Lições para a disputa política no Brasil diante do segundo turno
Estratégias gerais que funcionaram na Colômbia são apresentadas neste artigo como recomendações sobre o que precisa ser feito para as próximas eleições brasileiras
O objetivo deste escrito é compreender alguns dos elementos que influenciaram a vitória de Gustavo Petro e Francia Márquez, três meses e meio após a vitória colombiana e cinco dias após a primeira votação no Brasil, a fim de tirar lições que possam ser úteis na atual conjuntura política brasileira.
Um elemento chave na vitória da chapa Petro-Francia foi a apropriação da linguagem da Política do Amor, liderada pela convicção de Vivir Sabroso. Foi a construção individual e coletiva de ações que permitiu transcender as bolhas sectaristas e transformar a solidão, o desespero e a angústia da população colombiana em soluções concretas de uma agenda política pela dignidade, a garantia dos direitos e o respeito à diversidade, colocando a vida em primeiro lugar.
Recebam este escrito como um amuleto da sorte. Espero que ele possa alcançar seus pensamentos mais íntimos, salvaguardando seus corações neste momento crucial em que vocês devem estar experimentando um furacão de sentimentos, talvez uma rara mistura de timidez, confiança e medo. Ainda faltam quatro semanas para mudar a história do Brasil e liderar o futuro comum do continente americano, integrando-nos e fortalecendo-nos econômica e socialmente como uma região.
A violência e a perda da legitimidade institucional: tentativas de atacar a democracia
A violência foi um fator externo intenso na campanha colombiana e um fator latente/localizado na campanha brasileira. Ela surge em ambos os países como uma tentativa de atacar a democracia e controlar as eleições. Na Colômbia, a violência forçou Gustavo Petro e Francia Márquez a empregar fortes esquemas de segurança, usando escudos protetores durante seus últimos discursos em praças públicas, e encurralou e assustou a uma grande parte da população civil do 5 a 9 de maio, antes da segunda eleição em razão de uma greve nacional armada liderada pelo grupo paramilitar Clan del Golfo.
Os discursos de ódio que se espalharam através dos meios de comunicação de massa e das redes sociais ajudaram a criar as condições para o golpe de 2016, a prisão de Lula e a vitória do Bolsonaro em 2018. Desde então, os discursos de ódio bolsonaristas têm se intensificado sob a proteção do aparato estatal. Há também ódio com matizes de indignação e opressão, perante a lenta resposta do Estado para garantir os direitos e defender a institucionalidade e a democracia. No Brasil, é urgente criar e fortalecer estratégias de comunicação diversas, vinculativas e populares que incentivem o diálogo com aqueles que pensam de maneira diferente.
Por outro lado, a tendência de rápida perda de legitimidade das instituições em ambos os países também decorre do complexo de violência e impunidade, somado a outros fatores como a cooptação do poder e a gestão incompetente das crises socioeconômicas. Apesar das semelhanças entre os dois países, o que os diferencia é que a Colômbia nunca foi governada com uma agenda política presidencial reformista. No caso do Brasil, esse cenário se torna mais complexo, visto que a integridade do Partido dos Trabalhadores (PT) e a figura de Lula têm sido perseguidos com a intenção de deslegitimá-los durante anos. A Colômbia deve aprender do Brasil e rapidamente tocar a alarme, pois os resultados da campanha nefasta da mídia atualmente observada podem causar danos irreparáveis à sua democracia no futuro.
Em ambos os países, a integração e as alianças com os partidos tradicionais não foram suficientes para alcançar a vitória no primeiro turno e, embora fosse importante, não foi um elemento essencial para vencer no segundo turno na Colômbia, pois era matematicamente impossível vencer as eleições com as alianças disponíveis. O Pacto Histórico, a coalizão governante dos partidos progressistas, serviu de plataforma para os partidos tradicionais e emergentes em uma ampla gama de espectros políticos. Entretanto, isso trouxe alguns impasses com movimentos sociais, que tiveram que “engolir sapos” a fim de alcançar a vitória. Em algumas ocasiões, algumas dessas decisões foram revertidas como resultado de uma forte pressão social.
Algumas estratégias gerais que funcionaram na Colômbia são apresentadas abaixo como recomendações sobre o que precisa ser feito para as próximas eleições brasileiras.
Em primeiro lugar, é provável que a sociedade brasileira e a campanha do Lula tenham que redobrar seus esforços para promover espaços de diálogo que não reforcem o discurso das diferenças, mas que enfatizem caminhos comuns a seguir e a construção de alianças.
Em segundo lugar, diante da ameaça de um possível golpe de Estado pelas Forças Armadas como resultado do desprezo de Bolsonaro pelos resultados e/ou uma possível revolta da população nas ruas, é uma prioridade para as instituições e líderes políticos e de opinião tomar uma posição para defender a paz e a democracia.
Em terceiro lugar, é importante utilizar a memória cronológica a seu favor com mensagens e dados diretos e mobilizadores, reconhecendo e tornando visíveis os resultados positivos das políticas de combate à fome e à pobreza e de fortalecimento das instituições, colocadas em prática durante o governo PT/Lula e compará-las com os resultados desastrosos do governo Bolsonaro. Isso implica retomar a discussão sobre garantias de direitos como saúde, educação, alimentação, trabalho, segurança, justiça, habitação, eletricidade, saneamento, entre outros.
Em quarto lugar, como na Colômbia, é imperativo não se envolver ou aderir aos argumentos da polarização (esquerda/direita, capitalismo/comunismo), mas se concentrar na necessidade de buscar futuros comuns com esperanças e sonhos que se tornarão realidades.
Em quinto lugar, as posições políticas que se mostram sensíveis para uma sociedade conservadora podem ser abordadas, ou não, por outros atores da campanha que não Lula, e essa estratégia deve ser interpretada de forma madura entre as bases sociais que mobilizam a campanha. Pode-se observar que no caso brasileiro toda a atenção está caindo sobre Lula, então quem mais poderia se envolver para criar essas narrativas dissonantes e qual poderia ser o discurso estratégico que Alckmin deve assumir nos próximos dias? A intensidade, a combinação e a frequência dessas estratégias para que sejam eficazes dependerão dos (des)arranjos que surgirem na arena política.
Na Colômbia, as estratégias eram heterogêneas e o discurso nem sempre era moderado, mas dissonante. Antes da primeira votação, parecia haver uma tendência de que Gustavo Petro falasse aos acadêmicos, à população urbana, às famílias com rendimentos médios e altos, aos empresários, enquanto Francia Márquez falasse aos trabalhadores e setores populares, às populações rurais, aos excluídos e aos massacrados. Entretanto, entre a primeira e a segunda votação, eles intercambiaram seus discursos e seus lugares de enunciação. Os destinos para os quais eles foram começaram a se cruzar. Gustavo Petro começou a visitar grupos étnicos, camponeses, pequenos industriais, pescadores e cortadores de cana de açúcar, enquanto Francia Márquez deu conferências de imprensa no exterior e na mídia de massa e reuniu-se com comunidades religiosas, empresários e banqueiros.
As retóricas da intransigência: integrando a práxis da política do amor
Na Colômbia, pensar diferente ou simplesmente se posicionar politicamente em uma sociedade violenta pode colocar as pessoas em perigo de morte. Como a Colômbia conseguiu sair desse labirinto escuro onde parecia não haver saída no campo eleitoral para formar pela primeira vez um governo diferente? Ousaria dizer que o mecanismo foi e continuará sendo o de tecer laços com os outros na diversidade para poder atravessar aquelas barreiras que espelham e refletem o que ainda nos aterroriza sobre nós mesmos, e nesse lento despertar da letargia em que a violência havia submerso os colombianos, houve também uma quebra gradual do silêncio através de estratégias sutis da criação popular. E no Brasil, como desconstruir discursos violentos, quebrar o silêncio, abandonar a zona de conforto e superar o medo, a fim de construir uma campanha política bem-sucedida e alcançar a vitória no segundo turno?
A seguir, várias estratégias desenvolvidas na Colômbia na esfera individual e coletiva são mencionadas para fornecer ao leitor algumas ideias que poderiam ser integradas ou adaptadas em seu repertório de estratégias a serem desenvolvidas nos próximos dias no Brasil, analisadas à luz das retóricas da intransigência propostas por Albert O. Hirschman: futilidade, perversidade e ameaça.
A Colômbia sempre foi governada por partidos tradicionais. Nos últimos vinte anos, um movimento intransigente, radical e ultraconservador, conhecido como uribismo, esteve no poder e encontrou terreno fértil na escalada do conflito e no fortalecimento das estratégias de comunicação e de militarização contrainsurgente dos anos 1990. Entretanto, enquanto na Colômbia um discurso de ódio, violência e de extermínio criou raízes do lado do uribismo, no Brasil surgiu um governo inclusivo e baseado em direitos, liderado pelo petismo e apoiado por outros partidos progressistas.
Por um lado, a retórica da futilidade é o conjunto de argumentos que apontam que qualquer mudança é infrutífera, já que não surgirão novas tendências e tudo permanecerá na mesma situação. Na Colômbia, isso foi usado em três frentes discursivas: nas agendas políticas, nas alianças com outros atores e na legitimidade dos candidatos.
Primeiro, a retórica da futilidade foi eficaz no declínio dos candidatos ao centro, Sergio Fajardo na Colômbia e Ciro Gomes no Brasil, que desempenharam um papel de coringa ao enfrentarem constante e agressivamente os lados opostos. Esses resultados vergonhosos foram também provocados pela falta de propostas e posições políticas claras e sua incapacidade de adaptar seu discurso em um clima de polarização política. Entre a primeira e a segunda votação, a chapa Hernández-Castillo, simpatizante dos setores empresariais e conservadores, identificou o descontentamento nacional com a continuidade e a necessidade de mudança, e tentaram radicalizar suas propostas para torná-las semelhantes às de Petro-Francia e diferentes de tudo o que havia sido realizado no governo anterior. Isso foi amplamente criticado pelos apoiadores de Petro-Francia, que empregaram a retórica da futilidade para afirmar que a agenda proposta por Hernández-Castillo, embora parecendo diferente, não levaria a nenhuma mudança.
É muito provável que a campanha de Lula tenha que atender ao desejo de melhoria e mudança da sociedade brasileira, e explicar urgentemente como vão ser os rumos do país com base em sua agenda política, sem cair no jogo discursivo de polarização entre esquerda e direita. Na Colômbia, desde o início, o Pacto Histórico substituiu essa dicotomia pelo termo governo reformista, sem deixar para trás ou esconder da discussão os fatores que perpetuam as crises provocadas pelos governos anteriores, comprometendo-se a combater suas causas e efeitos, como o neoliberalismo, a corrupção, a economia extrativista, as grandes propriedades improdutivas, o tráfico de drogas, entre outros.
Ademais, Lula e Alckmin devem lançar, divulgar, socializar e continuar construindo uma agenda política diversificada e inclusiva com políticos, líderes sociais, coletivos e voluntários em espaços populares de diálogo e organização permanentes e com constante abertura para o estabelecimento de novas alianças. Na Colômbia, meses antes das eleições, foram organizados espaços de treinamento para os cidadãos proteger o voto e reduzir o risco de corrupção ou violência durante as eleições. Durante esses diálogos virtuais, as pessoas foram vinculadas dentro de grupos WhatsApp e Telegram para a distribuição em massa de material oficial de campanha contendo mensagens diretas, números confiáveis e propostas políticas concretas, bem como uma plataforma contra notícias falsas em seu site oficial. Outra parte do triunfo ocorreu por causa da estratégia política de convocar, reunir e incluir os mais diversos e heterogêneos grupos sociais, costurando uma campanha que prioriza os interesses da agenda política do governo reformista com amplo apoio popular. É bem possível que o voto anti-petrista tenha ficado preso durante o segundo turno, porque o potencial das narrativas de ódio foi esgotado e vencido em face de uma linguagem diversa e vinculante.
Em segundo lugar, a retórica da futilidade foi amplamente empregada nas discussões das alianças. A legitimidade das campanhas Petro-Francia e Hernández-Castillo foi posta em questão pela retórica da futilidade. Entretanto, o Pacto Histórico foi estratégico em suas decisões políticas para aceitar alianças, mantendo uma certa distância guiada pelo termômetro da pressão social. Esse cuidado também permitiu que o Pacto Histórico criasse alianças com alguns atores de base em partidos tradicionais, como os partidos Liberal e Conservador, assim como com alguns representantes das forças militares e comunidades religiosas. Um efeito favorável e inesperado começou a surgir com a construção de uma contra hegemonia resultante de fragmentações dentro desses grupos, que trouxe aos olhos do público o esgotamento, as lacunas e as falhas das formas autoritárias, hierárquicas e antidemocráticas e as lógicas de dominação dentro desses grupos. A capacidade de expor essas fragmentações permitiu ao Pacto Histórico ganhar apoio em massa e construir alianças renovadas.
Em terceiro lugar, a legitimidade dos candidatos presidenciais Petro e Hernández foi criticada por causa das suas ligações com processos judiciais por corrupção. Petro já havia sido absolvido anos antes pelo Judiciário, que reconheceu sua inocência, enquanto Hernández ainda estava sendo processado. Este foi um fator que jogou a favor de Petro, pois embora seus oponentes tenham usado este argumento, foi possível provar a inocência de Petro no passado. Este elemento poderia ser pedagogicamente integrado pela campanha de Lula para obter uma vantagem eleitoral, ou seja, sua inocência deve necessariamente se tornar visível através de material audiovisual na campanha, acolhido, comunicado e defendido por uma mobilização ágil e permanente das bases sociais e dos eleitores potenciais.
Por outro lado, as retóricas da perversidade e da ameaça apontam para o fato de que uma decisão eleitoral no futuro levará a cenários piores ou colocará em risco a estabilidade social do país. Ambos são integrados nesta análise para simplificar a interpretação dos dois casos analisados.
As retóricas da perversidade e da ameaça foram empregadas para demostrar a insustentabilidade do modelo de governança na base de herdeiros e sucessores políticos, e permitiu a vitória dos candidatos emergentes Petro-Francia e Hernández-Castillo durante o primeiro turno. No entanto, essas retóricas também foram usadas contra esses candidatos, que representavam uma ruptura da continuidade política na Colômbia, a fim de gerar angústia e pânico. Inicialmente, a mídia tradicional havia reproduzido uma mensagem clara sobre o risco iminente de um golpe de Estado no caso de uma vitória de Petro-Francia. Entretanto, durante o período final ocorreu uma mudança importante, com cinco elementos que mudaram a correlação de forças.
Primeiro, o fracasso do candidato uribista, Federico Gutiérrez, e o esgotamento do discurso autoritário e violento em termos de intenções de voto forçaram ao maior representante dessas retóricas, o ex-presidente Uribe, a moderar seu discurso e se esconder na arena política.
Em segundo lugar, a integração e o fortalecimento das pontes políticas do Pacto Histórico com vários representantes de partidos tradicionais, comunidades religiosas e as forças militares, transmitiram uma sensação de calma na sociedade colombiana e destacaram a baixa probabilidade de um golpe de Estado.
Terceiro, a forte e intensa mobilização popular nas redes sociais expôs continuamente as histórias ocultas de Rodolfo Hernández aos olhos do público, procurando desmoralizá-lo e minar sua legitimidade. Essas histórias rapidamente se transformaram em escândalos que o ligaram a atos de desrespeito à Virgem Maria, a mulheres envolvidas na prostituição, a seus clientes pelos seus comportamentos usurários e indicações de corrupção em seus negócios particulares, a princípios morais e familiares por adultério, além do seu comportamento déspota e manipulador em espaços públicos. Estes foram erros graves que degradaram a legitimidade política de Rodolfo Hernández e começaram a apontar para o fato de que seu eventual triunfo geraria uma crise de democracia e uma escalada de violência devido à repressão por parte das forças militares. Assim, o que levaria a Colômbia a um golpe de Estado seria a crise de governança sob o triunfo de Hernández-Castillo. O Brasil tem muitos elementos para aprender a fim de aproveitar e contestar o campo político eleitoral nesse ponto.
Quarto, a mobilização social e o trabalho coletivo criaram imensas redes de solidariedade e apoio, procurando incansavelmente garantir a locomoção das pessoas aos lugares de votação, cativar o voto dos indecisos, fazer uma forte pedagogia diretamente com parentes, amigos, conhecidos ou estranhos virtualmente e pessoalmente, ou através de jornadas culturais coletivas e atomizadas em todo o território nacional. Por um lado, houve uma explosão de criatividade na sociedade colombiana, envolvendo artistas, acadêmicos, jornalistas, líderes e voluntários que colocaram suas habilidades e fizeram o seu melhor. Por outro lado, a campanha Petro-Francia soube integrar rapidamente essas manifestações populares da periferia ao centro do poder. No final da corrida eleitoral, somente peças audiovisuais foram usadas com mensagens de campanha rápidas, curtas e marcantes, que podiam alcançar todos os cantos do mundo onde um voto fosse possível de arranhar. Tudo isso foi fundamental para alcançar a vitória e após as eleições, na maioria dos casos, essas redes ainda estão ativas como forma de interação e contato social.
Em quinto lugar, houve forte pressão da mídia para prejudicar a campanha Petro-Francia com um amplo repertório que incluía estratégias racistas contra Francia, produção e distribuição ilegal de material audiovisual pré-gravado em reuniões privadas e outras notícias falsas ligando-os a grupos guerrilheiros ou inventando que eles tinham filhos fora do casamento. Todas as tentativas foram combatidas pela ação rápida dos advogados e pela gestão eficaz da comunicação constante e direta entre a campanha e as redes da sociedade civil com o apoio de jornalistas alternativos e influenciadores. Isso teve precisamente o resultado oposto, pois aumentaram a sua popularidade ao reconhecerem que foram vítimas de notícias falsas, expondo as intenções e a falta de legitimidade da mídia de massa e das próprias redes sociais.
No Brasil, a ameaça de um possível golpe de Estado pelas Forças Armadas surgiu recentemente como resultado de um eventual desconhecimento de Bolsonaro pelos resultados eleitorais ou por uma possível revolta da população nas ruas. A resistência a ambos os cenários não deve ser subestimada. Diante do primeiro cenário, é prioritário que as instituições tomem medidas, acionando seu aparato administrativo e comunicacional para contrabalançar o equilíbrio de poder dentro do próprio Estado. Para isso, é necessário que os funcionários públicos dentro das próprias instituições forneçam apoio coordenado, juntamente com o trabalho da sociedade civil organizada para proteger a democracia. No segundo cenário, é importante empregar uma narrativa dissonante por meio dos meios de comunicação de massa e das redes sociais, incluindo grupos WhatsApp e Telegram, onde diferentes líderes políticos e sociais, escalonadamente e de forma canalizada, chamem a população a não se apavorar, ao mesmo tempo em que convocam espaços culturais atomizados que abracem a arte, a diversidade e a proteção da vida e da democracia.
É preocupante que a campanha de Lula não saiba interpretar o que a população quer e que a sociedade brasileira não tenha ocupado a arena da disputa política, enquanto as táticas inovadoras estão sendo exploradas pelos partidários bolsonaristas. Na sua primeira declaração após os resultados do primeiro turno, Bolsonaro já identificou suas próprias fraquezas ao reconhecer seus erros e oferecer publicamente mudanças positivas para o futuro. Por isso, é importante que Lula-Alckmin saibam explicar com informações técnicas e estratégias específicas nos debates e entrevistas, como irão melhorar as condições de vida da população brasileira, o que também deve mover seus apoiadores a replicar essas mensagens e defender essas propostas entre suas redes de conhecidos, familiares e amigos. Mas Lula precisa de apoio político popular, e a mudança só será possível se a sociedade brasileira se ocupar disso na arena social e política.
É hora de parar de apenas elogiar Paulo Freire e começar a usar seus ensinamentos para fazer pedagogia em casa, nas ruas, no trabalho, no supermercado e no transporte público. E não estou falando apenas durante as rotinas diárias, mas de tirar o tempo necessário para fazê-lo. Vocês já perguntaram aos seus amigos e familiares se eles têm certeza em quem vão votar e como eles estão sentindo no clima eleitoral? Não basta apenas fazer o L com a mão para todo mundo ou carregar os adesivos, porque no final o que importa são o conjunto de movimentos físicos e emocionais que registram os números nas urnas eletrônicas, e isso só pode ser alcançado através do diálogo e da interação social. Lembre-se, as pessoas não votam com sua razão, elas votam com o coração ou com as vísceras. Na Colômbia, aprendemos que podemos fazer mais com a política do amor, com sororidade e solidariedade, da resistência ao poder, até que a dignidade se faça costume para todes.
Nathalia Valderrama Bohórquez é doutora em desenvolvimento rural, bolsista da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e pesquisadora do Grupo de Estudos em Agricultura, Alimentação e Desenvolvimento (GEPAD/UFRGS).