A importância das salas de cinemas em territórios periféricos
Não podemos falar sobre desenvolvimento sem pensarmos em cultura, acesso e inclusão. O setor do audiovisual é um importante vetor de transformação social, mas isso só será possível quando todos puderem usufruir das maravilhas da sétima arte
Quando pensamos em desenvolvimento de um país, não podemos deixar de fora a discussão do acesso à cultura. No Brasil, por exemplo, muitas pessoas sequer entraram em uma sala de cinema na vida, seja pela falta de lugares para assistir ou porque não têm condições financeiras para ver um filme de grande prestígio da indústria cinematográfica. É o que acontece também em muitos territórios periféricos nos grandes centros urbanos, como no eixo Rio-São Paulo, sem falar da dificuldade de acesso em regiões onde sequer essas salas existem.
Mesmo com 32% das salas de cinema concentradas em São Paulo, segundo dados de 2021 da Agência Nacional de Cinema (Ancine), não podemos esquecer que a acessibilidade e a inclusão, na prática, são bem diferentes. Muitos fatores contribuem para que os moradores de regiões periféricas não consigam ter acesso: ingressos caros, cinemas localizados dentro de grandes shoppings em regiões centrais e mais elitizadas, são alguns deles.
Como pensar em alternativas viáveis para mudar esse cenário? O mais importante é entender que, se essas pessoas não conseguem se deslocar até o cinema, é preciso pensar em estratégias para levar o cinema até elas. Políticas públicas nesse sentido são fundamentais, até mesmo para fomentar o debate sobre justiça audiovisual em territórios periféricos.
Estrategicamente, é preciso entender a disposição dos equipamentos culturais nas regiões periféricas e como o acesso pode ser viabilizado de forma gratuita. Pensar em transformação social passa, intrinsecamente, pelo debate do acesso aos equipamentos culturais públicos. Para além disso, é preciso entender também que, em territórios periféricos, as dificuldades somam-se para muito além da renda. Não podemos deixar de fora também a pauta da inclusão de pessoas com deficiência, por exemplo.
Quando falamos que existem diversos brasis dentro de um mesmo Brasil, precisamos olhar para as múltiplas desigualdades presentes nele. Ora, um estudo do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) divulgado este ano mostra que o Brasil figura entre os 10 países que tiveram o maior faturamento no mercado de vídeo por demanda em 2023. Mas, se pararmos para analisar, qual é a população que consegue pagar uma assinatura mensal de streaming em plataformas cobrando planos que podem chegar a mais de R$500 ao ano? Olhando o Brasil bem de perto, há pessoas que mal conseguem botar comida na mesa todos os dias.
Entender que as desigualdades sociais no Brasil têm raízes profundas ainda é uma discussão urgente. Não podemos falar sobre desenvolvimento sem pensarmos em cultura, acesso e inclusão. O setor do audiovisual é um importante vetor de transformação social, mas isso só será possível quando todos puderem usufruir das maravilhas da sétima arte.
Emiliano Zapata é natural de São Miguel, Zona Leste de São Paulo. Diretor de inovação e políticas audiovisuais na Spcine, o comunicólogo e cineasta é apaixonado por semiótica e busca inovação com justiça audiovisual.