O dia que a terra parou
Na web, o contato torna-se de terceiro grau – digitalizado. Em
múltiplas plataformas, em diversos platôs, com os estranhos ou não, ele
é algo do cotidiano. A ameaça torna-se imanente. De dentro para
dentro. Klaatu não é mais um alienígena. É parte do imaginário
coletivo. Klaatu não nos deixa mais parar!Hernani Dimantas
Adoro esse filme. O dia que a terra parou é um dos emblemas que marcam a sociedade do começo do século passado. Um filme de 1951, no qual o
alienígena Klaatu viaja, juntamente do robô Gort, por 200 milhões de
milhas para chegar à Terra e mandar uma mensagem a todos os seus
representantes. “Se continuarem constituindo uma ameaça a outros
planetas, todo o planeta deve ser exterminado! “Klaatu barada nikto é a frase antológica. Uma mensagem salvadora da nossa humanidade.
Em 1951, a preocupação dos senhores poderosos era correr contra o
tempo. Vencer a concorrência armamentista contra o fantasma do
comunismo. Igualdade, baby, nunca foi a vontade desses senhores. Pelo
contrário, o medo prevaleceu. O dia que a terra parou é sobre o medo
de a terra ser julgada por um deus alienígena e transcendental.
Após 57 anos, a nossa sociedade não perdeu o medo. A ameaça não é mais
a bipolaridade. Vivemos o tempo das multipolaridades, pois a vida
social é como uma distribuição mutante, um fluxo de crenças e desejos.
Podemos usar algumas metáforas para constituir aquilo que chamamos de
redes de crenças e desejos. Gabriel Tarde [1] nos apresenta o fenômeno das
mônadas – partículas elementares, substâncias
simples de que os compostos são feitos. Elas são, portanto,
diferenciadas e diferenciantes. A idéia da monadologia revela que
“toda coisa é uma sociedade e todo fenômeno é um fato social”. A
imagem das mônadas abertas e em permanente interação desembocaria,
portanto, em um “ponto de vista sociológico universal”. A mônada é o
infinitesimal finito.
A idéia da monadologia também nos leva a pensar nesse fluxo de
crenças e desejos. Numa sociedade mediada pela web, esse fluxo de
vontades tem como protagonista o sujeito. O ator em rede, para usar um
termo de Latour [2]. Esse ator se toca no mundo virtual por diferentes e
múltiplas interfaces. Para cada um de nós, navegar na rede aparece
como uma experiência singular. Ou, como as vozes das redes dizem,
“cada um é cada um”.
Creio que vivemos numa sociedade do ’infinito do mundo inteiro’. Um
espaço informacional que tende a crescer ao infinito. Teoricamente,
não existe limite para o crescimento do fluxo de informação na web.
Mas essa informação cresce numa lógica de rede distribuída. David de
Ugarte [3] diz: “uma rede distribuída é a que se você elimina algum dos nós
ela continua a pulsar”. Podemos pensar isso em termos políticos,
energéticos, culturais e muitos outros. O que temos de ter em mente é
que a fórmula da rede social que liberta e se desenvolve de forma
equilibrada é naturalmente distribuída. Natural como uma mônada.
As redes distribuídas comportam-se de acordo com o conceito da cauda
longa. Afinal, um infinitesimal finito nos revela as múltiplas
possibilidades que a rede nos apresenta. As multipolaridades tornam-se
uma opção de vida.
O ponto de partida é o medo. O medo da diferença. O medo do contato.
Todos os homens tiveram essa experiência de tentar não tocar os
outros, pelo fato de que é desagradável ser empurrado por estranhos.
Apesar de todas as preocupações, o homem nunca perde completamente o
medo do contato. Na web o contato se torna digitalizado. O contato em
múltiplas plataformas, em diversos platôs. O contato com os estranhos
é algo do cotidiano. A ameaça torna-se imanente. De dentro para
dentro. Klaatu não é mais um alienígena. Ele é parte do imaginário
coletivo. Klaatu não nos deixa mais parar!!! Não temos tempo para
isso.
Mais:
Hernani Dimantas assina, no Caderno Brasil, a coluna Sociedade em Rede. Edições anteriores:
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