Nos Bálcãs, o charme perdido da Europa
A Croácia será, a partir de julho de 2013, o 28º Estado-membro da U.E. A adesão foi aprovada em janeiro por 67% dos eleitores, mas a participação foi fraca: 43%. Na verdade, é sem entusiasmo que os croatas se preparam para juntar-se à comunidade. A perspectiva europeia perdeu muito de seu interesse em toda a regiãoJean-Arnault Dérens
“A Croácia vai entrar em uma União Europeia [UE] que está vivendo a crise mais grave de sua história, uma Europa neoliberal e arquiburocratizada, apesar de seu verniz de democracia”, indigna-se Mate Kapovic. Esse jovem linguista, que termina sua tese na Universidade de Zagreb, era uma das vozes mais influentes da oposição de esquerda à integração da Croácia na União Europeia.
Desde que a Croácia entrou, há mais de dez anos, no longo processo que leva à adesão, a maioria das críticas vinha dos meios nacionalistas. Estes denunciavam os riscos de uma perda da soberania e da obrigação de cooperação com a justiça internacional, que culminaria com a prisão e o julgamento de “heróis” da guerra de independência – sem esquecer os setores mais conservadores da Igreja Católica, hostis a uma Europa que quer “impor” o direito ao aborto ou a legalização do casamento homossexual. Para a direita nacionalista, a Croácia não teria nada a ganhar ao trocar assim a antiga “dependência” de Belgrado por uma nova “subjugação” a Bruxelas. Essas correntes permanecem influentes; no entanto, o desenvolvimento de uma crítica de esquerda à integração europeia foi a novidade política desses últimos anos.
Na Croácia, como em outros países dos Bálcãs, a oposição à “Europa liberal” é o ponto de encontro de uma nova esquerda radical, que se ilustrou durante as manifestações da virada de 2010 para 2011. Toda noite, milhares de pessoas saíram às ruas das grandes cidades croatas para denunciar tanto a corrupção da direita conservadora, então no poder, como a “ditadura do capital”. Os chamados à manifestação circulavam nas redes sociais, pois o movimento recusava qualquer estruturação ou hierarquia. Em Zagreb, os cortejos uniam representantes de todos os partidos e também dos sindicatos e das principais instituições. Os manifestantes queimavam a bandeira europeia diante da sede da Delegação da Comissão Europeia. “É raro que a Croácia esteja na vanguarda, mas nós antecipamos o movimento mundial dos ‘indignados’”, sorri Kapovic.
“O saber não é uma mercadoria.” Há mais de dois anos, esse slogan barra a fachada da Faculdade de Filosofia de Zagreb, que se tornou o epicentro de um movimento estudantil cujas reivindicações radicais se espalham pouco a pouco pelo país e para além das fronteiras croatas, nas outras repúblicas da antiga Iugoslávia. “Reivindicamos o ensino superior gratuito”, explica um dos agitadores. “O governo queria instaurar taxas de inscrição. Graças à nossa mobilização, conseguimos bloquear sua generalização. Os estudantes só devem pagar taxas no terceiro e no quarto ano. O primeiro, o segundo e o quinto ano continuam gratuitos. Esse compromisso um pouco bizarro está diretamente ameaçado pela integração europeia anunciada, pois ele vai contra o protocolo de Bolonha, que harmoniza o ensino superior em todos os países da União… Para nós, a adoção das regras europeias não gera progresso, mas coloca em questão um direito fundamental.”
Essas novas mobilizações são malvistas por certos eleitores tradicionais da esquerda croata. Miljenko Turniski milita na Agência da Democracia Local de Osijek, no leste do país. Sua organização é muito engajada na cooperação transfronteiriça com a Hungria, mas também com a Sérvia e a Bósnia-Herzegovina. Tomada pelas forças sérvias, a cidade de Osijek foi muito atingida pelos combates do início dos anos 1990. O próprio Turniski foi engajado e denuncia a “confusão” em torno dos novos movimentos de protesto: “Que alternativa eles propõem à integração europeia?”. Para ele, ela anda junto com a normalização das relações regionais e constitui a única resposta ao retorno nacionalista que continua tentando, segundo ele, a direita croata. O militante reconhece sem dificuldade que a situação “não está boa” em muitos países da União, mas continua convencido de que os “valores europeus”, principalmente os pregados pelo Conselho da Europa, permitem o desenvolvimento da sociedade civil e uma verdadeira democratização da Croácia e da região.
O desacordo tem talvez uma dimensão geracional. Salvo algumas exceções, como Nikola Viskovic, professor honorário da Faculdade de Direito de Zagreb e grande desprezador do “imperialismo” e do “militarismo” da UE,1 a maior parte das críticas de esquerda vem de intelectuais com no máximo 30 anos, como Kapovic. Essa geração não é ex, mas pós-iugoslava: ela praticamente não conheceu a antiga federação socialista e, se por vezes idealiza esse Estado desaparecido, encara como normais as repúblicas atuais. Não tendo sido engajada nas guerras dos anos 1990, ela também é pós-nacionalista. Nesse ponto, o argumento de que a integração europeia é um meio para ultrapassar os conflitos entre os países dos Bálcãs a toca pouco, enquanto os contatos com as outras repúblicas se tornaram naturais.
Há alguns anos ainda, no entanto, em todos os países dos Bálcãs ocidentais, o debate político parecia se resumir a uma confrontação entre forças nacionalistas e correntes democráticas e “pró-europeias”, o que tinha como primeira consequência colocar em segundo plano todas as outras questões, principalmente as ligadas às questões sociais ou econômicas e às privatizações.
Foi provavelmente na Sérvia que a oposição entre nacionalismo e integração europeia foi mais dramática. Depois da queda do regime de Slobodan Milosevic, em outubro de 2000, o Partido Democrático (DS), do presidente Boris Tadic, persistiu em uma verdadeira chantagem moral com a União. Ele solicitava que ela tivesse “gestos” em favor das correntes “pró-europeias” da Sérvia, sem os quais o país estaria ameaçado por um “retorno ao nacionalismo dos anos 1990”. Essa polarização permitia igualmente ocultar os desvios e a corrupção que corroem a classe dirigente sérvia.
Entusiasmo da classe política
Neste início de ano, os muros das cidades estavam novamente cobertos por cartazes do Partido Radical Sérvio (SRS) proclamando “Não à União Europeia!”. Ainda que esse partido continue rejeitando a perspectiva de integração, esse não é mais o caso do Partido Progressista Sérvio (SNS). Uma importante cisão levou embora, no fim de 2008, a maior parte dos filiados do SRS, deixando apenas um quarto dos fiéis seguindo a linha antieuropeia ditada pelo chefe histórico dos radicais, Vojislav Seselj, de sua cela da prisão internacional de Scheveningen. Tomislav Nikolic, o dirigente da nova formação, ligou-se à integração. Os diplomatas ocidentais em Belgrado se alegraram com esse aggiornamento[atualização] da extrema direita sérvia, comparando o percurso ideológico de Nikolic ao do italiano Gianfranco Fini e estendendo-lhe o tapete vermelho.
Tal entusiasmo pela Europa não aparece apenas nos políticos, mas também nos meios econômicos. Ao fim das eleições sérvias da primavera [no Hemisfério Norte] de 2008, nenhuma maioria clara se destacava. Foram as oligarquias que serviram de intermediárias, negociando a composição de um governo “pró-europeu” nas boas mesas do Clube dos Empresários de Belgrado. Para esses riquíssimos homens de negócios, a integração europeia da Sérvia permitiria completar a “regularização” de uma fortuna cujas origens vêm de atividades obscuras dos anos de guerra e de embargo internacional, e ainda permitiriam o acesso facilitado a um mercado mais vasto.
Esse novo consenso pró-europeu provavelmente não é tão grande em nenhum outro lugar quanto na Bósnia-Herzegovina. Em Sarajevo, alguns destacam, não sem ironia, que “nos anos 1990 todos os partidos que conduziram a guerra se proclamavam democráticos; agora, esses mesmos partidos, que continuam a monopolizar o poder e a bloquear toda a evolução do país, se dizem todos pró-europeus”.
Um dos mais fervorosos partidários da integração é ninguém menos que Milorad Dodik, o presidente da Republika Srpska, a “entidade sérvia” da Bósnia-Herzegovina – país teoricamente unido, mas ainda dividido pelas linhas traçadas em 1995, durante os acordos de paz de Dayton.2 No início de janeiro, a Republika Srpska festejou pomposamente seu vigésimo aniversário, sendo sua proclamação no dia 8 de janeiro de 1992 o prelúdio imediato da guerra que tomaria o país alguns meses depois. Dodik aproveitou a ocasião para reiterar que “o futuro da Republika Srpska está na União Europeia”.3
No Kosovo, colocado desde junho de 1999 sob protetorado internacional das Nações Unidas e beneficiado desde 2008 por uma independência “controlada” pela União Europeia – mas ainda contestada pela Sérvia4 e reconhecida apenas por 93 Estados no mundo –, críticas virulentas são feitas agora.
“O Kosovo serve há dez anos como terreno de experimentação às políticas europeias. Com que resultados? Uma economia destruída, uma sociedade gangrenada pela corrupção, uma classe política irresponsável”, indigna-se Arbër Zaimi. Originário da Albânia, ele foi um dos principais agitadores do movimento Mjaft! (“Chega!”), que apontava a corrupção da classe política albanesa. Ele deixou a organização em 2008, estimando que “a ação das ONGs é insuficiente, pois denuncia as consequências sem atacar as causas dos problemas”. Depois ele foi para o Kosovo, onde coordena comissões encarregadas de elaborar o programa do movimento Vetëvendosja! (“Autodeterminação!”). Reivindicando seu engajamento “revolucionário”, ele é um dos pilares da rede pan-albanesa RROSH, que reúne formações políticas e associações de todas as regiões albanesas dos Bálcãs.
Desde sua criação, no início dos anos 2000, o Vetëvendosja! milita pela supressão de todas as formas de protetorado internacional sobre o Kosovo e pela unificação nacional albanesa, em nome do direito dos povos à autonomia. O movimento, cujas referências ideológicas provêm mais da extrema esquerda marxista-leninista “enverista”5 do que do nacionalismo clássico, apresentou-se pela primeira vez às eleições em dezembro de 2010, recebendo oficialmente 12,2% dos votos.
“As elites políticas de todos os países dos Bálcãs tiram sua legitimidade da comunidade internacional. É ela quem atribui as patentes de compatibilidade democrática, de modernidade, de eficiência”, explica Zaimi. “Trata-se apenas, em suma, de um discurso que basta saber recitar corretamente no momento certo.” Para ele, os critérios de “boa gestão”, tão louvados em Bruxelas, são apenas uma isca: “A União Europeia pretende lutar contra a corrupção, mas ela só busca, na realidade, liberar o acesso aos mercados para suas próprias empresas ou para aquelas que estima compatíveis com seus interesses”. É verdade que a crônica do protetorado internacional no Kosovo foi envernizada por diversos escândalos de corrupção, nos quais os funcionários das missões internacionais – que supostamente levariam para o Kosovo as práticas da “boa gestão” – tiveram um papel dos mais ativos.6
Desbalcanizar os Bálcãs
Em julho de 1999, algumas semanas depois do fim da guerra do Kosovo, Robin Cook, então ministro das Relações Exteriores britânico, definia o objetivo do pós-guerra: “desbalcanizar os Bálcãs”. O fundo ideológico dessa visão não deixa dúvidas. Tratava-se de limpar a região da “selvageria”, de sua hereditária propensão à violência, para enfim fazê-la ascender às virtudes da “civilização europeia”, quer dizer, aos valores políticos ocidentais.7 Essa visão foi retomada pelos próprios dirigentes balcânicos, ou pelo menos pelos “ocidentalistas”.
No entanto, se o objetivo era aproximar as culturas e as práticas políticas dos países da região das oficialmente promovidas pela União, o fracasso da “europeização” dos Bálcãs foi patente. É nos dois países em que a “comunidade internacional” – e particularmente a UE – exerceu mais responsabilidades, a Bósnia-Herzegovina e o Kosovo, que as práticas generalizadas de corrupção e má gestão são mais flagrantes.8
Depois do encontro europeu da Tessalônica, em junho de 2003, todos os países dos Bálcãs ocidentais têm uma “vocação” afirmada de juntar-se, um dia, à UE, por menos que sigam o “roteiro” que, atualizado de ano em ano pela Comissão Europeia, avalia seus progressos na adoção dos “critérios de Copenhague”. Definidos durante o encontro que aconteceu na capital dinamarquesa em 1993, estes supõem principalmente a organização de “instituições estáveis que garantam o Estado de direito, a democracia, os direitos humanos, o respeito às minorias e sua proteção”, assim como a “instauração de uma economia de mercado viável”.
Em uma Europa abalada pela crise, os cidadãos dos Bálcãs ocidentais podem apenas se interrogar sobre a pertinência desses critérios e sobre a realidade dos “valores europeus”. As opiniões públicas seguiram com temor a evolução dos acontecimentos na Grécia, enquanto por muito tempo elas entendiam a integração europeia como uma adesão a um “clube dos ricos” e uma garantia de estabilidade econômica.
As opiniões públicas se desinteressam cada vez mais. Na Sérvia, segundo pesquisas de opinião, menos da metade dos cidadãos ainda apoia a perspectiva da integração, e a taxa de adesão não para de desmoronar. Mas as elites políticas continuam amplamente eurófilas.
Esse consenso impede, inclusive, o aparecimento de um verdadeiro debate. “Dentro da lógica europeia, não é mais possível discutir sobre o tipo de sociedade na qual queremos viver, modelos econômicos e sociais que desejamos. A única questão que permanece em aberto é saber se nossos dirigentes são ou não bons alunos, que aplicam corretamente as soluções e os modelos definidos em Bruxelas”, revolta-se Zaimi.
Mislav Zitko, um jovem economista croata, enfatiza que, na Europa que se desenha, os países dos Bálcãs podem aspirar apenas à posição de “periferia dominada” – “como a que já ocupavam sob o Império Otomano ou sob o comunismo”, precisa Zaimi.
O “pequeno sim” pelo qual os croatas aceitaram, no dia 22 de janeiro, a integração de seu país à União foi acolhido com alívio pelos dirigentes europeus, mas também pelos governos dos outros países da região, que temiam o repúdio de um “não”. No entanto, a adesão croata, prometida há anos, apenas encerrará um ciclo, sem que se possa apostar na retomada do processo de ampliação. Ao “cansaço da ampliação” frequentemente evocado em uma Europa em crise, vem em resposta um profundo desencanto dos países candidatos ou potencialmente candidatos. É o próprio sentido do projeto europeu que seria conveniente redefinir agora.
Jean-Arnault Dérens é redator-chefe do Courrier des Balkans.