Os mapuche resistem outra vez
Após um século de derrota e aculturamento, ressurgem, entre os povos indígenas do Chile, a busca da identidade e a luta por terras e direitosAlain Devalpo
A noite vai cobrir as colinas da comunidade de Chekenko, pontilhadas de pinheiros e de eucaliptos a perder de vista. O frio aperta e fogueiras já foram acesas. A machi (xamã) que repousa em seu abrigo, pega seu kultrun [1]. Está começando o guillatun, cerimônia tradicional do povo mapuche. Um guillatun específico que, no dia 6 de novembro de 2005, honrou a memória de Alex Lemun, um indígena de 17 anos de idade, morto em 2002 por um carabinero (policial). A convite de sua família, alguns vieram da capital, Santiago, que fica 700 km mais ao norte. Outros se arriscaram a deixar a clandestinidade. Uns dez dirigentes de comunidades vizinhas não compareceram por motivo justo: cumprem penas de até 10 anos na cadeia.
As almas se agrupam em torno do réwé que reina no meio do campo: um tronco de árvore esculpido em forma de escada aponta para a abóbada celeste. Elas saúdam os quatro pontos cardeais e em seguida iniciam um purun, um tipo de dança circular. Comandado pela machi, o canto do povo mapuche se eleva para os espíritos. Um canto que as autoridades chilenas querem silenciar…
Comandado pela machi, o canto do povo mapuche se eleva para os espíritos. Um canto que as autoridades chilenas querem silenciar…
“Quinze anos depois da ditadura, nosso país, cuja democracia é apresentada como exemplar, não tem um quadro jurídico adequado para proteger os povos indígenas”, denuncia o Observatório [chileno] de Direitos dos Povos Indígenas [Observatorio de Derechos de los Pueblos Indígenas – ODPI] [2]. A Constituição não reconhece o aspecto pluriétnico desse país, que continua um dos raros do continente que não ratificou o tratado internacional sobre os direitos dos povos indígenas – a convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
“Mapu-che”, as “pessoas da terra”
Oito povos autóctones residem no território chileno [3]. Um estudo controverso, que data do ano 2000, calcula a presença indígena em 700 mil pessoas (4,5% dos 15 milhões de habitantes) [4], das quais 85% são “pessoas da terra”, tradução literal de “mapu-che”; uma importante minoria cujo habitat tradicional está situado ao sul do rio Bio-bio [5], uma região que os conquistadores batizaram Araucanie quando lá chegaram.
Apesar de uma resistência selvagem aos espanhóis e depois ao Estado chileno, os mapuche se renderam em 1883, após a “Guerra de Pacificação”. De acordo com os títulos de propriedade que lhes foram entregues – os titulos de merced -, seu território foi reduzido a 500 mil hectares (anteriormente, possuíam 10 milhões). Paralelamente, o poder de Santiago, cujo lema se tornou (e continua) “Pela razão ou pela força”, desloca colonos. “Meus ancestrais chegaram aqui em 1906, convidados pelo governo, que lhes deu terra, 200 tábuas, uma caixa de pregos e um boi e uma vaca”, conta Jorge Luchsinger [6]. De ascendência alemã, Luchsinger é hoje o proprietário mais rico da IX região [7].
Os mapuche atravessaram o século XX na sombra. Confinados e empobrecidos, deixaram de ser um povo autônomo, independente e soberano para se tornarem uma minoria étnica oprimida. Houve uma melhora momentânea no início dos anos 1970 com a reforma agrária instaurada pela Unidade Popular de Salvador Allende. Mas a ditadura do general Pinochet (1973-1989) reativou a “loucura assimiladora”. Ganhando o apoio de alguns lonkos (dirigentes mapuche), Pinochet instaurou uma política de assistência, favorecendo ao mesmo tempo uma nova invasão, a das empresas florestais.
“Foi nessa época que o senhor Pino se instalou”, lembra-se Elvira, que vive na comunidade de Pascual Coña, nas margens do lago Lleu-lleu, no sul da cidade de Cañete. “Esse winka [8] veio dos Estados Unidos, conhecia as técnicas modernas e sabia como agir para abusar das pessoas. Ele se apropriou de 70 dos 120 hectares definidos por nossos títulos de propriedade e impôs um sistema feudal.” Diante do área tomada pelo grileiro e com uma média de 3 a 5 hectares por domicílio, a comunidade não conseguiu mais resistir. “Eu tinha apenas dois bois, um porco e alguns carneiros. As famílias cresceram e a área a ser dividida era menor do que as folhas de nossos títulos de propriedade.”
Apesar de uma resistência selvagem, os mapuche se renderam em 1883. Seu território foi reduzido de 10 milhões para a 500 mil hectares. E o Estado mandou os colonos
A invasão das empresas “florestais”
Com a volta da democracia, a esperança que renasceu nas comunidades rapidamente deu lugar a um sentimento de traição. Uma lei indígena foi ratificada em outubro de 1993 por parlamentares, muitos dos quais tinham interesses fundiários. Ela criou a Corporação Nacional de Desenvolvimento Indígena (Conadi). “O principal entrave à ação da Conadi foi a falta de meios financeiros”, garante um membro da nova equipe, que chegou ao comando logo após diversos escândalos que atingiram a instituição. “Somente 375 mil hectares foram regularizados junto aos mapuche. São sempre terras de má qualidade”. Pesquisador da área de antropologia na École des hautes études en sciences sociales [Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais] de Paris, Fabien Le Bonniec analisa: “A Conadi revelou-se uma instância burocrática de reprodução, de dominação e, às vezes, até mesmo de negação da cultura mapuche pelo Estado e seus agentes”.
Durante esse tempo, a atividade florestal galopa, 60% controlada pelas famílias Matte e Angelini, duas das mais poderosas do país. Os Matte possuem duas vezes mais terras que o conjuntos das comunidades. A rica floresta tradicional cantada pelo poeta Pablo Neruda, originário da região, dá lugar à monotonia das plantações intensivas de pinheiros e de eucaliptos destinadas à fabricação de celulose para exportação, principalmente para o Japão. Ocupam 2,1 milhões de hectares e, para 2006, as previsões são de 2,6 milhões. “Não há pior vizinhança do que as [empresas] florestais”, manifesta Aniceto Lorin, um lonko aprisionado na cidade de Traïguen. Os poços de água secaram, o ar foi poluído, os animais caíram doentes”.
Novas formas de resistência
Muitos migram para os cinturões de miséria das cidades de Temuco, de Concepcion, mas sobretudo de Santiago. Atualmente, a maioria dos mapuche são urbanos. Nesse ambiente, as mulheres não podem mais sonhar a não ser com um lugar doméstico. Os homens, desde que “chilenizem” seu nome conseguem um emprego subqualificado. “A discriminação foi institucionalizada” constata Ariane Chenard, uma socióloga canadense em Santiago. “A geração dos avós teve de esconder sua identidade para se integrar. Mas entre os jovens, como reação à segregação cotidiana, produz-se um sonho. Alguns reconciliam com suas raízes.”
É o caso de Simon, 25 anos de idade, membro da organização não-governamental Meli Wixan Mapu, que vive no bairro Cerro Navia, em Santigo. “Sou mapuche desde … dez anos de idade. Adoro a cidade, não tenho a intenção de morar na zona rural. É um pouco contraditório, mas ao reivindicar a cultura de meus ancestrais e denunciar a situação das comunidades, eu me sinto mapuche”, conta ele.
A rica floresta tradicional cantada por Neruda dá lugar à monotonia das plantações intensivas de pinheiros e de eucaliptos destinadas à fabricação de celulose para exportação
A hora da reconquista soou no início dos anos 1990. Volta às margens do lago Lleu-lleu, onde se esconde José. Aos 35 anos, esse pai de duas meninas vive na clandestinidade, protegido pelas comunidades por onde passa. “Eu me juntei à luta há dez anos. Tornei-me um werken, um mensageiro da Coordenação Malauco Arauco [criada em 1998]. Em resposta à surdez das autoridades, passamos da reclamação para a ação e retomamos terras das quais possuímos os títulos de propriedade.” José e seus companheiros estão na mira da justiça. No primeiro momento, a associação foi considerada “ilícita”, e depois… “terrorista”, após os atentados do dia 11 de setembro de 2001.
A poucos quilômetros das praias do Pacífico, as margens do lago Lleu-lleu são objeto de cobiças múltiplas. Um empresário deseja construir ali um complexo turístico, um minério raro acaba de ser descoberto no local e a abertura de uma mina está em estudo. Enfim, a empresa florestal Mininco S.A., que se apóia em uma rede clientelista e é muito influente na região, não cessa de se expandir nos territórios dos quais os mapuche possuem os títulos — sem seu aval e sem indenização.
Situação semelhante na comunidade de Temulemu, imprensada entre a Mininco e as terras de Juan A. Figueroa, ex-ministro do Estado e atual membro do Tribunal Constitucional. Em 1994, eclodiu um conflito envolvendo 50 hectares de terras, que levou dois lonkos, Pascual Pichun e Aniceto Lorin, à prisão preventiva durante mais de um ano. A qualificação de “terrorista” permite ao procurador citar testemunhas anônimas, dificultando a defesa dos acusados. No entanto, diante da ausência de provas, Pichun e Lorin foram considerados inocentes.
Prisões, testemunhas secretas, espionagem
O veredicto não agradou a Figueroa, que usou seu cargo para impetrar um segundo processo. Os lonkos foram então punidos com 5 anos de prisão e um dia por terem escrito uma carta de ameaça, o que sempre negaram. “A repressão tem um alvo determinado e pagamos caro por sermos dirigentes de comunidades revoltadas”, revela Pichun, ao lado de seu filho Rafael, também preso.
Após o 11 de setembro, o governo qualifica a luta pela reconquista das terras de “terrorista”. Isso permite ao procurador citar testemunhas anônimas, dificultando a defesa dos acusados
Desde 1997, 400 pessoas foram perseguidas. “Faz dois anos que meu marido se esconde, chora Rosa, desamparada em sua cabana de tábuas mal ajustadas, com suas duas crianças. A justi… (ela se corrigiu), a injustiça chilena o acusa de terrorismo. Acredito que para ser acusado dessa maneira, ele precisaria ter colocado bombas e matado pessoas.” Para essas famílias, além de tudo perseguidas pelas forças da ordem, a prisão ou a clandestinidade de um parente significam braços que faltam nos trabalhos da fazenda e uma miséria ainda mais penosa. A comunidade que perde sua machi ou seu lonko também é derrotada.
Se os lonkos de Traïguen, ambos cinqüentões, ficam indignados de serem qualificados de “terroristas”, seu discurso é menos radical que no presídio de alta segurança de Angol, onde Patricia Troncoso, Jaime e Patricio Marileo e Juan-Carlos Huenlao cumprem uma pena de 10 anos e 1 dia por “incêndio terrorista”. É uma questão de geração, para Patricia, apelidada “La Chepa”, 36 anos de idade, ex-estudante de teologia, cujos avós emigraram para Santiago e que voltou a viver nas comunidades no final dos anos 1990: “Esse combate é político. O que está em jogo é a existência ou o desaparecimento do povo mapuche.” Com seus companheiros, ela reivindica o status de prisioneira política.
“No Chile, não há mais prisioneiro político, martela Ernesto Barros, em um escritório de La Moneda, o palácio presidencial onde Salvador Allende foi assassinado em 1973. A lei antiterrorista promulgada em 1984 [por Pinochet] foi revista duas vezes, em 1991 e em 1997, por um Parlamento eleito democraticamente. Sua utilização é legítima diante de pessoas que utilizam o terror”, argumenta esse funcionário do Ministério do Interior.
O advogado Pablo Ortegua não compartilha dessa opinião. “Sua motivação é o reconhecimento de direitos territoriais e culturais. Eles se opõem pacificamente a um processo de marginalização e a um governo que admite sua vontade de assimilação forçada. Esse objetivo é bem político”. Uma tomada de posição pela qual o advogado paga caro, pois vê sua carreira arruinada por uma campanha falaciosa da imprensa e tem o telefone sob escuta. Seu caso não é o único. Myriam Reys Garcia, que defende La Chepa e seus companheiros, acaba de ser acusada de ter enviado à imprensa um documento confidencial. Para o ODPI, trata-se “de um ato de perseguição contra uma advogada que defende o respeito aos direitos da comunidade mapuche”.
“Esse combate é político. O que está em jogo é a existência ou o desaparecimento do povo mapuche”, diz La Chepa, condenada a dez anos e que reivindica status de prisioneira política
Sem acesso a representação política
“Instituímos a lei indígena”, retruca Barros. “Se os mapuche têm reivindicações, que as façam no plano político …” Um terreno que tentam ocupar, mas em vão. Prova disso foi a tentativa de Aucaun Huilcaman de participar da corrida à legislatura suprema. Com 40 anos de idade, esse membro do Conselho de Todas as Terras [Consejo de Todas las Tierras], uma das organizações mapuche mais importantes, quis aproveitar a última campanha presidencial para tirar da sombra as reivindicações indígenas. No primeiro momento, a mídia se interessou pelo aspecto folclórico de sua candidatura (sua chegada a cavalo em Santiago foi tema da primeira página de diversos jornais), mas muito rapidamente se esqueceu de explicar as razões de sua cassação.
“Como candidato independente, Huilcaman deveria reunir 36 mil assinaturas”, especifica Lautaro Loncon, que participou da campanha. “Cada uma deveria ser reconhecida em cartório.” O custo calculado para essa validação – 180 mil milhões de pesos (cerca de 741 mil reais) – era uma soma impossível de ser reunida pelo Conselho. E mais, “a maioria dos tabeliões se recusou a colaborar. Alguns demandaram que o pagamento fosse feito antecipadamente, outros impuseram restrições de horários. Em Santiago, de 16 tabeliões contatados, 2 aceitaram, e das 39 mil assinaturas recolhidas, apenas 3.600 puderam ser reconhecidas. Conseqüentemente, o veto da comissão eleitoral.
Uma vez perdida a primeira batalha, Huicaman contra-ataca. “Houve um precedente em 1992”, prossegue Loncon. “Após um erro, os candidatos da democracia cristã ficaram em posição de cassação. Em nome da democracia, um procedimento de emergência no Parlamento permitiu validar as candidaturas. Demandamos aos partidos políticos que dessem um voto semelhante”. No contexto pré-eleitoral, a idéia foi longe. No entanto, no final, “a lei votada deu menos de 15 dias para validar a candidatura, o que não tinha nada a ver com nossa demanda: a possibilidade de que Aucaum fosse candidato sem cumprir uma requisição anacrônica, pois há outras maneiras de reconhecer assinaturas que não precisam de um tabelião”. A candidatura foi enterrada em um silêncio estarrecedor da mídia.
“No Chile, nenhum indígena tem cadeira no Parlamento ou no Senado”, diz, ofendido Alfredo Millabur. Contamos com uma centena de conselheiros municipais e sete prefeitos mapuche”. Ele próprio foi eleito em 1996 e reeleito posteriormente para a direção do povoado costeiro de Tirua. Millabur é lafkenche, termo que designa os mapuche instalados nas margens do Pacífico. Ele divide seu tempo entre sua comunidade e o Movimento de Identidade Lafkenche [Movimiento Identidad Lafkenche], um ator que tenta inverter “a relação de subordinação e obter um controle político e econômico de nosso território. Um prefeito mapuche deve administrar sua comunidade sem se esquecer da luta de seu povo”.
Millabur tenta obter controle político e econômico sobre o território: “Um prefeito mapuche deve administrar sua comunidade sem se esquecer da luta de seu povo”
A difícil busca dos direitos
“Diante da mobilização, os dois últimos governos misturaram uma política repressiva e uma política de assistência a algumas comunidades, para sufocar o movimento. Abriram um diálogo com atores locais, de acordo com suas próprias regras, que recusam instaurar a negociação com os órgãos de representação mapuche”, comenta Millabur, além disso irado diante da privatização crescente dos espaços marinhos por empresas de pesca e de criação de salmão. “Para garantir nosso acesso ao mar, escrevemos um projeto de lei. É a primeira iniciativa desse tipo por parte dos mapuche. Queremos conversar e convencer…”
Foram necessários quatro anos aos lafkenches, assessorados por advogados, para colocar no papel suas reivindicações. Um intenso lobbying, uma verve de qualidade, a solidariedade das comunidades das VIII, IX e X regiões, e um contexto pré-eleitoral favorável permitiram que o projeto fosse submetido ao voto dos deputados em 17 de novembro de 2005. Na ocasião, 200 membros do movimento percorreram mil quilômetros de modo a estar presentes em Valparaiso, sede do Parlamento. Vitória! A lei foi votada. Tristeza! Poucos segundos depois, duas emendas feitas apressadamente descaracterizaram o projeto, enquanto os representantes do povo tinham jurado não tocar em uma palavra do texto da lei.
O desprezo do mundo político chileno é ilustrado, enfim, pela ausência da temática mapuche no último debate eleitoral. O ODPI questionou cada candidato sobre seus projetos relativos aos índios. Somente Joaquín Lavin (eliminado no primeiro turno) concordou em responder brevemente ao questionário. Nem Michelle Bachelet, pela Concertación Democrática, nem Sebastião Piñera, pela direita liberal, presentes no segundo turno, se esforçaram para isso.
Para La Chepa, a questão é outra: “Os mapuche poderão manifestar mil vezes, trata-se de uma causa perdida. Além de palavras, ações!”. Os resultados obtidos durante a retomada das terras à força lhe dá razão. Para Pascual Coña, nos pastos reabertos, os animais se alimentam no meio de ruínas de duas fazendas do antigo proprietário. Hoje, com 8 vacas, 8 porcos, 10 galinhas e 20 carneiros, Elvira sente-se mais tranqüila. “Quando vejo a sorte dos peñis [9] finalmente melhorar, não me arrependo de nada”, diz José, que garante que, no total, foram recuperados 320 hectares.
Ao reivindicar direitos, os mapuche ameaçam uma economia que se baseia numa exploração desenfreada de recursos naturais: madeira, mineração e salmão
“O movimento mapuche se distinguiu como um dos raros atores políticos que denunciam os problemas de democracia e cidadania que persistem no Chile atualmente”, salienta Fabien Le Bonniec. Bem, por que democratas como Ricardo Lagos criminalizam essas reivindicações? É que, enfatizam inúmeros interlocutores, “o mundo político é prisioneiro de um sistema econômico estabelecido durante a ditadura”. Admitindo desrespeitar os direitos indígenas, o governo do “socialismo pragmático”, que se orgulha de ser um modelo, não quer mexer em índices de crescimento que andam bem.
As exportações de madeira representam, depois do cobre, a segunda fonte de renda do país. Ao reivindicar direitos, os mapuche “impedem que eles invistam no que querem”. Ameaçam uma economia que se baseia numa exploração desenfreada de recursos naturais: madeira, mineração e salmão [10](o Chile está prestes a se tornar o primeiro produtor mundial de criação de salmão).
Quem são os “terroristas”
Se os “terroristas” mapuche ainda não mataram ninguém, a recíproca não é verdadeira. Mas “o policial que matou meu filho foi absolvido pela justiça militar. É eternamente carabinero”, denuncia a sra. Lemun, antes de se retirar, terminado o guillatun. Impunidade? Não só! O general Jose Bernales comandava a polícia da IX região na época do drama. No início de novembro, o presidente Lagos o nomeou para comandar a polícia chilena.
Isso contrasta com a situação dos prisioneiros mapuche que não têm a menor clemência a esperar do rolo compressor judicial. Em Traïguen, os lonkos, depois de cumprirem mais da metade da pena, teoricamente podem se beneficiar de atenuantes: redução de pena ou possibilidade de sair aos domingos. “Todas as nossas demandas foram negadas”, lamenta Pichun. Em Angol, apesar de tudo, tenta-se pensar no futuro. “Dez anos de prisão: isso me dá medo. Perco qualquer esperança de ter um filho. É a força de lutar pelo respeito aos direitos humanos que me ajuda”, revela La Chepa.
Sob pressão das organizações internacionais de defesa dos direitos humanos, as autoridades chilenas modificaram seu modo de agir sem perder de vista seu objetivo. “O termo terrorista foi substituído pelo de delinqüente comum”, salienta Fabien Le Bonniec. “Negando sua luta política, a justiça os considera delinqüentes que atacam a prop
Alain Devalpo é jornalista e autor de Viagem ao país dos Mapuches (Voyage au Pays des Mapuches), Cartouche, Paris, 2007.