Memórias do Desenvolvimento será dois filmes
Dirigida por Miguel Coyula, obra homônima ao romance está focada em Sérgio, personagem principal, que surge como alguém existencialista e desconforme. Já O pai, a filha e o desconhecido, de Lorenzo Regalado, baseia-se na relação entre Sérgio e a filha que ele descobre ter em CubaIana Cossoy Paro
O novo livro de Edmundo Desnoes, Memórias do Desenvolvimento, [Memórias del desarrollo, Mono Azul, Madri, 2007], será transformado em dois filmes. Um deles, Memórias do Desenvolvimento está sendo filmado há três anos pelo diretor cubano Miguel Coyula, 31, e tem previsão de lançamento para 2009. O segundo, que tem como título provisório O pai, a filha e o desconhecido, será dirigido por Lorenzo Regalado, também cineasta cubano, em colaboração com o próprio Desnoes, que diz haver participado mais de perto deste processo. “O outro saiu das minhas mãos”, afirma.
Desnoes conta que Memórias do Desenvolvimento é a história de um Sérgio [1]mais velho, no exílio. É sobre a velhice, o ser latino-americano e cubano nos Estados Unidos, o não adaptar-se a nenhum modelo de sociedade, o pensar o que se fez e o que se deixou de fazer. Sem abandonar a ambigüidade que caracteriza o Sérgio Corrieri de Memórias do Subdesenvolvimento.
As memórias e a identidade-árvore
Desnoes não acredita em escrever como oficio, no escritor que senta todos os dias e escreve durante um determinado número de horas. Diz que há “escritores que escrevem por falta, outros por excesso de experiências”. Seu caso, conta, é o primeiro, já que escreve sobre o que poderia ter feito, dito, decidido. Conta que seu longo silêncio entre Memórias do Subdesenvolvimento e Memórias do Desenvolvimento se deve a um prolongado período de reflexão. E complementa afirmando que, para ele, “pensar também é uma forma de agir”.
Quando chegou aos Estados Unidos, em 1979, dedicou-se a lecionar e a entender sua identidade ali. Viu-se em um mundo em que o latino-americano era visto como “mais criativo” e “imaginativo”. Refletiu sobre os estereótipos e imagens que nós, latino-americanos, aceitamos como nossas.
Desnoes tem um pouco da dificuldade de adaptação desse segundo Sérgio, exilado. E define que sua identidade e a de muitos cubanos vai além da geografia. Afirma que na ilha estão as raízes de muitos ramos de uma árvore que extrapola o Caribe e a América Latina.
Os Sérgios e as gerações
O novo personagem, que tem algo do Sérgio anterior e algo do próprio Desnoes, descobre que tem uma filha em Cuba e a conhece. O livro termina com parte do diário dessa filha, que faz perguntas dignas de Sérgio Corrieri: “O que faço e aonde vou?” O filme de Desnoes e Regalado será centrado nessa relação pai-filha e está baseado em Te sigo, o diário da filha de Sérgio ao final do romance.
Mais
Esta é a quinta de uma série de matérias sobre os latino-americanos e seu cinema a partir do 3º Festival de Cinema Latino-americano de São Paulo, redigidas em colaboração por Iana Cossoy Paro, Javier Cencig, Thiago Mendonça e Moara Passoni. Veja os outros textos:
1.
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2.
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3.
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4.
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6.
“Sérgio nunca estaria conformado. Por isso, identifico-me com ele”
Miguel Coyula, diretor de um dos dois filmes que estão surgindo a partir de Memórias do Desenvolvimento, explica como a obra dialoga com romance de Desnoes. Para cineas