No Magreb, os blogueiros estão cansados
Se a saída de Zine al-Abidine ben Ali foi celebrada em um grande movimento de unidade nacional, ela também marcou o retorno das divisões. Privados da figura do inimigo, os ciberativistas se tornaram concorrentes políticosSmäin Laacher e Cédric Terzi
Os comentários celebrando a “revolução Facebook” na Tunísia não ajudam a compreender como os blogueiros tunisianos passaram do entusiasmo ao desencanto. Manichaeus2 resume assim o estado de espírito atual: “Eles estão de luto”. Foi na internet que tomaram consciência de que o regime lhes era insuportável e que eles podiam criticá-lo publicamente. Todos os que conhecemos mencionaram o papel precursor da TuneZine, uma revista de oposição on-line lançada em 2001 pelo economista Zouhair Yahyaoui, o primeiro “mártir ciberativista”.3 Para eles, entrar no universo da internet significava experimentar um distanciamento crítico em relação ao sistema e, mais amplamente, em relação à sociedade tunisiana. Animados por uma ambição literária, muitos blogueiros relataram a vida cotidiana, as dificuldades e os sofrimentos de seus compatriotas. Isso não os colocou ao abrigo da censura, das intimidações policiais e, para alguns, da prisão − como Fatma Arabicca, cuja prisão, em 2009, provocou uma mobilização nacional e internacional que acarretou sua libertação.4
Desde então, não cessaram de se opor a “Amar 404” (o personagem imaginário que divulga o “erro 404”, que indica aos internautas que eles não têm acesso a uma página da Web), ironizando-o constantemente. Entretanto, sua luta tomou uma dimensão nova na primavera [do Hemisfério Norte] de 2010, quando a censura atingiu o conjunto dos usuários do Facebook. Uma petição on-line recolheu mais de 10 mil assinaturas. Alguns ciberativistas tomaram então a decisão, inconcebível à época, de pedir oficialmente a autorização de se manifestarem contra a censura em 22 de maio. Interpelados pela polícia, renunciaram, mas convidaram todos os cidadãos a se reunir na principal avenida de Túnis vestindo uma camiseta branca. Yassine Ayari,5 um dos instigadores dessa mobilização, a apresenta como “uma reviravolta”.
Todos contam com emoção como, em dezembro de 2010, eles receberam e divulgaram as imagens de policiais atirando com balas reais nos jovens manifestantes. Sentiram-se então envolvidos em um extraordinário sentimento de solidariedade nacional que os lançou nas ruas e os manteve acordados noites a fio, atrás das telas de seus computadores, para divulgar as imagens das manifestações e os excessos dos policiais.
Cacofonia indescritível
Em retrospectiva, essa prova coletiva aparece como o momento de unificação de uma comunidade que imediatamente se desagregou. Se a saída de Zine al-Abidine ben Ali foi celebrada em um grande movimento de unidade nacional, ela também marcou o retorno das divisões. Privados da figura do inimigo, os ciberativistas se tornaram concorrentes políticos. Suas relações foram minadas pela rivalidade, a desconfiança, a difamação: “Os inimigos não são evidentes; não sabemos mais quem é inimigo de quem”, conta-nos A Tunisina Girl,6 uma das blogueiras mais midiatizadas nos países ocidentais. “É isso: estamos divididos agora. Alguns blogueiros se apoiam, outros não.” Hamadi Kaloutcha também está desiludido: “Desde 14 de janeiro de 2011, a internet se tornou um zum-zum geral, no meio do qual não conseguimos mais pensar. É difícil para nós nos fazermos ouvir no meio das lutas partidárias”. É preciso lembrar que as redes sociais acolheram um excesso de novos inscritos, entre os quais muitos opositores, que divulgam falsas informações, traficam vídeos e fotografias, o que resulta em uma cacofonia indescritível.
O entusiasmo dos comentaristas ocultou a experiência dos ciberativistas tunisianos. No entanto, suas angústias mereciam ser ouvidas, mesmo que denunciassem as certezas amplamente compartilhadas que são impostas ao estrangeiro. Não é evidente que os governos, as mídias e os pesquisadores ocidentais que lançaram os blogueiros como porta-vozes legítimos do povo tunisiano à frente da cena pública tenham prestado um grande serviço à unidade das forças progressistas.
Smäin Laacher e Cédric Terzi são sociólogos, membros do Centro de Estudos dos Movimentos Sociais (CNRS-EHESS).