uma única classe. A dificuldade hoje não é apenas que o operariado torne-se para si e passe a lutar por seus objetivos, mas sim que se entenda como um estamento só, uma vez que o poder de compra diferenciado fragmentou-o em subclasses (baixa, média, média-alta e alta) que não se consideram iguais e conseqüentemente não se unem para fazer a revolução.
Mesmo perante esse quadro que só tornou o fim da era do capital mais distante, a esperança de uma nova realidade ainda existe e virá “de baixo” como já havia sido dito. Isso porque junto à onda do mercado veio a tecnologia, veio a internet e a formação da aldeia global. Conhecer o mundo deixou de ser um privilégio para a aristocracia e a cultura popular ganhou voz, ganhou face através da arte em suas variadas manifestações e da disseminação virtual dessa arte. Multiplicam-se pelo mundo movimentos contrários ao globaritarismo, recorrendo ao neologismo pertinente de Milton Santos,que utilizam os frutos do próprio Capitalismo para oporem-se a ele.
Diante disso, é possível afirmar que muitos acontecimentos colocaram à prova muitas afirmações marxistas, mas isso não significa que ele se equivocou quanto ao caminho.Uma outra globalização ainda é possível. Uma globalização aliada da cultura e do bem-estar social, não mais do mercado e do capitalismo financeiro, uma globalização inclusiva e não seletiva, libertadora e não alienante, disseminadora da transformação e não da adaptação, uma globalização enfim popular e de equidade.
Amanda Marina Lima Batista é estudante de Direito PUC/ MG.