Outro mundo impossível é possível
Como será o pós-pandemia? As políticas para enfrentar a crise sanitária aceleraram tendências de fundos que atravessam as sociedades e preocupam as populações: incerteza, precariedade, automação voraz, eliminação das relações humanas. No essencial, essa transição para o capitalismo digital será pilotada pelo Estado
A primeira onda do vírus e a colocação numa redoma de metade da humanidade entre janeiro e junho de 2020 fizeram um eco incomum às aspirações latentes – na maior parte do tempo dispersas, raramente decisivas, frequentemente derrotadas – de uma parte da população que tem por objetivo construir um “mundo de depois” que não carregaria todos os pontos negativos do antigo e teria até algumas virtudes. Um mundo no qual haveria músicos nas janelas, menos aviões no céu, patos pegando tranquilamente o anel viário, circuitos curtos recosturando a fenda entre a cidade e o campo. Um mundo em que as profissões fragmentadas pela divisão capitalista do trabalho se cumprimentariam, empoleiradas em suas varandas todas as noites, pelo trabalho social realizado durante o dia – e à noite também – por todos aqueles cujos salários teriam sido ajustados ao padrão. Um mundo onde o ar fosse mais limpo, o ter não substituiria o ser e o sorriso da moça do caixa não…