No país do triunfo do individualismo sobre a coletividade
Ainda que aparentemente apartadas e distintas entre si, as recentes medidas aprovadas e em tramitação no Congresso Nacional têm um só direcionamento: rebaixar a democracia e aumentar o fisiologismo e a centralização do poder político
Tornou-se recorrente, nos períodos que antecedem ao recesso parlamentar, surpresas desagradáveis vindas do Congresso Nacional. Desta vez, acompanhamos a escalada do fundo eleitoral, que saltou para R$ 5,7 bilhões, enquanto, ironicamente, os neoliberais bradam aos quatro ventos as dificuldades fiscais do país
Paralelamente, segue o discurso falacioso de que os gastos com o serviço público são a fonte da crise econômica que o Brasil atravessa. Mas essa “culpa” começa a ser desmascarada.
Não é aceitável, porque escandaloso, que a esfera pública seja maculada por políticos e grupos mal-intencionados.
Assim que retomarem os trabalhos, políticos com mandato público propagarão em suas redes sociais as velhas falas sobre como a reforma administrativa tornará o país melhor – uma mentira que é desnudada dia após dia. Ao contrário, a PEC 32/2020, derrubada a muralha da falaciosa narrativa oficial da modernização administrativa, expõe o amplo terreno movediço onde viceja a política clientelista.
Não é possível promover um serviço público forte, efetivo e com atendimento pleno sem uma estrutura consistente e protegida de ingerências estranhas ao interesse público. Da mesma forma, o excesso de verba para as eleições aumenta a margem para manobras espúrias na utilização dos recursos bancados pelos contribuintes.
A somatória entre recursos excessivos para as eleições, cerca de 1 milhão de cargos comissionados para livre nomeação, servidores sem estabilidade e formas de contratação frágeis, será trágica para o país.
Ainda que aparentemente apartadas e distintas entre si, as recentes medidas aprovadas e em tramitação no Congresso Nacional têm um só direcionamento: rebaixar a democracia e aumentar o fisiologismo e a centralização do poder político.
O Brasil precisa avançar na direção radicalmente oposta à que está sendo empurrada pelo governo federal de plantão e sua base de apoio parlamentar. Precisamos de medidas direcionadas ao auxílio dos mais pobres, garantia de comida no prato, empregos, serviços públicos de qualidade e tributação progressiva sobre os super-ricos.
A Constituição de 1988 traz ótimas diretrizes para a consolidação brasileira como potência, mas ainda é necessário estruturar parte do texto que versa sobre as políticas sociais e as camadas mais ricas.
Não podemos continuar com o estigma brasileiro de só fazer lei para beneficiar pequenos grupos de políticos fisiológicos e de endinheirados. O maior grupo precisa ser priorizado – com políticas de assistência, serviços públicos de qualidade e tributação justa e solidária.
Charles Alcantara é presidente da Federação Nacional do Fisco Estadual e Distrital (Fenafisco).