O Tom perfeito de Jobim
Falecido no dia 08 de dezembro de 1994, Tom Jobim se eternizou, conseguindo fundir sua música às paisagens naturais do Rio de Janeiro
Antônio tinha brasileiro até no sobrenome. O “Brasileiro” vem da mãe, Dona Nilza, enquanto o “Jobim”, que adotou como sobrenome principal, vem de seu pai, Sr. Jorge, falecido oito anos após seu nascimento. Antônio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, nascido na Tijuca, em 25 de janeiro de 1927, teve seu parto curiosamente feito pela mesma pessoa que trouxe o sambista Noel Rosa ao mundo. No seu primeiro ano de vida, a família se muda para Ipanema, Zona Sul do Rio de Janeiro, a grande musa inspiradora da vida boêmia e do estilo carioca de Tom.
Além de ter sido um dos grandes responsáveis pela consolidação e internacionalização da bossa nova, junto de seus companheiros, João Gilberto e Vinicius de Moraes, Tom Jobim encarnou na sonoridade musical o charme e a elegância de um boêmio carioca.
Sua formação musical teve início sob tutela do alemão Hans-Joachim Koellreutter, já na adolescência. Mesmo tendo cursado a Faculdade de Arquitetura, a paixão verdadeira de Tom era pela música, razão pela qual abandonou o curso para se dedicar com exclusividade à carreira musical. Carreira esta que foi incentivada sobretudo pelo seu padrasto, embora em seu convívio familiar tivesse contato contínuo com grandes músicos. Foi com um piano alugado por sua mãe que seus primeiros contatos surgiram com o instrumento. Além do piano, Tom arriscou-se na flauta, na guitarra e no violão, parceiro de muitas décadas.
Sua carreira se inicia nas casas noturnas de Copacabana. Foi após o emprego na gravadora Continental, em 1952, que Tom conseguiu gravar suas primeiras músicas, em especial “Faz uma Seresta”, de 1954, com Juca Stocklei. Mas uma de suas maiores parcerias foi com Vinicius de Moraes, o “poetinha”, em 1956. No momento em que Vinicius procurava um músico para sua peça “Orfeu da Conceição”, Tom apareceu para orquestrar e harmonizá-la. Da parceria nasce a composição “Eu sei que vou te amar”, lançada em 1959, que inspirou milhares de declarações de amor por gerações. A canção também ficou marcada pelas inúmeras versões de grandes nomes da MPB no desenrolar da história.
A música “Garota de Ipanema”, letrada por Vinicius de Moraes e composta pelo próprio Jobim, é considerada a segunda canção mais executada na história da música mundial, além de mais de quinhentas versões com inúmeros intérpretes. Nascida dois anos antes do lançamento de 1964, durante uma caminhada tranquila pela orla da praia de Ipanema, Vinicius de Moraes e Tom Jobim avistaram uma bela moça que caminhava pela areia até o mar. A cena trivial chamou tanto a atenção que ambos prontamente decidiram compor uma canção, eternizando esse momento tanto na memória quanto na arte.
Aproveitando o ensejo, em 1974, o diretor e empresário Roberto de Oliveira fez o que parecia impossível: reuniu dois dos maiores gênios da música brasileira, Elis Regina e Tom Jobim. Elis gozava de uma popularidade estrondosa no país, mas sua imagem estava em decadência após polêmicas relacionadas à ditadura militar. Tom, morando em Los Angeles, sentia que, apesar do prestígio que suas elaborações musicais haviam ganhado mundialmente, estava sendo esquecido pelos brasileiros. Era um “casamento” interessante para ambos, mas o início das gravações não foi nada animador. Tom, quem diria, inseguro no início do projeto, e Elis se cobrando exasperadamente, ao ponto de se achar incompatível com o estilo de Tom. Somente após o arranjo de “Corcovado”, primeira música do repertório a concluírem, que o clima de tensão se desfez e o entrosamento perfeito foi construído nas demais faixas. “Águas de Março”, segundo pesquisa realizada pela edição brasileira da Revista Rolling Stone, ocupa o segundo lugar na lista de melhores canções brasileiras, atrás apenas de “Construção” de Chico Buarque.
Chico, inclusive, foi um grande amigo e parceiro de Jobim. Na canção “Paratodos”, Chico Buarque qualifica seu amigo como “mestre soberano”, que, sensibilizado pela homenagem, retribui dizendo que “é uma coisa muito boa ter um Chico Buarque para o Brasil. Ele é um gênio da raça, depositário da cultura popular brasileira. Grande poeta, grande músico, grande letrista, grande escritor, grande tudo”.
A admiração recíproca dos dois transcendia a música, construída sob um forte vínculo de amizade e admiração pessoal. Suas famílias, Buarque de Hollanda e Paes Leme, eram próximas bem antes da amizade dos dois, afirmava Tom: “meu pai e o dele já se conheciam, não sei se eram amigos, mas frequentavam o mesmo ambiente literário.” Numas das histórias mais curiosas dos dois, durante o 3º Festival Internacional da Canção, realizado em 29 de setembro de 1968, a canção mais aclamada pela plateia era “Pra não dizer que não falei das flores”, de Geraldo Vandré. Porém, a vencedora foi “Sabiá”, letrada por Chico Buarque e com música de Tom Jobim. Tom recebeu as vaias no final da fase brasileira da premiação sozinho, pois Chico se encontrava em Veneza. Logo após, telegrafou para o parceiro pedindo por sua presença, e foi prontamente atendido. Chico aceitou o pedido e recebeu, ao lado de Tom, as sonoras vaias na grande final da fase internacional.
Falecido no dia 08 de dezembro de 1994, por conta de uma parada cardíaca, Tom Jobim se eternizou, conseguindo fundir sua música às paisagens naturais do Rio de Janeiro. Não tem como contemplar as belíssimas vistas das praias da zona sul carioca sem ouvir de fundo algumas das composições do mestre e poeta. É como se suas obras tivessem por objetivo adornar cada paisagem natural, complementando e aperfeiçoando.
Railson Barboza é Bacharel em Filosofia (PUC-Rio). Doutorando e Mestre em Política Social (UFF)
Nunca e demais ler, ouvir e conversar sobre Tom Jobim. O musico que representa amaior renovacao musical do seculo 20.
Embora nao seja o criador da bossa nova