FRANÇA
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Nossa luta
Os leitores sabem que não somos revendedores de mercadorias. Se o hábito da indústria e das lojas é enchê-los de ofertas, nossos apelos trazem outro tipo de “retorno”: independência, singularidade e escolhas editoriais que não são submetidas às exigências de anunciantes nem à indiferença da maior parte dos jornalistasSerge Halimi
Há um ano, fizemos um apelo aos nossos leitores1. Por serem parte de nossos projetos e de nossa situação financeira, pedimos doações, assinaturas, divulgação do jornal entre amigos e ainda mais regularidade na compra do Le Monde Diplomatique em bancas. A informação independente é um bem público, mas o essencial de nossas verbas ainda é exclusivamente bancado por compradores e assinantes do jornal. Sem eles, ou melhor, sem vocês, a existência e o desenvolvimento desta publicação não seriam possíveis.
Nosso apelo foi ouvido: 1.648 leitores depositaram 164.321 euros em forma de doação, em particular entre outubro e dezembro passados. Desde o início deste ano, apesar do aumento do preço do jornal e da tarifa de assinante, nossa distribuição foi mantida (+0,4%), fato raro na imprensa francesa hoje em dia. Após muitas atividades em déficit, esperamos apresentar contas equilibradas em 2010.
A mobilização de nossos leitores permitiu, assim, que a saúde financeira do Le Monde Diplomatique não fosse abalada. Num momento em que a situação dos meios de comunicação impressos é preocupante, em que os jornais livres de qualquer influência de grupos industriais, financeiros ou publicitários são cada vez menos numerosos e em que o próprio Le Monde está em outras mãos, essa mobilização é decisiva. A atitude dos nossos leitores conforta-nos e incita-nos a seguir os rumos que vinham sendo traçados pelo periódico. Também consolida as garantias estatutárias das quais dispomos: a eleição do diretor pela equipe do jornal e a detenção de quase metade do capital do jornal (49%) pela Associação de Amigos do Monde Diplomatique, pessoa jurídica distinta de outros títulos do grupo.
Há um ano, frisamos que as somas recebidas a partir da campanha de doação seriam empregadas não para tapar buracos – ligados, por exemplo, à queda das receitas publicitárias –, mas para sustentar nossos valores editoriais: preço mais baixo em países mais pobres; acompanhamento de novas edições internacionais, às quais reduzimos, em alguns casos, o pagamento de direitos até que se consolidem (Hungria, edição curda), ou beneficiamos com tarifas preferenciais (Peru, Armênia, Coreia do Sul etc.); digitalização dos exemplares do jornal desde sua criação, em 1954, a fim de preservar nossos arquivos em bibliotecas que não têm mais condições de gerenciar material de imprensa em papel. Foram essas doações que nos permitiram empreender pesquisas e reportagens – em geral onerosas – sobre conflitos atuais, mas não só: também sobre alternativas, “realistas” ou “utópicas”, a um sistema econômico e social que parece se beneficiar das crises que provoca.
Assim, em 2010, consagramos 82 mil euros à redução de nossas tarifas nos países do Sul, 83 mil euros ao auxílio a lançamentos e manutenção de edições internacionais, 54 mil euros à digitalização e indexação de números antigos, 63 mil euros a custos adicionais em pesquisa e reportagem. O total, 282 mil euros, é superior às doações recebidas desde outubro passado. Contudo, tínhamos reservado um pequeno orçamento para esses gastos com desenvolvimento e solidariedade.
Nossos leitores sabem que não somos revendedores de mercadorias. Se o hábito de indústrias e lojas é encher suas caixas postais com ofertas (relógios, televisores, canais de alta definição, crediários), nossos apelos oferecem outro tipo de “retorno” em troca de fundos: nossa independência, singularidade, escolhas editoriais não submetidas às exigências de anunciantes e indiferença ao engodo e mimetismo da maior parte dos jornalistas. Basta comparar nossas modestas formas de promoção e desenvolvimento com outros títulos que jamais manifestaram qualquer indício de resistência aos discursos hegemônicos.
Por exemplo, em 17 de março último, uma campanha de 20 milhões de euros tentou relançar France Soir, propriedade do oligarca russo Alexander Pougachev, que brinca com essa publicação como uma criança com seu trenzinho elétrico. Seis meses depois, o jornal Les Echos, propriedade de Bernard Arnault, principal fortuna da França, investiu 6 milhões de euros em uma campanha com cartazes e propagandas de rádio que anunciavam a “nova fórmula” do periódico, mais colorida que a anterior. Ao observar essas movimentações, é redundante afirmar que usamos nossos recursos – os que você, leitor, proporciona-nos – com discernimento.
Nossa luta continua para que os objetivos atingidos em 2010 possam ser retomados e ampliados. É por essa razão que solicitamos novamente seu apoio para defender e levar adiante um jornalismo de interesse geral, crítico e curioso, independente do poder político e financeiro. Uma vez mais, pedimos aos nossos leitores que assinem o jornal, que incentivem amigos a fazê-lo2 e, na França, realizem doações antes do fim deste ano e filiem-se à Associação de Amigos do Monde Diplomatique.
Não contamos com nenhum outro tipo de apoio além do seu. E essa dependência é a única que nos interessa.
Serge Halimi é o diretor de redação de Le Monde Diplomatique (França).