Limitações potencializam abusos contra pessoas com deficiência
Violência se dá de diferentes formas e nem sempre é possível detectar o abuso
Pessoas com deficiência enfrentam riscos dez vezes maiores de serem violentadas do que aquelas sem deficiência, segundo pesquisa global do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), de 2022. A realidade no Brasil não é diferente. As taxas de notificações de violências contra mulheres são mais de duas vezes superiores às de homens, conforme aponta o Atlas da Violência de 2021. Esses e outros dados revelam um cenário perturbador: pessoas com deficiência, sobretudo mulheres, têm maior probabilidade de serem vítimas de violência – seja ela física, sexual, psicológica ou financeira.
Essa violência se dá de diferentes formas e nem sempre é possível detectar o abuso, pois muitos vivem em uma cultura opressora, cujas atitudes violentas são relativizadas e seus reflexos negativos trazem ainda mais barreiras às pessoas com deficiência.
Um exemplo é a violência financeira. Em muitos casos, pessoas com deficiência são vistas como financeiramente dependentes. Isso pode levar à exploração por familiares ou cuidadores, negando-lhes o direito ao controle de seus próprios recursos.
Já as violências psicológica e moral abrangem desde o bullying, que pode ser vivenciado no ambiente escolar, até situações de menosprezo e descredibilização em ambientes de trabalho e até familiares.
Muitas vezes, a violência permanece escondida por causa da dificuldade que as vítimas têm de se comunicar. Pessoas com deficiências auditivas ou de fala, por exemplo, podem encontrar obstáculos para denunciar. Adicionalmente, existe o preconceito arraigado de que pessoas com deficiência são “menos capazes” de compreender ou relatar situações de abuso.
Para aumentar a proteção às pessoas com deficiência é primordial que as pessoas próximas estejam capacitadas para identificar possíveis abusos e adotar procedimentos que auxiliem no combate à violência. Nessa primeira linha de defesa estão a escola, professores, amigos e família.
A escola é um dos principais ambientes de socialização e, por isso, professores e colegas têm um papel crucial na proteção e apoio de alunos com deficiência. Educadores treinados podem perceber sinais de abuso ou negligência e agir de acordo. Amigos e família também desempenham um papel vital, pois a proximidade permite identificar mudanças no comportamento ou no estado emocional da pessoa com deficiência.
Olhando adiante: medidas preventivas e conscientização
Paralelamente à conscientização coletiva para erradicar a violência ainda na raiz, é imperativo desenvolver políticas públicas direcionadas, capacitar profissionais da área da saúde, educação e segurança, e promover campanhas de conscientização. A inclusão deve ser praticada em todos os níveis, garantindo que pessoas com deficiência tenham os mesmos direitos, o mesmo acesso a serviços e as mesmas oportunidades de vida que qualquer outro cidadão.
No Brasil, 17,3 milhões de pessoas com dois anos ou mais de idade (8,4% dessa população) possuem alguma deficiência, segundo o IBGE. Ou seja: não dá para dizer que se trata de apenas uma “minoria”.
A violência contra pessoas com deficiência é uma chaga aberta na sociedade moderna que precisa ser enfrentada. Todos – governos, comunidade e cada indivíduo – têm a responsabilidade de garantir que essa população vulnerável seja protegida, respeitada e valorizada. A hora de agir é agora.
Carolina Videira, educadora, mestre em neurologia, especialista em inclusão para diversidade e fundadora da OSC Turma do Jiló, é vencedora do prêmio da ONU “Rise and Raise Others” (Uma Sobe e Puxa Outra) na categoria Redução de Desigualdades, em 2022, e do prêmio Empreendedor Social, da Folha de S.Paulo, em 2022.