Malária: uma pandemia que persiste
A humanidade vai conseguir nas próximas décadas se libertar da malária? Os pesquisadores podem enfim se mostrar otimistas. As pesquisas avançam, e há vacinas em teste com resultados encorajantes. No entanto, a pandemia ainda atinge 108 países e a metade da população mundialPauline Léna
A Organização Mundial da Saúde (OMS) destaca o retrocesso da malária em todo o planeta: de 233 milhões de casos em 2000 para 225 milhões em 2009. O número de mortos passou de 985 mil para 781 mil. Em onze países da África, assim como em 32 dos 56 países endêmicos fora da África, o número de casos confirmados, hospitalizações ou mortes caiu pela metade.
No entanto, a pandemia ainda atinge 108 países e a metade da população mundial. Vêm em primeiro lugar os países da África subsaariana, onde o parasita Plasmodium falciparum mata maciçamente.
As crianças, que ainda não tiveram tempo de constituir uma imunidade, pagam o preço mais caro. A idade média da morte ligada à malária é de 4 anos. No caso dos adultos, as populações essencialmente em risco são as mulheres grávidas, as pessoas infectadas pelo vírus HIV e os viajantes ou migrantes oriundos de zonas não endêmicas.
O ciclo reprodutivo do Plasmodium, parasita responsável pela doença, não variou desde os tempos de Tutancâmon. Ao picar um homem, o mosquito portador injeta nele o parasita em sua forma imatura, que se instala imediatamente no fígado. O Plasmodium passa ali por uma primeira fase de maturação e de multiplicação antes de ser liberado no sangue. Ele coloniza então os glóbulos vermelhos. Nesse estágio, células sexuais do parasita podem também se desenvolver e ser levadas por uma nova picada. Elas terminam seu ciclo no estômago do mosquito, para dar origem a novos parasitas capazes de infectar outro humano na próxima picada.
Para combater a malária, duas abordagens são possíveis: atacar os mosquitos vetores ou mirar no próprio parasita. A primeira tentativa de erradicação em escala global, lançada em 1955, culminou em fracasso, com a aparição de resistências ao DDT, o inseticida utilizado para eliminar os mosquitos, e à cloroquina, o remédio de síntese mais eficaz contra a malária.
Existem umas dez moléculas que, sozinhas ou combinadas, permitem a cura completa na grande maioria dos casos. A cloroquina, o antimalárico de referência que entrou em circulação nos anos 1950, muito potente e barato, deixou de ser eficiente: o Plasmodium falciparum, a mais importante das origens da malária, é atualmente muito resistente a ela. A cloroquina foi então substituída pela artemisinina. Esse antimalárico natural, utilizado pela medicina tradicional chinesa, foi isolado pela pesquisadora farmacêutica Tu Youyou, da Academia de Medicina Chinesa Tradicional. Esse trabalho lhe valeu em 2011 o prestigioso prêmio Albert Lasker pela pesquisa médica clínica.
Muito eficiente e fácil de utilizar, a artemisinina é hoje a principal defesa contra a doença. No entanto, os especialistas já se preocupam com os primeiros sinais de resistência, confirmados em 2009, na fronteira do Camboja com a Tailândia. Para retardar ao máximo esse prazo, o remédio só é distribuído em forma de combinação, em associação com outro tratamento antimalárico. “Se, nos próximos dez anos, as resistências à artemisinina atingirem o continente africano, não teremos outro remédio para propor”, preocupa-se o professor François Nosten, criador da unidade de pesquisa sobre a malária Shoklo Malaria Research Unit (SMRU), sediada na Tailândia.
Os mecanismos em jogo são muito pouco conhecidos. Eles dependem do medicamento, do parasita, mas também da capacidade dos mosquitos, de espécies diferentes, de transmitir os parasitas resistentes. A OMS lançou em 2011 um programa de luta contra a difusão dos resistentes. A realização de testes rápidos permitirá garantir se um acesso de febre se deve ou não à malária, a fim de evitar que se prescrevam antimaláricos inutilmente.
Equipes californianas anunciaram na revista Science a descoberta de uma nova classe de remédios ativos ao mesmo tempo nos estágios sanguíneo e hepático do parasita. Na Nature, uma equipe internacional anunciou a descoberta de um receptor sanguíneo indispensável para a invasão dos glóbulos vermelhos pelo parasita. Outra equipe, germano-africana, explica por que os glóbulos vermelhos dos doentes contaminados pela doença falciforme são capazes de resistir à invasão do parasita.
A maioria dos remédios recentemente colocados no mercado continua, no entanto, sendo derivada de moléculas já existentes ou de combinações sob formas mais fáceis, menos restritivas para os pacientes.
A ONG Medicines for Malaria Venture (MMV), criada em 1990, participou do desenvolvimento do Pyramax, uma terapia combinada de artemisinina (TCA) com dose única, com lançamento esperado em 2012. A MMV também identificou cerca de vinte grupos de moléculas inteiramente novas com potencial para o tratamento da malária. “A maioria ainda está, no entanto, em estágios muito preliminares, como a molécula sintética Oz, muito promissora, atualmente em testes de fase II”, precisa o professor Brian Greenwood, especialista em medicina tropical clínica da Universidade de Medicina Tropical de Londres.
Atrasada por muito tempo em razão da falta de perspectivas comerciais, a pesquisa de novos tratamentos foi relançada em 2002 pelo ambicioso programa de compra de medicamentos do Fundo Mundial de Luta contra a Aids, a Tuberculose e a Malária. Esse novo sistema de financiamento destinado a ampliar o acesso aos tratamentos deverá reativar o interesse dos industriais pelos remédios, que deverão ser vendidos evidentemente a preços baixos, mas em grande quantidade.
VACINA 100%
Os remédios não são, no entanto, a única arma à disposição. Bloqueados pelos mosquiteiros, expulsos pelas pulverizações de inseticidas recorrentes sobre as paredes das casas, os mosquitos não podem injetar o parasita nem pegá-lo. Peter Agre, entretanto, lembra que “os mosquiteiros trazem uma proteção que pode chegar a 50%, mas só são eficientes se forem utilizados por todos”.
O desafio é que os inseticidas também acabam perdendo a eficiência. “As resistências são uma fonte de preocupação; é preciso garantir que o desenvolvimento dos instrumentos existentes seja adequado.”
Uma vacina permitiria imaginar a erradicação do parasita ao bloquear a transmissão por um dos hóspedes (o humano) e, administrada aos recém-nascidos, evitaria a maioria dos casos mortais. No entanto, a vacina ideal, capaz de imunizar 100% de uma só vez e com preço baixo, contra todas as formas de malária, ainda está fora do alcance.
A RTS, uma vacina candidata desenvolvida pela GSK em parceria com a Iniciativa Path – financiada pela Fundação Bill e Melinda Gates –, está em testes que envolvem 16 mil crianças em diversos países e devem terminar em 2014. “Os primeiros resultados são interessantes, mas o nível de proteção ainda é insuficiente, sobretudo porque parece que a proteção diminui com o tempo”, comenta Greenwood, que participou dos trabalhos.
Mais esperada, mesmo sendo menos midiatizada, a MSP3, uma segunda vacina candidata, buscou a iniciativa privada, em dezembro de 2010, para continuar seus testes, que se aplicam agora sobre oitocentas crianças de oito aldeias do Mali. Os primeiros resultados são aguardados para fevereiro.
A maioria dos pesquisadores e interessados insiste no fato de que a vacina não é, no momento, a solução para a pandemia de malária. Bem utilizados, os instrumentos de prevenção, de diagnóstico e de tratamento disponíveis devem continuar sendo os principais meios de ação. Mas essa luta é tão científica quanto política, e a questão da repartição dos fundos, em baixa num contexto de crise econômica, ganha uma importância crucial.
Os esforços dos Estados e dos doadores visando melhorar o acesso aos tratamentos e os instrumentos de prevenção permanecem, enquanto se esperam as soluções tecnológicas, a arma mais eficaz.
Pauline Léna é jornalista.