Irã e Estados Unidos: o tempo do ódio terminou?
A perspectiva de um acordo sobre a questão nuclear esboça um possível aquecimento das relações entre Teerã e Washington. Sem ir até os termos da aliança na época do xá, essa reaproximação poderia redesenhar os mapas estratégicos do Oriente Médio.Trita Parsi
rã poderia se tornar uma “potência regional muito próspera” se conseguisse entrar em acordo sobre seu programa nuclear com os países do grupo dito “G5 + 1” (Estados Unidos, Rússia, China, França, Reino Unido e Alemanha), afirmou recentemente Barack Obama.1 Nunca antes o presidente norte-americano tinha dado a entender tão claramente que o objetivo das negociações sobre o armamento nuclear iraniano ultrapassava de longe a questão das centrífugas e do enriquecimento do urânio. Um retorno de Teerã à cena do Oriente Médio não transformaria apenas as relações entre os dois países; ele redesenharia fundamentalmente o mapa geopolítico da região.
O caminho em direção a um acordo sobre o programa nuclear iraniano continua cheio de ciladas. As duas partes, cujas posições estavam muito afastadas, já prolongaram os diálogos sobre isso duas vezes (ler boxe). Mas o caminho que levaria a uma renovação das relações entre os Estados Unidos e o Irã é mais longo e sinuoso ainda. O sofrimento e as humilhações que eles se infligiram mutuamente serão difíceis de superar. A lista dos erros cometidos por ambos os lados é longa demais para ser lembrada. No entanto, alguns exemplos bastam para dar uma ideia do tamanho da desconfiança e do sentimento de traição sentido pelos dois lados.
O restabelecimento do xá
É comum esquecermos que as relações começaram no melhor dos termos. Os Estados Unidos, que se libertaram do jugo de Londres ao final de uma guerra de independência, frequentemente manifestaram simpatia para com os países do Terceiro Mundo que resistiam à colonização. Às vezes as coisas iam até mesmo além disso. No caso do Irã, por exemplo, dois norte-americanos se engajaram resolutamente a favor de sua democratização e independência. O primeiro, Howard Baskerville, inclusive deu a vida por ter defendido o direito dos iranianos de terem uma Constituição.
Encabeçando um grupo de combatentes estudantis voluntários para defender a democracia constitucional nascente na Pérsia (antigo nome do Irã) contra as forças militares da dinastia Qadjar2 no poder, Baskerville foi morto em Tabriz, em 19 de abril de 1909, por um atirador numa emboscada. Ele está enterrado no cemitério cristão armênio dessa cidade situada no noroeste do Irã. Ainda hoje, muitos iranianos celebram sua memória. Diversas escolas e ruas carregam seu nome.
O outro americano foi William Morgan Shuster. Nomeado tesoureiro-geral pelo Parlamento persa, ele foi encarregado de administrar a situação financeira do país durante os anos tumultuosos da Revolução Constitucionalista (1905-1911). Ele se tornou rapidamente um defensor apaixonado de uma Pérsia que os britânicos e os russos tentavam derrubar financeiramente. Submetido por estes a uma pressão considerável, Shuster foi obrigado a se demitir. De volta aos Estados Unidos, ele contou sua experiência em The strangling of Persia (“O estrangulamento da Pérsia”). Sua condenação das ingerências russas e britânicas era contundente. Ele dedicou esse livro ao “povo da Pérsia”.
A política anticolonial de Washington, assim como o sacrifício de Baskerville e o engajamento de Shuster valeram aos Estados Unidos a alta estima de muitos iranianos. Tudo isso iria, no entanto, mudar em 1953, quando a CIA, em conjunto com os serviços de informação britânicos, expulsou do poder o primeiro-ministro democraticamente eleito, Mohamed Mossadegh, que tinha decidido nacionalizar a indústria petroleira. O golpe de Estado de 19 de agosto de 1953 restabeleceu o xá Mohammad Reza Pahlavi no trono e sufocou a democracia nascente.3 Retomando o poder, o xá intensificou a repressão de Estado a fim de eliminar qualquer ameaça potencial contra seu regime.
Para muitos iranianos, foi nesse momento que os Estados Unidos perderam a inocência. Depois de ter, num primeiro momento, represado os esforços dos britânicos para controlar o Irã e seus recursos, Washington se aliou então a essa mesma potência colonial para privar o país de seu direito à autodeterminação.
A oposição crescente ao regime foi acompanhada por um sentimento igualmente crescente de que a monarquia só se mantinha no poder graças ao apoio dos Estados Unidos e que estes últimos exerciam uma influência excessiva nos negócios internos do país. Criticavam o xá, com ou sem razão, por ter vendido a independência do Irã; e essa acusação se tornou um grito de união muito mobilizador entre os que se opunham ao seu poder. Ela encontrou um eco particularmente forte depois que o soberano iraniano assinou o Status of Forces Agreement (Sofa, Acordo sobre o Estatuto das Forças) com os Estados Unidos em 1964, que dava imunidade diplomática ao pessoal militar norte-americano no Irã. O crítico mais duro do xá, o aiatolá Ruhollah Khomeini – que iria, quinze anos depois, liderar a revolução contra o soberano –, qualificou sem meias palavras o Sofa como lei de capitulação.
Mohammad Reza Pahlavi era um homem ambicioso, que queria fazer de seu país uma superpotência regional. Para atingir esse objetivo, porém, não apenas era preciso que o Irã se apoiasse em um Exército e em uma economia fortes; também era necessário que as grandes potências se mantivessem afastadas do Oriente Médio. Em 1971, o Reino Unido decidiu retirar todas as suas forças militares estacionadas a leste de Suez. Enquanto os Estados Unidos e a Rússia não cedessem à tentação de ocupar o espaço vazio deixado pelos britânicos, o Irã podia esperar se tornar a superpotência incontestável da Ásia ocidental.
Como os norte-americanos estavam focados em sua intervenção no Vietnã, o xá aproveitou uma oportunidade de ouro. Um acordo fechado com a administração Richard Nixon fazia do Irã e da Arábia Saudita os responsáveis pela segurança no Golfo Arabo-Pérsico, permitindo aos Estados Unidos permanecer a distância. Essa política conhecida como dos “dois pilares” foi na realidade a política de um único pilar, o Irã.
Tento atingido esse objetivo essencial, Mohammad Reza Pahlavi teve como próximo objetivo garantir que nem a União Soviética nem os Estados Unidos encontrassem um pretexto para colocar novamente tropas no Golfo. Ele considerou então os Estados Unidos também, e não apenas a União Soviética, como um rival e um concorrente potencial.
Um confronto crescente
No meio dos anos 1970, dirigentes norte-americanos se queixaram em privado que as ambições do soberano iraniano escapavam a qualquer tipo de controle. No entanto, enquanto o Irã fosse um aliado sólido contra o comunismo, a megalomania do xá, mesmo que problemática, seria eclipsada pela ameaça mais séria, representada pelos soviéticos.
Quando a revolução estourou em 1978, a reserva de boa vontade com a qual Washington tinha beneficiado o Irã desapareceu completamente. Para muitos norte-americanos, a revolução era dirigida tanto contra o xá quanto contra os Estados Unidos. Quando o presidente Jimmy Carter autorizou o xá a se refugiar em território norte-americano para ser hospitalizado, estudantes de esquerda iranianos atacaram a embaixada dos Estados Unidos, em 4 de novembro de 1979, e sequestraram 52 diplomatas, exigindo que a Casa Branca devolvesse o xá para o Irã, a fim de que fosse julgado.
Aquilo que, para esses estudantes, deveria provavelmente ser apenas um caso de alguns dias se transformou em uma crise de 440 dias. Para complicar as coisas, uma operação militar realizada em abril de 1980 para salvar os sequestrados terminou em fiasco. Dos oito helicópteros enviados, três quebraram, e a missão foi anulada. Mas, enquanto os aviões de transporte evacuavam a zona, um deles colidiu com um dos helicópteros, causando a morte de oito soldados norte-americanos no deserto iraniano.
Todos os dias, no jornal da noite, a população dos Estados Unidos acompanhava o destino de seus diplomatas. Essa crise dos sequestrados ganhou rapidamente a dimensão de um trauma nacional, que facilitou a vitória de Ronald Reagan sobre Carter na eleição presidencial de novembro de 1980. Que um país em desenvolvimento do Oriente Médio expusesse os Estados Unidos a tal humilhação era coisa rara. Uma indignação recíproca começou a crescer. O conflito geopolítico que já se anunciava durante os últimos anos do reinado do xá adquiriu uma forte dimensão emocional.
Depois da revolução, o Irã se opôs abertamente aos Estados Unidos, sem por outro lado se unir ao campo soviético. O regime de Khomeini partilhava da ambição do xá de fazer do país um líder regional. Mas ele queria atingir esse objetivo utilizando-se do islã político para garantir um apoio popular no mundo muçulmano. Opondo-se a uma aliança com os Estados Unidos ou com Israel, Teerã se colocava em trajetória direta de colisão com Washington.
O governo Reagan procurava vencer e punir os revolucionários iranianos. Quando Saddam Hussein invadiu o Irã, em setembro de 1980, nenhuma lágrima escorreu em Washington. Ainda hoje, muitos dirigentes iranianos acreditam que o presidente iraquiano atacou o Irã por ordem da Casa Branca. Sem chegar a isso, fato é que Washington apoiou Hussein, que comprava armas da Rússia e da França. Esse apoio se intensificou ao longo dos anos. Em 1986, não apenas os Estados Unidos forneciam aos iraquianos informações de grande importância, mas documentos da CIA recentemente divulgados provam que Washington sabia que Hussein utilizava armas químicas. Para muitos iranianos, o erro cometido pelos norte-americanos ao apoiar a campanha militar iraquiana é ainda maior do que o golpe de Estado de 1953. As tensões entre Washington e Teerã se tornaram rapidamente um fator de instabilidade, ainda que o Irãgate tenha mostrado que essas relações eram mais ambíguas do que pareciam (ler cronologia). A região inteira, do Líbano ao Golfo, se tornou o tabuleiro de xadrez onde sua rivalidade se enfrentava.
Também houve momentos em que as relações entre os dois países poderiam ter tomado outra trajetória. Depois do fim da Guerra Irã-Iraque, em 1988, e da morte do aiatolá Khomeini no ano seguinte, Teerã ficou enfraquecida, isolada e ainda mais distante do seu objetivo de liderança regional que no começo da revolução. Devastado por oito anos de guerra, o Irã não tinha mais aliados nem dinheiro, e os investidores estrangeiros lhe davam cruelmente as costas.
O presidente à época, o hojatoleslam Hachémi Rafsandjani, queria melhorar as relações com Washington. Ele estimava que a criação de uma zona de interesse econômico comum facilitaria um entendimento político. Assim, em 1994, o primeiro contrato envolvendo o petróleo iraniano fornecido para uma companhia estrangeira desde a revolução foi para a Conoco, gigante norte-americana desse combustível. O símbolo não poderia ser mais forte.
Ressentimentos persistentes
As coisas, no entanto, não ocorreram como o previsto. Enquanto nos anos 1980 Israel fazia pressão sobre os Estados Unidos para que estes restabelecessem ligações com Teerã, Tel-Aviv tinha agora efetuado uma guinada de 180 graus, esforçando-se para sancionar e isolar o Irã. O projeto de acordo com a Conoco foi a primeira vítima dessa reviravolta. Submetido a uma forte pressão por parte do Congresso norte-americano, o presidente Bill Clinton emitiu duas ordens executivas (em 15 de março e em 6 de maio de 1995) proibindo não apenas o contrato petroleiro com a Conoco, mas também qualquer troca comercial com o Irã, acusado de apoiar o terrorismo.
O governo de Rafsandjani ficou atordoado. Washington tinha rejeitado a mão estendida. As relações entre os dois países iriam mais uma vez se degradar. No ano seguinte, o Congresso dos Estados Unidos votou novas sanções contra Teerã, visando outros países que investiam no setor de energia iraniano. A despeito de alguns breves momentos no final do segundo mandato Clinton, a desconfiança recíproca só aumentou.
Mais tarde, quando o governo de George W. Bush decidiu atacar os talibãs no Afeganistão – regime detestado pelo Irã –, Teerã e Washington começaram um vasto acordo político, militar e em matéria de informações. Segundo James Dobbins, que foi o enviado do presidente Bush ao Afeganistão nos meses que se seguiram ao 11 de Setembro, o Irã teve um papel decisivo, garantindo a adoção da nova Constituição depois da queda dos talibãs. Para diversos olhares, Teerã ajudou Washington a conseguir a paz no país, esperando que essa ajuda contribuísse para abrir um novo capítulo nas relações entre Irã e Estados Unidos.
Entretanto, quando essa colaboração culminou, em 5 de dezembro de 2001, com a assinatura dos acordos de Bonn estabelecendo a reunião de uma Assembleia Constituinte no Afeganistão, o presidente Bush, seis semanas após a assinatura dos acordos interafegãos, inscreveu o Irã na lista dos países do “eixo do mal”, ao lado do Iraque e da Coreia do Norte, acusados de apoiar o terrorismo e desenvolver armas de destruição em massa. Aos olhos de Teerã, isso representou uma traição por parte de Washington e teve como consequência o enfraquecimento considerável do apoio dos partidários à reconciliação com os Estados Unidos. Aqueles que tinham escolhido confiar nos norte-americanos pagavam caro.
Ainda assim, antes que o presidente iraniano reformista Mohammad Khatami (1997-2005) deixasse suas funções, o Irã realizou um gesto de conciliação sem precedentes em relação ao governo Bush. Em 2003, um ano após o discurso do presidente norte-americano sobre o “eixo do mal”, Teerã submeteu a Washington um projeto de negociação global por intermédio do embaixador suíço no Irã. A iniciativa propunha a transparência em seu programa nuclear, a cooperação com o Iraque, o desarmamento do grupo militante libanês Hezbollah e o reconhecimento indireto de Israel – tudo isso em troca da suspensão das sanções e de um reconhecimento de seus interesses militares na região.
No entanto, o governo Bush não tinha interesse em diminuir as tensões com o Irã. A proposta foi recusada, o que reforçou a convicção, em Teerã, de que o objetivo principal de Washington era derrubar o governo iraniano e fazer do país um Estado cliente sem poder real. Como antes, a rejeição desse sinal de boa vontade levou a uma perda de confiança e ao aumento dos desacordos. Dessa vez, o resultado foi ainda mais grave.
Por medo de que o Irã fosse o próximo alvo, Teerã decidiu fazer que os Estados Unidos pagassem ao máximo por sua ocupação no Iraque e sua presença no Afeganistão. Enquanto eles estivessem atolados nesse lamaçal, não teriam condições de visar o Irã: esse era o raciocínio dos dirigentes iranianos.
Washington atribuiu a Teerã a responsabilidade pelos equipamentos explosivos improvisados que fizeram centenas de mortos entre os soldados norte-americanos no Iraque e no Afeganistão. Esses equipamentos foram utilizados com eficiência pela resistência iraquiana à ocupação e pelos talibãs. A cólera e o ressentimento eram grandes no Pentágono, em particular entre os altos funcionários, para quem o Irã era o responsável pela morte de seus camaradas. Essa cólera não era antiga, contrariamente ao rancor suscitado pela crise dos sequestros; no espírito dos militares norte-americanos, essas feridas não tinham cicatrizado.
É nesse cenário complexo e marcado pelo sofrimento que os Estados Unidos e o Irã devem agora assumir a construção de um futuro comum. Se a desconfiança é profunda dos dois lados, é provavelmente no lado do Irã que ela é maior, e isso por duas razões simples. Em primeiro lugar, das duas partes, o Irã é a mais vulnerável. Em segundo, mesmo que os dirigentes dos dois países aprendam com o passado e consigam ultrapassar suas reticências mútuas, ainda existe uma pessoa que viveu cada um dos momentos evocados neste artigo: o Guia Supremo Ali Khamenei. Nenhum outro dirigente, de um lado ou de outro, carrega nos ombros um peso tão grande quanto o mais alto dignitário do regime. E nenhum dirigente sente mais desconfiança do que ele em relação aos Estados Unidos.
Em direção a uma trégua rentável
Se esse muro de desconfiança fosse derrubado e um acordo sobre a questão nuclear fosse assinado, as repercussões sobre a região poderiam ser tão positivas quanto o impacto da animosidade irano-norte-americana foi negativo. Por causa de sua história difícil, as duas partes provavelmente não poderiam se tornar parceiras ou aliadas oficiais de um dia para o outro. Mas, como declarou recentemente Ali Chamkhani, secretário do Conselho Nacional de Segurança, os dois Estados “podem se comportar sem gastar sua energia um contra o outro”. O Iraque e o Afeganistão não estariam em uma situação tão desastrosa hoje se os Estados Unidos e o Irã tivessem chegado a essa conclusão mais cedo.
É claro que tal trégua não desembocaria na resolução de todos os conflitos na região. As rivalidades geopolíticas entre o Irã, a Arábia Saudita e Israel continuarão a ter um efeito desestabilizador. Mas, enquanto as tensões entre Washington e Teerã exacerbam esses conflitos, relações calmas e construtivas contribuirão para temperá-las. Se os dois Estados parassem de “gastar sua energia um contra o outro”, poderíamos também conceber que eles conseguiriam aliviar a guerra civil na Síria. Já que os jihadistas sunitas, a Organização do Estado Islâmico (OEI) e outros agentes do movimento islamita radical representam a maior ameaça não apenas para a estabilidade regional, mas também para os interesses iranianos e norte-americanos na região, imperativos comuns poderiam aproximar Washington e Teerã. Isso os ajudaria a superar a desconfiança mútua e os incitaria a ir além de uma simples trégua. A concertação entre as duas partes no Iraque para forçar a saída do primeiro-ministro, Nouri al-Maliki, e enfrentar militarmente a OEI demonstra que isso é possível.
Essas perspectivas só poderão avançar se os dois lados conseguirem antes de tudo encontrar uma resolução aceitável para o impasse sobre a questão nuclear iraniana. Para o bem ou para o mal, é assim que o próximo capítulo da relação entre os dois países começa.
*Trita Parsié presidente do conselho irano-norte-americano, autor de A single roll of the dice: Obama’s diplomacy with Iran[Um simples jogar de dados: a diplomacia de Obama com o Irã], Yale University Press, New Haven, 2012.
Uma história marcada pelas ingerências externas
1856. O Reino Unido impõe o reconhecimento do Afeganistão pela Pérsia e a cessão da província de Herat.
1871. Sob a influência de seu primeiro-ministro, Nasradine Xá começa uma série de reformas estruturais.
1906. Revolução Constitucionalista: criação do Parlamento (Majlis) e adoção da primeira Constituição do país, que pôs fim à monarquia absoluta.
1907. A Rússia e o Reino Unido dividem a Pérsia em três zonas de influência: o norte, reservado aos russos; o sudeste, controlado pelos britânicos; e uma “zona neutra”, aberta à concorrência política e comercial.
1909.Criação da Anglo-Persian Oil Company, encarregada da prospecção, exploração e venda do petróleo do país. Suspensão do Parlamento.
1914-1918. O Reino Unido ocupa uma parte da Pérsia, que passa a usar o nome de Irã em 1934.
25 de agosto de 1941.As forças britânicas invadem o sul e o oeste do Irã, enquanto os soviéticos ocupam o norte. Reza Xá é obrigado a abdicar em favor de seu filho, Mohammad Reza.
Novembro de 1943. Conferência de Teerã entre Joseph Stalin, Franklin D. Roosevelt e Winston Churchill.
Dezembro de 1945. Proclamação das Repúblicas Autônomas do Azerbaijão e do Curdistão, apoiadas por Moscou. Elas são dissolvidas em 1946.
19 de agosto de 1953.Um golpe de Estado militar fomentado pela CIA e os serviços secretos britânicos derruba o governo de Mohammad Mossadegh depois de ele ter nacionalizado a Anglo-Iranian Oil Company.
Novembrode 1964.Votação de uma lei concedendo imunidade aos norte-americanos presentes no território iraniano. O aiatolá Ruhollah Khomeini é preso e exilado.
1º de abril de 1979. Proclamação da República Islâmica.
1980-1988. Guerra entre Irã e Iraque iniciada por Saddam Hussein.
Novembro de 1986. Estoura o escândalo do Irãgate e das armas entregues pelos Estados Unidos ao Irã.
1995.O presidente Bill Clinton emite duas ordens proibindo o contrato assinado em 1994 para a exploração do petróleo iraniano pela empresa norte-americana Conoco e qualquer troca comercial com o Irã.
Setembrode 2006.O Conselho de Segurança das Nações Unidas vota a Resolução n. 1.737, que proíbe a venda ao Irã de qualquer material ou tecnologia nuclear e balística, e dá sessenta dias aos persas para “suspender todas as suas atividades nucleares sensíveis em termos de proliferação”. É a primeira de uma série de resoluções que reforçam as sanções dos anos seguintes.
24 de novembro de 2013. Assinatura em Genebra de um acordo preliminar sobre o programa nuclear iraniano entre o Irã e os Estados do G5 + 1.
24 de novembrode 2014. Recondução do acordo provisório e prolongamento das discussões até 31 de março de 2015 para um entendimento sobre as grandes linhas políticas e até 1º de julho de 2015 para chegar a um texto definitivo.
O escândalo do Irãgate
POR ALAIN GRESH*
Em outubro de 1984, o Congresso dos Estados Unidos adotou a Emenda Boland, que proibia “apoiar, direta ou indiretamente, as operações militares ou paramilitares realizadas na Nicarágua”. Os responsáveis do Conselho Nacional de Segurança – em particular o diretor da CIA, William Casey, e o conselheiro Nacional de Segurança, Robert McFarlane – se esforçaram para contornar a decisão para poder ajudar os “contras” que se opunham aos sandinistas, que tinham chegado ao poder em 1979. Estávamos então em plena “segunda guerra fria” entre os Estados Unidos e a União Soviética, que se enfrentam indiretamente no Afeganistão, em Angola e na Nicarágua.
Um dos meios imaginados era vender secretamente em Teerã armas cujo lucro iria para os contrarrevolucionários nicaraguenses. Esse projeto correspondia à estratégia daqueles que, na administração norte-americana, continuavam levando em conta que o Irã, apesar da revolução khomeinista, era um aliado potencial para os Estados Unidos. Eles então se voltaram para Israel. Ligada às ditaduras centro-americanas, Tel-Aviv já ajudava os “contras” e manteve contatos com Teerã. Considerava, com efeito, o Iraque como o inimigo principal na guerra iniciada por Bagdá contra seu vizinho em 1980 e que duraria até 1988.
Via Israel, duas entregas de armas norte-americanas ao Irã aconteceram em 1985. No ano seguinte, os próprios Estados Unidos se encarregaram da entrega. O tenente-coronel Oliver North, membro do Conselho Nacional de Segurança, conduzia uma delas, entrando na capital iraniana, no final de maio de 1986, com… uma Bíblia com dedicatória do presidente Ronald Reagan em pessoa.
Mas este último, enroscado em suas negações e seus “esquecimentos”, preferiu logo parar com isso: o escândalo do Irãgate estourou. Ele recebeu esse nome por analogia ao Watergate, que custou a presidência de Richard Nixon em 1974. No início de outubro de 1986, um avião norte-americano, carregado de material destinado aos “contras”, colidiu na Nicarágua. Um dos pilotos sobreviveu e, recuperado pelo exército sandinista, vendeu a informação. Em 3 de novembro, a revista semanal libanesa pró-síria Al-Shiraa revelou todo o esquema. Tanto que, em 25 de novembro de 1986, Reagan, em uma coletiva de imprensa transmitida pela televisão – depois de ter garantido que não estava “completamente informado sobre a natureza das atividades empreendidas em conexão com essa iniciativa” em relação ao Irã –, teve de anunciar que afastava de suas funções os oficiais implicados.
A comissão Tower foi encarregada de esclarecer tudo sobre o Irãgate. De seus meses de audições e de seu relatório não se tira muita coisa. Prova de que os tempos estavam mudando: quando um roubo medíocre tinha custado a cadeira presidencial a Richard Nixon, Reagan saiu quase ileso desse extraordinário acúmulo de abusos. Também comprometido, o vice-presidente George H. Bush seria brilhantemente eleito em novembro de 1988 para a presidência dos Estados Unidos.
*Alain Gresh é jornalista do Le Monde Diplomatique.