‘O Funil do Diabo’, de Julia Lopes De Almeida
Versátil e prolífica, Julia alimentou os folhetins cariocas com romances que, hoje, podem ser redescobertos com renovado interesse
Escrito e publicado entre 1930 e 1934, ano da morte de Julia Lopes de Almeida, O Funil do Diabo ressurge no cenário editorial brasileiro graças ao trabalho da Janela Amarela. A obra traz de volta o nome de uma autora que, em sua época, viveu exclusivamente da literatura, ao ponto de adquirir uma mansão onde morou ao lado do marido, poeta e acadêmico da ABL, e dos filhos. Versátil e prolífica, Julia alimentou os folhetins cariocas com romances que, hoje, podem ser redescobertos com renovado interesse.
O Funil do Diabo, combinando o mistério típico de seus contos com as tramas intricadas de seus romances, envolve o leitor em uma teia de desconfiança familiar. As tensões se multiplicam, enredando todos os membros da casa em um jogo de suspeitas e intrigas. As mulheres, confinadas aos papéis de esposas, hesitam diante de sinais que parecem claros, mas não são; enquanto os homens oscilam entre o crime, a ciência e a loucura. Com um olhar afiado sobre a burguesia emergente da virada do século XIX para o XX, explora temas recorrentes em sua obra: a relação mãe e filha, a submissão conjugal, a fragilidade feminina e a mediocridade masculina.
Este romance não é apenas uma leitura relevante, mas um convite a explorar as camadas esquecidas da literatura brasileira, onde vozes como a de Julia Lopes, por muito tempo silenciadas, voltam a ecoar. O livro revela não só as tensões íntimas de uma família burguesa, mas também desnuda as estruturas sociais e culturais da época, questionando o papel da mulher, os limites da ciência e as fragilidades humanas. Resgatar essa obra é mais do que um ato de justiça; é uma chance de expandir nossa compreensão da narrativa nacional e reconhecer a complexidade de autoras que desafiaram seu tempo.
Juliana Gervason é Pós-Doutora em Literatura e Contemporaneidade, professora produtora de conteúdo literário no ambiente digital, dedica-se à análise profunda e à divulgação de obras literárias com sensibilidade e rigor acadêmico.