O que queremos de um bom governo municipial
Para a imensa maioria dos novos governantes que serão eleitos, podemos dizer que este é um mundo quase desconhecido. Não só poucos conhecem tais avanços nas políticas públicas, mas um número ainda menor sabe como implementar estas iniciativas.
Neste ano teremos eleições municipais. Serão eleitos 5.562 novos prefeitos e 56 mil vereadores. Ainda que uma parte deles seja reeleita, de toda maneira teremos quase 400 mil candidatos e candidatas a cargos eletivos municipais em todo o Brasil.
Em 2004 o TSE registrou 346.419 candidatos a vereadores e 15.385 candidatos a prefeitos. Se assumirmos que, para este ano, os números serão similares e em cada campanha tivermos um mínimo de 5 pessoas mobilizadas, trabalhando pela candidatura, serão 2 milhões de pessoas diretamente envolvidas. Toda essa gente, especialmente a partir de julho, vai se dedicar a sensibilizar a opinião pública em torno da agenda das eleições, vai buscar votos para os seus candidatos.
O perfil dos vereadores eleitos em 2004 identifica que 36% deles são pessoas despreparadas, com baixa escolaridade, sem nenhuma experiência anterior com cargos eletivos. Este é um bom sinal da democratização do acesso às candidaturas, mas, por outro lado, é preocupante que pessoas tão pouco preparadas assumam cargos públicos com a relevância dos que estão em questão nestas eleições.
Nestes últimos 20 anos, o Brasil viveu uma nova fase democrática, tendo como ponto de partida os direitos afirmados na Constituição de 1988. A combinação da ação dos movimentos sociais com a eleição de lideranças populares para cargos de prefeitos e vereadores permitiu, em várias importantes municipalidades, a formulação de novas políticas e novas formas de gestão pública, que se orientaram para a redução das desigualdades sociais, o combate à pobreza e a inclusão de setores sociais marginalizados. Era a então chamada “política de inversão de prioridades”.
Iniciativas no campo da segurança alimentar, da moradia popular, dos transportes públicos, do manejo dos resíduos sólidos e da reciclagem, da saúde, da educação, da cultura, da preservação do meio ambiente, e, principalmente da descentralização e da participação cidadã na gestão pública, foram destaques nestes processos. Até hoje o Orçamento Participativo é das iniciativas mais emblemáticas deste impulso criador nas políticas públicas.
A melhoria da qualidade de vida nas cidades, a democratização da gestão pública, a transparência nas informações, as estratégias de descentralização e participação cidadã nas decisões que afetam a vida de todos, o controle social, tudo isso é um patrimônio democrático conquistado a duras penas, e seu aproveitamento vai depender, em grande parte, destes novos eleitos.
Lamentavelmente é muito precário o registro destas iniciativas inovadoras e muitas delas são pouco conhecidas. Para a imensa maioria dos novos governantes que serão eleitos, podemos dizer que este é um mundo quase desconhecido. Não só poucos conhecem tais avanços nas políticas públicas, mas um número ainda menor sabe como implementar estas iniciativas.
Consideramos uma importante contribuição para o avanço da democracia, para a valorização das Câmaras Municipais, para apoiar o Executivo municipal em suas ações em prol do desenvolvimento local, a divulgação e o debate do que nos ensinam estas experiências, tanto em termos de gestão pública como em relação a políticas específicas.
As campanhas eleitorais precisam ganhar qualidade, debater políticas, mobilizar a cidadania para que ela venha a avaliar e escolher alternativas para vivermos em cidades mais acolhedoras e solidárias. O momento das eleições é privilegiado para levantarmos estes temas.
Trazer para as páginas de Le Monde Diplomatique Brasil o debate sobre o que esperamos de um bom governo municipal; sobre como evoluem as relações entre os governos municipais, estaduais e federal; sobre as políticas públicas; sobre o lugar que ocupa a sociedade civil nestas relações; é parte da qualidade do jornalismo que defendemos.
Por esta razão, convidamos a Confederação Nacional dos Municípios a trazer sua contribuição nesta edição. Na próxima edição, teremos a contribuição da Frente Nacional de Prefeitos. A estas duas associações pedimos que discorressem sobre o que querem de um bom prefeito. E o debate continua nas próximas edições, dentro da visão plural e democrática que defendemos.
*Silvio Caccia Bava é diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil.