Precisamos curar o Brasil
Desde a posse de Bolsonaro, a destruição da floresta amazônica ganhou novo impulso. Entre 2018 e 2019, as taxas de desmatamento e queimadas aumentaram mais de 30%. Somados aos desmatamentos de 2020, o total de área passível de queimadas no ano poderá ser superior a 9 mil km²
A atuação do governo brasileiro tem sido absolutamente desastrosa em muitas áreas, mas nada se compara aos resultados produzidos nos dois grandes desafios que enfrentamos nesse começo de século: o combate à pandemia de Covid-19 e a destruição da floresta amazônica.
O vírus Sars-Cov-2 espalha-se livremente pelo país, atingindo mais de 1, 6 milhão de pessoas, deixando um legado de terra arrasada com a perda de mais de 70 mil vidas, famílias traumatizadas, desemprego recorde, explosão da pobreza e fim de milhares de empresas e pequenos negócios.
Em meio a tudo isso, o presidente Bolsonaro ataca a Organização Mundial de Saúde e despreza as contribuições da comunidade científica. Além disso, ele insiste em manter o Ministério da Saúde acéfalo. O órgão está há quase 60 dias sem ministro e foi ocupado por pessoas sem a devida experiência em políticas de saúde pública, em substituição aos especialistas que foram afastados.
Essa mesma mentalidade obscurantista também está produzindo uma tragédia na Amazônia. Desde sua posse, a destruição da floresta amazônica ganhou novo impulso. Entre 2018 e 2019, as taxas de desmatamento e queimadas aumentaram mais de 30%.

2020
As projeções para 2020 são ainda piores. Observou-se uma elevação de 55%, no período que vai de agosto de 2019 a junho de 2020, na comparação com igual período anterior. Para agravar ainda mais essa situação, o Instituto de Pesquisas da Amazônia (Ipam) estima que existam cerca de 4.500 km² de florestas derrubadas em 2019 aptos a serem queimados neste ano. Somados aos desmatamentos de 2020, o total de área passível de queimadas no ano poderá ser superior a 9 mil km².
Contribuem para esse resultado, o discurso de Bolsonaro contrário aos movimentos ambientalistas e em defesa da expansão desregrada de atividades econômicas de alto impacto como o garimpo, a exploração madeireira e a agropecuária, e sua política de desmonte da governança socioambiental do país, a qual vem ocorrendo desde seu primeiro mês do governo.
A destruição das florestas e as queimadas estão modificando o clima regional, tornando-o mais quente e seco. Essa situação aumenta exponencialmente os riscos de incêndios e torna o ambiente amazônico insalubre e muito perigoso para a população.
As fumaças produzidas pelas queimadas em 2019, elevaram os índices de poluição nos municípios em 53%, em média, em relação a 2018. Como estamos começando a temporada das queimadas na Amazônia, que costuma ocorrer durante a estação seca que, normalmente, vai de julho a início de outubro, especialistas em saúde pública têm alertado as autoridades para os efeitos da combinação da contaminação do ar pela fumaça e a disseminação da pandemia. Teme-se uma grande elevação do número de óbitos decorrentes não só da doença, mas de seu agravamento pela combinação com os problemas respiratórios decorrentes das queimadas, assim como do próprio colapso do precário sistema de saúde da região.
Esses riscos têm sido expostos por diversos estudos científicos, como o da Escola de Saúde Pública da Universidade Harvard, no qual se concluiu que a poluição do ar pode causar elevação significativa de até 15% na taxa de mortalidade por Covid 19.
A situação é tão desastrosa que algumas das maiores empresas em atuação no Brasil, como Ambev, Bradesco, Cosan, Itaú, Klabin, Natura, Santander, Shell e Suzano, se reuniram com o vice-presidente Mourão e pediram providências para o fim do desmatamento no Brasil.
Atuação do legislativo
No caso da proteção da Amazônia, o Brasil é detentor da mais eficiente tecnologia de controle do desmatamento e queimadas em florestas tropicais do mundo. Conta com significativo número de servidores públicos lotados em instituições estatais especializadas como o Ibama e ICMBio. Dispõe ainda de respeitada comunidade científica e uma robusta rede de entidades ambientalistas que geram estudos científicos, projetos pilotos e proposições de políticas públicas de altíssima qualidade.
Nosso mandato reuniu contribuições de cientistas e especialistas de vários campos, bem como representantes de movimentos sociais e apresentamos duas importantes iniciativas legislativas. O Projeto de Lei n° 6230 de 2019 que torna obrigatória a adoção de planos de prevenção e controle dos desmatamentos não só para a Amazônia, mas também para todos os demais biomas do país. Sendo aprovado, o Brasil passaria a ter uma lei que combate com eficiência todas as causas da devastação e estabelece os mecanismos necessários para o desenvolvimento sustentável das regiões florestais.
Outro é o Projeto de Lei n° 2328 de 2020 que estabelece a moratória no uso do fogo na Amazônia Legal, durante a vigência do estado de calamidade pública devido à pandemia do novo coronavírus. Sua finalidade principal é a proteção da saúde da população contra os trágicos efeitos advindos da combinação da poluição provocada pela fumaça das queimadas e a ocorrência da Covid-19.
Acredito que precisamos agir com urgência e evitar mais perdas. A sociedade brasileira e nossas instituições públicas sabem o quê e como fazer. Precisamos vencer a incompetência, autoritarismo e obscurantismo que infecta o Estado Brasileiro e compromete a vida de todos e a saúde do planeta.
Randolfe Rodrigues é senador da República (Rede/AP). É professor, graduado em história, bacharel em Direito e mestre em políticas públicas.