“Raça” é sempre o outro
Esse jogo hegemônico de opostos ainda pode parecer evidente num contexto de memória escravagista. Nunca se falou, por exemplo, num “continente amarelo” (como se fala desde sempre num “continente negro”): a persistência classificatória do “negro” é um álibi para a coincidência histórica entre a África e o tráfico escravagistaMuniz Sodré
Em meados dos anos 1990, o conhecido sociólogo peruano Anibal Quijano sustentava que “a mais pungente questão que circula entre os intelectuais latino-americanos é a da identidade”. Não era, entretanto, uma questão que parecia interessar à intelectualidade brasileira da época, em geral convicta de que essa temática já tivesse sido por demais abordada no passado por congêneres como Gilberto Freyre, Alberto Torres, Jorge Amado e outros. Tendia-se inclusive a pensar que as relações de classe social – supostamente mais adequadas a uma sociedade moderna em via de “neoliberalizar-se”, além de fartamente teorizadas por liberais e marxistas – esgotariam o núcleo problemático da questão identitária, a dita “relação racial”. O problema é que, uma década depois, a realidade parecia desmentir esse wishful thinking intelectual: a agenda identitária tornou-se mais relevante em termos públicos do que a classista, em virtude de avanços significativos por parte de segmentos sociais reprimidos. Mas houve quem…