O papel dos jovens na reconstrução da democracia
Como os jovens podem se libertar dessa influência antidemocrática e nociva para se tornarem a vanguarda do resgate do debate democrático, provando sua capacidade de participar da vida política?
Se, séculos atrás, as pessoas se dividiam, matavam e morriam por religiões, negando a possibilidade da coexistência pacífica entre aqueles que, apesar de diferentes, poderiam compartilhar uma mesma moral e interagir harmoniosamente em sociedade, essas características se adaptavam à contemporaneidade de outra forma: hoje, não é mais a religião do nosso vizinho que define se deseja dele ou não, mas sim seu posicionamento político, sua ideologia. Evidentemente, esse aspecto se radicaliza e impacta todas as gerações, devendo ser compreendido e analisado de forma ampla e cuidadosa. No entanto, ao destacarmos o factor idade, há um grupo mais vulnerável: os jovens.

Crédito: Fernando Frazão/Agência Brasil
A polarização política é um dos fenômenos mais perigosos da democracia brasileira (e mundial) atualmente. Famílias se separando, amigos deixando de se falar e até agressões físicas por conta de posicionamentos políticos, infelizmente, não são casos raros e, em eventos mais extremos, até mesmo assassinatos ocorrem com motivações políticas, como observado no caso de Marcelo Arruda em 2022.
No caso da juventude, esse impacto pode ser gerado pela necessidade do jovem de se sentir parte de algo (como um movimento ou ideologia política), somada ao advento das redes sociais, que ajudaram a divulgar projetos e influências que incentivam a radicalização, enfraquecendo o debate democrático. Além disso, a entrada repentina de alguns desses jovens no debate público e a recente propagação da temida “cultura do cancelamento” ampliaram ainda mais esse destaque, liderando também pela juventude.
A reflexão que fica, portanto, é: como os jovens podem se libertar dessa influência antidemocrática e nociva para se tornarem a vanguarda do resgate do debate democrático, provando sua capacidade de participar da vida política? Para isso, deve-se primeiro considerar que a estrutura social atual facilita a polarização e a radicalização não só dos jovens, mas da sociedade como um todo. Desde as redes sociais até debates políticos televisivos e figuras caricatas, tudo isso incentiva e alimenta essa ameaça à democracia.
Vejo, portanto, a chave para reverter esse fenômeno como um binômio sustentado por dois fatores: o individual e o coletivo. Naturalmente, é impossível reverter uma tendência social sozinho, como indivíduo. No entanto, o caminho inicial para mitigar a polarização política que impacta a juventude passa, sim, por uma reflexão filosófica individual, que consiste em compreender a existência de diversos pontos de vista e opiniões que, por mais contrastantes que sejam, são válidos e devem ser ouvidos e, em uma sociedade amadurecida, conciliados em prol do bem comum. Para aplicar essa ideia, entra em cena o fator coletivo, que ironicamente utiliza uma ferramenta responsável por essas aparências para revertê-lo: as redes sociais. Isso porque, se uma parcela significativa da juventude se conscientizar dessas características e começar a se levantar contra ele no debate público digital, uma onda de reflexão e divulgação poderá surgir nas novas gerações.
Vivemos um momento complicado para o sistema republicano constitucional, ao passo que autocracias se consolidam e surgem por todo o mundo, como na Venezuela, Rússia, Turquia e Hungria. No Brasil, já não é raro encontrar nas redes ou em protestos palavras perigosas sugerindo perseguição, censura, vingança e violência, vindas de ambos os lados. Se queremos um futuro diferente, não vamos encontrar essa chave em outro lugar senão na conscientização individual e coletiva dos jovens que em breve irão liderar este futuro.
Felipe Vasconcelos é criador do Observatório Atena, perfil que visa difundir conhecimento sobre geopolítica, história e economia para estudantes, além de já ter trabalhado na Coordenadoria Especial de Relações Internacionais e Cooperação da Prefeitura do Rio de Janeiro, lecionar cursos de Geopolítica para jovens e escrever sobre Política Internacional em diversos portais.